O esquema de interceptações telefônicas clandestinas que vinha funcionando em Mato Grosso, operado por um núcleo da Polícia Militar, começa a criar atritos entre as diferentes instituições que integram a forças de segurança pública. A central de escutas na modalidade barriga de aluguel, que já colocou sob suspeição a PM, o Judiciário e Ministério Público Estadual (MPE), agora avança também sobre a Polícia Civil.
Tanto é que a delegada Alana Cardoso atribuiu aos delegados Flávio Henrique Stringueta e Alessandra Saturnino, a responsabilidade pelas interceptações. Ela prestou depoimento na Secretaria de Estado de Segurança Pública e disse que Stringueta e Saturnino coordenavam as escutas na Polícia Civil. Sua versão foi endossada pelo titular da pasta, Rogers Jarbas, que por sua vez enviou um ofício ao delegado-geral, Fernando Vasco Spinelli com todos os detalhes revelados por Alana.
Rogers, que também é delegado da Polícia Civil, recebeu do governador Pedro Taques (PSDB) a missão de investigar, no âmbito da Secretaria Estadual de Segurança Pública, as denúncias sobre o esquema de interceptações que partiram do promotor de Justiça e ex-secretário de Segurança, Mauro Zaque.
Alessandra Saturnino é ex-secretária-adjunta de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública. Flávio Stringueta, por sua vez era o coordenador da Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCCO), braço da Polícia Civil que investiga crimes mais complexos, como por exemplo quadrilhas especializadas em assaltos a bancos e outros delitos de maior gravidade. Ele ocupou o cargo por 6 anos e foi destituído da função no começo de abril deste ano sendo remanejado para a 2ª Delegacia de Polícia, do bairro Carumbé.
Inconformado com a decisão, ele publicou um longo texto no Facebook afirmando que sua saída da GCCO ocorreu de forma autoritária, para atender interesses pessoais e teria participação do secretário Rogers Jarbas.
Nesta semana, o desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Orlando de Almeida Perri, designou o delegado Flávio Stringueta, para atuar em 2 procedimentos provenientes de notícia crime protocolados pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MT), envolvendo o esquema de grampos realizados pela Polícia Militar e quebras de sigilo envolvendo advogados, magistrados, jornalistas, médicos, empresários e servidores públicos.
Em seu despacho, Perri determinou à Diretoria-geral da Polícia Civil que publicasse portaria nomeando Stringueta como delegado especial para acompanhar o caso. Agora, depois da determinação do desembargador, o secretário Rogers Jarbas encaminhou ofício para o diretor da PJC, com base no depoimento de Alana Cardoso, apontando que o ex-chefe da GCCO era um dos responsáveis pelas escutas dentro da Polícia Civil.
Alana foi citada numa decisão da juíza Selma Rosane Santos Arruda, titular da 7ª Vara Criminal, como responsável pelas interceptações de 2 números telefônicos das ex-funcionárias da Casa Civil, Tatiana Sangalli e Caroline Mariano, durante a Operação Forti. Após isso, a delegada compareceu à Secretaria de Segurança Pública e prestou depoimento sobre operações já realizadas pela Polícia Civil e pela Sesp envolvendo escutas telefônicas, entre elas a Operação Querubim, deflagrada em fevereiro de 2016, ocasião em que Flávio Strigueta esteve à frente das investigações enquanto chefe da GCCO.
Na Querubim, os mesmos celulares voltaram a ser intereceptados sob justificativa de que a investigação visava confirmar ou descartar uma suposta organização criminosa, articulada pelo ex-bicheiro João Arcanjo Ribeiro para atingir o governador Pedro Taques. A denúncia teria sido recebida por Stringueta por meio de uma denúncia anônima feita de um orelhão. Porém, sem seu depoimento na Sesp, a delegada Alana atestou que o então chefe da GCCO foi informado por ela sobre o teor das investigações bem como das escutas telefônicas no bojo da operação.
No dia 17 de maio a Polícia Civil divulgou nota atestando que a operação foi realizada com a devida autorização judicial, respeitando todos os parâmetros legais. “Todas as pessoas interceptadas foram devidamente identificadas nas investigações, sem uso de codinomes e de qualquer artifício que induzisse a erro o Poder Judiciário e o Ministério Público Estadual. A Polícia Judiciária Civil repudia toda e qualquer ação que se valha de ferramentas investigativas para atender a interesses ilegais”, atestou a PJC.