quarta-feira, 11/dezembro/2024
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Presidente consentiu Maggi desmatar em Mato Grosso, acusa antrópologo

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Eduardo Viveiros de Castro, professor do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é considerado “o” antropólogo da atualidade. Dele diz Claude Lévi-Strauss, seu colega e mentor, seguramente um dos maiores pensadores do século 20. E são com credenciais como essa que Viveiros de Castro faz um duro ataque ao governador Blairo Maggi e uma séria denúncia contra a instituição da Presidência da República. Ao tratar da questão envolvendo a Reserva Indígena “Raposo Tavares”, em Roraima, onde há anos existe um conflito de terras entre índios e não-índios, como gostam de dizer os especialistas indigenistas, ele afirma que Maggi desmatou com o consentimento do presidente da República.

“Veja o que aconteceu no Estado do Mato Grosso. O que fez esse governador (Blairo Maggi), considerado um dos maiores desmatadores do mundo? Derrubou florestas para plantar soja, com o consentimento do presidente da República, diga-se de passagem. Hoje o Estado do Mato Grosso deveria se chamar Mato Fino. Virou um mar amarelo. O único ponto verde que se vê ao sobrevoá-lo é o Parque Nacional do Xingu, reserva indígena. O resto é deserto vegetal” – diz o antropólogo, em entrevista ao jornal “O Estado de São Paulo”.

Segundo ele, em Mato Grosso uma vez por ano, o deserto verdeja. È hora de colher soja. “Depois, dá-lhe desfolhante, agrotóxico… E a soja devasta a natureza duplamente. Cada quilo produzido consome 15 litros de água” – diz o professor carioca.

Em seus estudos, Viveiros lida com a questão das filosofias indígenas, vistas como novo saberes e contrapontos filosóficos à hegemônica civilização ocidental. A partir deste referencial, os conceitos de multinaturalismo e multiculturalismo, em seus aspectos de convergência e divergência, são trabalhados para pensar e incluir novos aspectos do fazer científico, cultural e artístico.

O estudo das sociedades indígenas é muito importante no conjunto da obra do professor Viveiros de Castro, que pode ser considerado tradutor e experimentador do “pensamento selvagem”, conceito estabelecido por Claude Lévi-Strauss, um dos mais importantes intelectuais do século 20. Nessa posição, ele passa a ser um agente de convergência de diversas culturas, o que propicia condições para que sejam repensados termos tradicionais de relação e oposição, como cultura e natureza, corpo e espírito.

Para Eduardo Viveiros, as alegações sobre soberania nacional s”erve para produzir pânico em gente que vive longe de lá”. Ele admite que “o Exército tem de cumprir sua missão constitucional, que não é a de ficar criticando o Executivo, é proteger fronteiras, fincar postos de vigilância, levar seus batalhões, criar protocolos de convivência com as populações locais”. No entanto, sustenta: “o que prevalece é o conflito fundiário e a cobiça pelas terras”.

“Em Roraima não se deve bater de frente com o Planalto. Representa esse Estado o senador Romero Jucá, que é pernambucano e hoje atua como líder do governo. Jucá tem interesses claros e bem definidos. É dele o projeto que regulamenta a mineração em terras indígenas. Regulamenta, não. Libera” – disse.

No ataque, o professor da UFRJ vai mais além: “Empresas e cidadãos estrangeiros já são proprietários de partes consideráveis do Brasil. Detêm extensões enormes de terra e parece não haver inquietação em relação a isso. Agora, quando os índios estão em terras da União, que lhes são dadas em usufruto, daí fala-se do risco de interesses estrangeiros. A Amazônia já está internacionalizada há muito tempo, não pelos índios, mas por grandes produtores de soja ligados a grupos estrangeiros ou pelas madeireiras da Malásia. O que não falta por lá é capital estrangeiro. Por que então os índios incomodam? Porque suas terras, homologadas e reservadas, saem do mercado fundiário”.

O antropólogo Eduardo Viveiros de Castro foi entrevistado pelos jornalistas Flávio Pinheiro e Laura Greenhalgh.

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