O Brasil tem avançado no combate ao tabagismo. Dados de 2015 do Ministério da Saúde mostram que, nos últimos dez anos, o número de fumantes com mais de 18 anos de idade caiu 33,8%. A queda é motivo de comemoração já que, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), os custos para o sistema de saúde brasileiro com doenças causadas pelo fumo chegam a R$ 23 bilhões ao ano. No entanto, a luta contra os males do tabaco tem outra face. Para mais de 159 mil famílias, o produto é um meio de vida.
Mais de 90% dos agricultores que cultivam o tabaco, ingrediente de cigarros, charutos e afins, estão em propriedades na região Sul, o restante está no Nordeste. Segundo a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, o tamanho médio das terras cultivadas por eles é 15 hectares – ou seja, são pequenos produtores. Considerada uma cultura lucrativa, o retorno médio chega a R$ 18 mil por hectare plantado de tabaco, segundo a secretaria.
Apesar da rentabilidade, o negócio do tabaco hoje dá menos dinheiro que em anos anteriores. Segundo a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), entre 2011 e 2015, o faturamento do setor deixou de crescer até começar a cair. Entre 2011 e 2012, o faturamento dos fumicultores aumentou 33,4%. De 2012 para 2013 a alta no rendimento foi de 9%; entre 2013 e 2014, o faturamento cresceu somente 1,15%; e entre 2014 e 2015, registrou queda de 19,6%.
Essa diminuição nos ganhos abrange o tabaco para consumo doméstico e exportação. A maior parte da produção brasileira – entre 85% e 87% – é destinada a outros países. O Brasil é o segundo maior produtor do mundo, atrás da China e alternando a posição com a Índia. Mas dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) sinalizam que o tabaco está sendo menos buscado também a nível global.
Segundo a OMS, em 2010, os não fumantes a partir de 15 anos eram 3,9 bilhões de pessoas, cerca de 78% da população mundial nessa faixa etária. O organismo calcula que o número de pessoas que não consomem tabaco subirá para 5 bilhões, ou 81% da população projetada para 2025.
Apesar de não relacionar diretamente a queda no faturamento à redução do total de fumantes, o presidente da Afubra, Benício Werner reconhece que o número de agricultores trabalhando com tabaco está diminuindo e que foi preciso reduzir a área plantada para “uma adequação entre oferta e demanda”.
A redução da área plantada de tabaco, com substituição por outros cultivos, é estimulada pelo governo. As políticas públicas antitabagismo incluem ainda preço mínimo para o cigarro, que em maio foi reajustado para R$ 5, e uma alta carga tributária.
Segundo a Afubra, o percentual do faturamento abocanhado pela tributação passou de 56%, em 2011, para 65,2%, em 2015. O dirigente critica a política do preço mínimo e o aperto fiscal e diz que as medidas fortalecem os contrabandistas de cigarros. “Isso está prejudicando o cigarro legal em detrimento do ilegal.”
O secretário especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário, José Ricardo Roseno, afirma que o governo ajuda as famílias que vivem das plantações de tabaco a trocarem o produto outras culturas. No entanto, segundo ele, o processo é demorado, porque mesmo com o consumo em queda, o tabaco assegura uma boa renda. Além disso, os agricultores já estão inseridos na cadeia produtiva do fumo e a articulação de cooperativas e compradores para outros produtos leva tempo.
“A cultura do tabaco tem mais de 100 anos. Há uma cadeia produtiva organizada que garante compra, custeio. Outras culturas, como pecuária de leite e corte, milho, feijão, arroz, dão uma certa rentabilidade, mas é preciso a organização de toda a cadeia produtiva. Por isso, a política [de auxílio] tem que acompanhar a realidade do agricultor”, afirma.
Segundo Roseno, entre 2015 e 2017, o governo terá investido R$ 53 milhões em assistência técnica e extensão rural. Segundo ele, atualmente, 30 mil famílias de fumicultores recebem esse tipo de orientação para que possam se dedicar a outras culturas. O secretário cita ainda recursos de crédito rural junto às prefeituras e o programa Mais Gestão, destinado a fortalecer o cooperativismo entre pequenos agricultores.
Como resultado de ações do tipo, segundo o secretário, a área plantada de tabaco caiu de 374 mil hectares para 308,2 mil hectares entre 2009 e 2015, uma redução de 17,6% em sete anos.
Atualmente, a Secretaria de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário tenta reverter resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) que entrou em vigor em 1º de julho. A norma prevê que, para acessar o crédito do Programa Nacional da Agricultura Familiar (Pronaf), os fumicultores precisam comprovar que ao menos 30% da renda vem de outras culturas que não o tabaco. Na safra 2017-2018, o percentual subirá para a 40% e, na de 2018-2019, chegará a 50%.
Antes, o percentual exigido era 20%. A secretaria defende o retorno a esse patamar, sob o argumento de que a mudança prejudica os fumicultores. Segundo José Ricardo Roseno, um levantamento do órgão mostra que com a exigência de 30% de outras culturas, 70% dos agricultores familiares que cultivam fumo ficariam sem acesso ao Pronaf.
“O Pronaf não financia atividade do fumo, financia outras atividades. Então, o que vai acontecer, é que o plantador de tabaco que realmente quer diversificar as culturas não terá condições”, analisa Roseno. Segundo ele, a Secretaria de Desenvolvimento Agrário formalizou, no Ministério da Fazenda, proposta para cancelar a resolução. A expectativa é que o assunto seja discutido na próxima reunião co CMN.