A ex-secretária de Saúde de Cuiabá, Elizeth Lúcia de Araújo, afirmou ter sido fortemente pressionada por empresários que forneciam medicamentos à prefeitura de Cuiabá entre 2017 e 2018, período em que esteve no comando da pasta na capital. Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Medicamentos Vencidos na câmara de vereadores, na tarde desta segunda-feira, a servidora afirmou que foi reprimida por não aceitar ‘fraudar’ aquisição de remédios no município por meio de um sistema de troca.
Segundo ela, as empresas contratadas para fornecer os medicamentos entregavam produtos diferentes dos que eram faturados pela secretária municipal de Saúde, o que dificultava o controle do estoque. Na época, o fornecimento era feito por uma empresa que deixou de vender remédios para a prefeitura para gerir o Centro de Distribuição de Medicamentos e Insumos de Cuiabá (CDMIC).
“Pegavam um registro de preço de um medicamento X, faturava como se fosse ele e depois pedia para entregar outro como por exemplo, gases, ou qualquer outro que estivesse faltando ali. Na hora eu barrei, porque era muito grave e poderia se tornar uma fraude e não teria como fazer o controle de estoque”, explicou.
A gestora seguiu alegando ter sofrido desgastes com o proprietário da empresa, após exigir as notas fiscais dos produtos que realmente haviam sidos entregues e por proibir o modo de operação que vigorava na época, o qual ela classificou como “fraude”. Ela também afirmou que o empresário pressionou para que os pagamentos fossem feitos com urgência.
“Ele não gostou, depois disso houve muita pressão para que se pagasse logo esses medicamentos. Tive um desgaste muito grande com ele, várias vezes eu o encontrei na prefeitura buscando que fosse acelerado o processo de pagamento e eu disse para ele que, na hora que o processo estivesse pronto, ele iria receber”, complementou.
Elizabeth também alegou ter enfrentado problemas para adquirir novos medicamentos após barrar o ‘esquema’ na secretaria, o que culminou no desabastecimento de insumos nas unidades de saúde da capital em 2018. Segundo ela, a empresa chegou a ganhar outro pregão emergencial, mas acabou desistindo de celebrar o contrato.
Após a desistência, a então secretária disse ter sido procurada pelo proprietário de outra empresa, que também ficou classificada no processo licitatório. Ele teria feito uma proposta de “carta de crédito” para pegar em medicamentos, fora do que estava requisitado dentro do contrato licitatório. O pedido, contudo, foi negado pela gestora.
O empresário, então, teria ficado irritado e ameaçado Elizabeth ao afirmar que ela “não conseguiria trabalhar se fosse não flexível”. “Na época, (ele) me procurou para conversar também. Eu sempre procurava não receber nenhum fornecedor sozinha, sempre tinha alguns técnicos comigo”, ponderou.
Elizabeth também comentou sobre seu pedido de exoneração, após não conseguir apoio da própria gestão para resolver os problemas. O assunto foi levado para o prefeito Emanuel Pinheiro (MDB) durante uma reunião com secretários-adjuntos.
Ela também revelou ter sofrido desgastes com o ex-secretário adjunto de Saúde de Cuiabá, Milton Corrêa. “Eu falei para o prefeito: O Milton não está facilitando nossa vida, se ele quer ser secretário, dê a ele o cargo. Foi uma reunião desgastante, onde foi colocado que nós estávamos dificultando a vida do prefeito, que a gente estava queimando ele na nossa condução”, iniciou.
“Nós tentamos argumentar sobre o orçamento contingenciado, da dificuldade de planejamento e da dificuldade com a equipe econômica. Ele [Emanuel Pinheiro] disse que não ia ouvir nada porque já sabia o que nós íamos dizer. Eu fiquei calada, na porta, eu falei que poderia fazer a minha substituição”, finalizou.
Até o momento, as duas empresas citadas pela ex-secretária não se pronunciaram. Já o prefeito de Cuiabá disse em nota que sua “gestão atua pautada pelo zelo e compromisso na administração de recursos públicos e lamenta as ilações apontadas por parte da ex-secretária de Saúde, Elizeth Araújo”.
A prefeitura também afirmou que, em nenhuma circunstância, irá se furtar a promover apurações ou aceitar práticas ilícitas. “Apoia e considera necessária investigação aberta pela Casa de Leis no intento de que falhas sejam saneadas, já que o problema se arrasta há décadas. Considera a fala da ex-secretária estranha e irresponsável sem nenhum compromisso com a verdade, e que segue determinado a entregar uma saúde melhor à população cuiabana apesar daqueles que buscam o quanto pior, melhor”, disse o prefeito na nota.