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Decisão judicial pode resultar em conflito entre indígenas e agricultores em Mato Grosso

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Uma decisão da Justiça Federal que retira centenas de pequenos agricultores de uma faixa de terras situada na gleba Suiá Missu, em Alto Boa Vista (Nordeste do Estado), pode inviabilizar cerca de 70% do município e quase toda a fonte da economia local, e já colocou as autoridades locais em estado de alerta. No centro das divergências estão títulos de propriedades de terras emitidos pelo Estado e contestados pela Justiça.

“A situação, hoje – em nosso município, é de iminência de conflito. A qualquer momento pode acontecer o pior e ninguém quer isso. Já vivemos em uma área chamada de Vale dos Esquecidos e desejamos a nossa sobrevivência. Em hipótese alguma queremos prejudicar a comunidade indígena. Achamos que eles também têm direito”, alertou o prefeito de Alto Boa Vista, Mário Cezar Barbosa (PR).

Ele lidera uma comitiva de integrantes da sociedade local em contatos com os deputados – na Assembléia Legislativa, em busca de apoio político. “Estamos aqui na tentativa de sensibilizar a Assembléia Legislativa e o Governo do Estado a abraçar essa causa – em busca de soluções. Uma das nossas preocupações é o possível conflito social de grandes proporções e que pode levar a região ao caos”, explicou Barboza.

O grupo é formado por representantes do poder público local, comerciantes e trabalhadores rurais ocupantes da área em litígio – muitos deles com títulos de propriedade expedidos pelas autoridades cartorárias do estado. Todos integram a Comissão Permanente de Defesa da Gleba Suiá Missu.

A missão é oficial e foi decidida em audiência pública realizada no último sábado, em área de Alto Boa Vista e de São Felix. O encontro reuniu cerca de mil pessoas que ocupam a área e discutiu o litígio em torno da questão. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Felix do Araguaia e Alto Boa Vista, Divino Martins de Andrade, considera a missão árdua.
“Enquanto lideranças buscamos apaziguar e amenizar a situação dos dois lados – trabalhadores e índios, procurando alternativas junto às autoridades competentes. No momento, os trabalhadores estão transtornados e não sabem o que fazer. Esse estado emocional pode gerar uma barbaridade e o caos na área em litígio, com risco de perda de vidas de um dos dois lados”, observou Andrade, se referindo ao temor geral de um possível “massacre futuro”.

Na carta precatória 355/07, de 28 de setembro passado, o juiz federal substituto da 5ª Vara-Mato Grosso, Marcel Peres de Oliveira, deu prazo de 30 dias para desocupação da área que identifica como “Terra Indígena Maraiwãtsede”. A pena para desobediência foi estipulada multa diária de R$ 500 para cada citado no processo.

A ação civil pública foi ajuizada para assegurar aos índios da etnia Xavante a posse de terras “insertas” na área e, segundo o Ministério Público Federal, reconhecida pela Funai – a Fundação Nacional do Índio. “Ela é de ocupação imemorial dos índios, demarcada e homologada pelo decreto de 11 de dezembro de 1998, da Presidência da República”, afirma o procurador da República, Mário Lúcio de Avelar.

Ainda na ação, o juiz José Pires da Cunha cita referência à lei federal 3.081/54. Segundo ela, a aquisição de direitos sobre terras federais, estaduais e municipais estava a depender de ação discriminatória judicial. “Não tendo o Estado de Mato Grosso seguido o procedimento legalmente previsto, não adquiriu validamente o domínio e, por isso não poderia transferi-lo”, diz trecho apontado pelo magistrado.

Levantamento feito pela Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenação Geral (Seplan) revela que a área em litígio tem quase 3.000 habitantes, fazendas dedicadas à pecuária de corte, agricultura tecnificada, concentração de pequenos e médios produtores, e indústria de beneficiamento de leite. Também tem escolas, comércio de médio porte e armazéns de grãos e de beneficiamento de arroz.

Juntas, a Prefeitura e a Câmara de Vereadores de Alto Boa Vista vêm discutindo uma proposta de solução para o problema “Suiá Missu-Marãiwatsede”. O prefeito Mário Barboza esclareceu que o objetivo maior é “angrariar e beneficiar as comunidades indígena e de trabalhadores rurais”.

O que se propõe é uma divisão física da área em litígio, de aproximadamente 165 mil hectares. Nela, trechos das rodovias BR-158 e MTs-424 e 322 formam um triângulo com área interna de cerca de 80 mil hectares – com possibilidade de ampliação, que ficaria para a comunidade indígena. “Esse espaço seria suficiente para que os índios se acomodassem e vivessem em perfeita harmonia com os produtores”, ressaltou o prefeito.

Dentro desse triângulo existem em torno de 70 famílias de produtores ocupantes que seriam indenizados ou remanejados para outra área. O restante do espaço interno do triângulo – de cerca de 70 mil hectares – seria usado pelos ocupantes atuais ou 90% de todos os habitantes. “Essa medida alternativa viabilizaria a permanência dos índios convivendo em perfeita harmonia com as sociedades de Alto Boa Vista e São Felix do Araguaia, evitaria um problema social de envergadura enorme e também estaria viabilizando o asfaltamento da BR-158. Essa rodovia ficaria livre para ser asfaltada – o que não ocorre até hoje por causa das pendências jurídicas.

Para os deputados Sebastião Rezende (PR) e Daltinho (PMDB), um dos caminhos é a negociação política dentro dos parâmetros legais. Eles acreditam na ação do Estado e na possibilidade de negociação e solução que contemplem ambos os povos locais e suas respectivas sociedades, sem desestabilizar a ação dos entes públicos constituídos e mantendo a organização já estabelecida na região.

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