O juiz titular da recém-criada Vara Especializada em Ação Civil Pública e Ação Popular, Agamenon Alcântara Moreno Júnior, acatou denúncia do Ministério Público contra o deputado estadual José Geraldo Riva, o ex-presidente da Assembléia e atual conselheiro do TCE, Humberto de Melo Bosaipo, os servidores Guilherme Garcia, Nivaldo Araújo, Geraldo Lauro e Nasser Okde; o contador José Quirino Pereira e o técnico em contabilidade Joel Quirino Pereira. Com a decisão, os servidores passam a figurar como réus na ação civil de ressarcimento de danos causados ao erário, cumulada com responsabilização por ato de improbidade administrativa, que vai processar e julgar suposto desvio e apropriação indevida de recursos públicos praticados pela então mesa diretora da Assembléia Legislativa de Mato Grosso. O processo teve origem no Inquérito civil número 096/2004.
O juiz determinou que a Assembléia Legislativa envie todos os documentos referentes ao processo licitatório ou quaisquer outros processos de compra que envolvam a empresa O.S. Ribeiro Serviços, e a comprovação da entrega de bens e serviços e dos pagamentos efetuados, segundo o Ministério Público, para empresa ‘fantasma’ O. S. RIBEIRO, emitindo em seu favor 50 cheques no total de R$ 2,3 milhões. De acordo com o MP, “apurou-se, em seguida, que essa empresa de fato não existia, restando configurado que não houve a necessária prestação de serviços ou entrega de mercadorias por parte da mesma”.
Ainda na apreciação do pleito do MP, o magistrado indeferiu pedido liminar de seqüestro e indisponibilidade de bens dos acusados, por entender que não está demonstrado o requisito do ‘periculum in mora’. Também indeferiu os pedidos liminares de afastamento do cargo dos servidores públicos e do deputado José Riva, que atualmente ocupa a função de primeiro-secretário na mesa diretora, além da busca e apreensão de documentos na Assembléia Legislativa.
Nos termos da denúncia do Ministério Público, as investigações tiveram origem durante a operação denominada “Arca de Noé”, cujos documentos foram disponibilizados pela Justiça Federal. Os mesmos, segundo o MP, indicaram movimentação financeira entre a Assembléia Legislativa e a Confiança Factoring Fomento Mercantil, de propriedade de João Arcanjo Ribeiro.
A defesa preliminar apresentada pelos réus não foi acolhida pelo magistrado tendo em vista que, na maioria, não negaram os fatos narrados pelo Ministério Público. Nivaldo Araújo e Geraldo Lauro alegaram a não obediência ao que preceitua a Constituição Federal e afirmaram que atuaram no exercício de suas funções. Nivaldo Araújo era responsável pelos certames licitatórios e Geraldo Lauro ocupava o cargo de chefe de patrimônio da Assembléia Legislativa.
O servidor Nasser Okde informou que praticou os atos no estrito cumprimento das tarefas que lhe foram atribuídas, sem qualquer poder de decisão. Em sua conta-corrente foi depositado um cheque no valor de R$ 27 mil, emitido originariamente em favor da empresa O.S.Ribeiro. O contador José Quirino Pereira e o técnico em contabilidade Joel Quirino Pereira, por sua vez, figuram como réus no processo por terem viabilizado a formalização da empresa receptora dos cheques. Eles argumentaram que cumpriram apenas o dever profissional, com a documentação que lhes foi fornecida.
Já Guilherme Garcia manifestou-se pelo não recebimento da ação, sob o argumento de que o Ministério Público não apontou, em específico, qual foi a sua conduta ilícita. Entretanto, o Ministério Público informou que ele “assinava e sacava diretamente” alguns cheques nominais à empresa fantasma, junto ao Banco do Brasil, com autorização dos emitentes dos cheques para o saque direto no caixa.
O deputado José Geraldo Riva, que era presidente da Assembléia Legislativa à época dos fatos, argumentou que o inquérito civil instaurado pelo Ministério Público deixou de obedecer aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. O deputado classificou como ‘viciadas’ as provas levantadas pelo Ministério Público e ponderou que o agente político não pode ser julgado por improbidade administrativa, mas sim por crime de responsabilidade, requerendo assim a extinção do processo sem apreciação do mérito.
O ex-deputado Humberto de Melo Bosaipo, que na ocasião ocupava o cargo de primeiro-secretário da Assembléia Legislativa, argumentou que o processo deve ser arquivado porque o procedimento foi “presidido, manejado, conduzido e manobrado por autoridade absolutamente incompetente”.
Quanto à impossibilidade de aplicação da Lei de Improbidade Administrativa a agentes políticos, em especial a deputados, o magistrado ressaltou que esse argumento não merece amparo. O juiz citou jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que improveu recurso de agravo regimental proposto por um membro do Congresso Nacional, que figurava como réu em Ação Civil Pública. Segundo entendimento do STF, apenas os ministros de Estado estão regidos por normas especiais de responsabilidade e, portanto, não se submetem ao modelo de competência previsto no regime comum da Lei de Improbidade Administrativa.
O juiz Agamenon Alcântara explicou ainda que o inquérito civil não precisa obedecer aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, por tratar-se de procedimento administrativo. “Não é meio adequado para o exaurimento da produção de prova, que somente é realizado na via judicial, momento em que o Estado-Juiz oportunizará a produção de provas, obedecendo aos princípios acima mencionados”, esclareceu.