Com a apuração que está sendo feita pela Corregedoria do Tribunal de Justiça em relação a decisões judiciais que foram alvos do esquema clandestino de espionagem “barriga de aluguel”, em que números de telefones são inseridos de forma irregular em pedidos de interceptação telefônica, as vítimas que forem descobertas deverão ser informadas pelo próprio Judiciário.
“Eu não tenho noção exata até que se comece a apurar. E a apuração – como todas, rigorosíssimas, mais do que isso, eu não posso me deixar esquecer da importância de que as vítimas ou possíveis vítimas sejam efetivamente esclarecidas”, disse o presidente do TJ, desembargador Rui Ramos, em coletiva de imprensa.
Segundo ele, deve ser uma responsabilidade da instituição dar explicações às pessoas que foram alvo da espionagem clandestina, supostamente promovida por membros do alto escalão do governo. “Quem foi ouvido tem que ser esclarecido. É uma responsabilidade do Estado e do Judiciário de informar a vítima. A vítima tem direito de saber”, disse Ramos, que até o momento já recebeu intervenções de algumas das vítimas já descobertas, como a deputada Janaina Riva (PMDB) e o advogado José Patrocínio, por meio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Segundo o magistrado, apesar de ainda não ter certeza da extensão do problema, o caso aponta para algo sistêmico. “Não adianta me dizer que esse é um caso pontual. Isso realiza um estrago sistêmico, o estrago é muito grande, a insegurança se torna muito grande”.
E defendeu que as apurações sejam feitas de forma rigorosa por conta da insegurança a que a população está supostamente exposta. “Eu tenho que apurar e apurar pra valer! Porque aqui eu não tenho uma vítima x, uma vítima y que foi ofendida por infortúnio. Eu tenho a possibilidade de um Estado, que deveria nos garantir todos os direitos fundamentais, nos colocando em uma situação de insegurança”, avaliou o chefe do Poder Judiciário mato-grossense, comparando o caso ao "Watergate" escândalo de escutas que derrubou Richard Nixon da Presidência dos Estados Unidos, nos anos 70.
O desembargador ressaltou que até o final de semana, a Corregedoria já deve ter em mãos todas as decisões proferidas por juízes criminais em ações de interceptação, no período de 2014 até agora. Com esse material é que serão feitas as apurações para chegar ao volume de irregularidades cometidas.
“Estamos buscando junto a todos os magistrados todas essas informações para saber se houve o mínimo de concorrência por uma certa negligência”, disse Rui. No entanto, ele afirmou que, em primeira avaliação, não existem evidências de que houve participação de juízes na irregularidade.
Ele acrescentou que o juiz Jorge Luiz Tadeu Ferreira, que, em 2015, ainda na comarca de Cáceres, autorizou os grampos que vitimaram pessoas como a deputada Janaina Riva, o jornalista José Marcondes “Muvuca” e a socialite Tatiane Sangalli, já procurou a corregedoria se colocando a disposição de esclarecimentos.
Rui Ramos, contudo, afirmou que existe sim a possibilidade de falhas, relacionado a isso a pressão que os magistrados vivem nesse tipo de situação de pedidos de interceptação telefônica. “É claro que nós corremos um certo risco em estar deferindo erroneamente. O conhecimento é inicial, não é aquele conhecimento de prova em que todo mundo foi ouvido, são procedimentos de investigação e a lei nos autoriza essa situação”.