O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou, esta manhã, improcedentes por unanimidade duas ações cíveis originárias nas quais o governo de Mato Grosso solicitava indenização por desapropriação indireta de terras que, segundo alegava, teriam sido ilicitamente incluídas em áreas indígenas. O Plenário acompanhou o voto do relator das duas ações, ministro Marco Aurélio.
De acordo com informações da assessoria, em seu voto, o relator assentou que o estado não deve ser indenizado, pois as terras não eram de titularidade do Mato Grosso, uma vez que são ocupadas historicamente pelos povos indígenas. Em uma das ações, o governo mato-grossense alegava que terras teriam sido ilicitamente incluídas no perímetro do Parque Nacional do Xingu. Já a outra refere-se às reservas indígenas Nambikwára e Parecis e áreas a elas acrescidas.
De acordo com o ministro Marco Aurélio, desde a Constituição de 1934, não se pode considerar terras ocupadas pelos indígenas como devolutas, portanto o Mato Grosso não precisa ser indenizado. Ele apontou que laudos periciais constantes nos autos comprovam a presença histórica dos indígenas nas regiões em questão. “Os laudos não deixam dúvidas sobre ocupação de índios nas áreas em jogo”.
O relator destacou que a Constituição de 1988 estabelece que são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
O voto do ministro Marco Aurélio foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski nas duas ações. O ministro Gilmar Mendes estava impedido em uma das ações, mas seguiu o relator na outra.
Houve três sustentações orais. Representando o Mato Grosso, o procurador Lucas Schwinden Dallamico argumentou que as áreas em discussão não eram ocupadas permanentemente pelos índios antes da demarcação das terras, lembrando que, até a década de 80 do século passado, era comum o deslocamento de indígenas dos locais que tradicionalmente ocupavam para outro por interesses econômicos. A seu ver, a União deveria desapropriar as áreas, o que não foi feito, o que justificaria o pedido de indenização formulado pelo estado.
A ministra da Advocacia-Geral da União (AGU), Grace Mendonça, destacou que todas as Constituições a partir de 1934 reconheceram que as áreas de ocupação permanente de povos indígenas devem permanecer na posse deles. “Não há, nos autos, uma única comprovação que esses povos deixaram de estar presentes nessas terras. Estudos sérios e farta documentação revelam a presença desses povos nessas áreas”.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, salientou que as conclusões dos laudos periciais são “claras, objetivas e firmes” no sentido de que as áreas são de posse imemorial dos povos indígenas. “Toda extensão constitui área de ocupação histórica e tradicional indígena, por isso foram identificadas, demarcadas, homologadas e registradas. São, portanto, terras indígenas, de propriedade da União, de usufruto permanente de povos indígenas que tradicionalmente as ocupavam e ocupam”.