Nesta sexta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu início ao julgamento dos embargos declaratórios interpostos pela prefeitura de Nova Ubiratã (165 quilômetros) contra a criação do município de Boa Esperança do Norte. O ministro Gilmar Mendes, relator do caso, foi o primeiro a votar, decidindo pelo não conhecimento do recurso. Em sua decisão, Mendes destacou que todas as questões relevantes para a resolução da controvérsia já foram analisadas pelos ministros da Corte, não havendo vícios no acórdão recorrido que justifiquem os embargos.
O ministro também rejeitou o pedido de nulidade do acórdão, argumentando que Nova Ubiratã não fundamentou adequadamente o pedido. Além disso, ressaltou que não houve violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, uma vez que o resultado foi favorável ao autor da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que deu origem ao caso. Mendes ainda observou que Boa Esperança do Norte já foi instalada, com eleições municipais realizadas em 2024 e posse do prefeito e vereadores em 2025, consolidando a administração municipal.
Em manifestação encaminhada ao STF nesta quinta-feira, a prefeitura de Nova Ubiratã apresentou dados detalhados sobre as consequências socioeconômicas negativas decorrentes do desmembramento, já que perdeu 360 mil hectares de seu território. O município destacou perdas significativas de receitas, comprometimento de investimentos públicos e risco de colapso orçamentário. Estima-se que Nova Ubiratã deixará de receber aproximadamente R$ 34,9 milhões entre 2025 e 2028, o que representa uma redução de 20% na arrecadação em 2025 e 2026 e chegando a 40% em 2028.
Além disso, a redução populacional decorrente do desmembramento fez com que Nova Ubiratã perdesse dois distritos (Água Limpa e Piratininga) e caísse de 11.530 para 9.294 habitantes. Com isso, o coeficiente do município no Fundo de Participação dos Municípios (FPM) foi rebaixado de 0,8 para 0,6. A projeção para 2025, que seria de R$ 12,4 milhões caiu para R$ 10,06 milhões, resultando em uma perda estimada de R$ 2,42 milhões apenas neste ano.
Outras receitas também foram impactadas, como a arrecadação do Imposto Territorial Rural (ITR), que deve diminuir em R$ 3,1 milhões anuais devido à perda de áreas rurais produtivas. Repasses estaduais vinculados a programas como o Fundo Estadual de Transporte e Habitação (FETHAB) e o FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) também tendem a ser reduzidos, agravando a situação financeira do município.
Nova Ubiratã também alertou para os compromissos de longo prazo assumidos com base na expectativa de manutenção do território e das receitas. O município citou financiamentos para obras de pavimentação, aquisição de ônibus escolares e construção de habitações populares, totalizando cerca de R$ 30 milhões nos próximos 15 anos. Com a redução abrupta de recursos, a continuidade desses projetos está ameaçada, e o município corre o risco de inadimplência.
“Os relatórios anexos, elaborados pela Secretaria Municipal de Planejamento e Finanças, detalham e comprovam todos esses pontos fáticos. Os documentos expedidos gozam de fé-pública. Em resumo, há um quadro de iminente colapso orçamentário”, destacou a prefeitura em sua manifestação.
Diante do cenário, Nova Ubiratã propôs ao STF uma transição de quatro anos para a implementação da nova configuração territorial e redistribuição de receitas. A proposta inclui uma partilha escalonada e decrescente das receitas entre Nova Ubiratã e Boa Esperança do Norte, com o objetivo de evitar o rompimento “abrupto” do equilíbrio orçamentário. “Com a modulação, Nova Ubiratã poderia honrar seus compromissos já assumidos e reprogramar suas ações governamentais, preservando a continuidade dos serviços essenciais à população durante o período de ajuste”, afirmou.
A criação de Boa Esperança do Norte foi aprovada em 2000, juntamente com a emancipação de outros municípios, como Ipiranga do Norte e Itanhangá. No entanto, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso acatou um pedido de Nova Ubiratã e suspendeu a norma, mantendo Boa Esperança como distrito por mais de 20 anos. O caso chegou ao STF após o partido Movimento Democrático Brasileiro (MDB) apresentar ação pela emancipação.
No julgamento, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, votou contra a criação do município, posicionamento seguido pelos ministros Edson Fachin e Carmen Lúcia. Já o ministro Gilmar Mendes abriu divergência, votando a favor da emancipação, acompanhado por Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Toffoli, Luiz Fux, Nunes Marques e André Mendonça. Com a criação autorizada, Boa Esperança teve sua primeira eleição municipal no ano passado.
O julgamento dos embargos declaratórios segue em andamento no plenário virtual do STF, com expectativa de conclusão nos próximos dias. Até o momento, além de Gilmar Mendes, o ministro Alexandre de Moraes também já proferiu voto pela rejeição do recurso.