Parecer emitido pelo Ministério Público de Contas (MPC) aponta que o pagamento dos quatro precatórios à Construtora Andrade Gutierrez tem “irregularidades extremamente graves” e causou dano aos cofres públicos de mais de R$ 146 milhões. Além disso, o órgão afirma que o procedimento contou com a simulação de um negócio entre a empreiteira e a Piran Participações, pertencente a Valdir Piran, para efetuar a transferência de recursos públicos para esta empresa, que recebeu R$ 131 milhões. Para o MPC, a Andrade Gutierrez foi usada para intermediar uma transferência indevida do governo do Estado para a financeira Piran.
O documento foi juntado a um processo no Tribunal de Contas do Estado (TCE) que acabou arquivado. No entanto, tramita na Corte de Contas uma outra representação, sob a relatoria do conselheiro Valter Albano.
O parecer é assinado pelo procurador-geral de Contas, William de Almeida Brito Júnior. Ele afirma textualmente que todo o processo do pagamento dos precatórios contém sérias irregularidades. A primeira delas trata do percentual baixo de desconto obtido pelo Estado, que foi de zero em três precatórios e de 16,34% no quarto precatório.
Para embasar sua tese, o procurador analisou diversos precatórios do extinto Departamento de Viação e Obras Públicas (DVOP) e constatou que os precatórios pagos por dívidas do órgão tinham “descontos consideráveis e [eram pagos] em várias parcelas, além de se tratar de valores infinitamente inferiores do que os precatórios devidos à Andrade Gutierrez”. Uma planilha com tal levantamento mostra que o desconto mínimo obtido era de 30%, chegando em pelo menos um dos casos a 49%.
Em outro trecho da manifestação, o MPC afirma que a construtora cedeu, “de forma simulada e fraudulenta”, para a Piran Participações e Investimentos, os créditos de dois precatórios, totalizando R$ 288 milhões, com desconto de 45,62% ao mesmo tempo em que já recebia os pagamentos do Estado. “Da análise dos fatos pode-se constatar facilmente que a Andrade Gutierrez não teria nenhum interesse econômico em ceder os precatórios […] a Piran Investimentos e Participações pelo deságio de 45,62%, pelo simples fato de que no mesmo período […] estava recebendo do Estado de Mato Grosso”.
O procurador aplicou o percentual de desconto dado pela construtora e chegou ao valor de R$ 146 milhões, valor que, a julgar pelo histórico das outras negociações, deveria ter sido dado ao Estado como desconto para o recebimento da dívida. “Pelo exposto, restou demonstrado, aos olhos do Ministério Público de Contas, a ocorrência de prejuízo aos cofres do Estado de Mato Grosso no valor de R$ 146.666.621,42”. A representação foi julgada pelo TCE e acabou arquivada. Os ex-secretários de Fazenda, Eder de Moraes e Edmilson José dos Santos foram absolvidos.
Outro lado – o governador de Mato Grosso à época do pagamento, o hoje ministro da Agricultura Blairo Maggi (PP) afirmou por meio de sua assessoria que os pagamentos feitos pelo Estado atenderam a uma decisão judicial. Ao jornal O Estado de S. Paulo, o advogado de Valdir Piran, Nabor Bulhões, disse que o pagamento do precatório foi uma operação absolutamente lícita, tendo passado pelo crivo do Judiciário e sido examinado pelo TCE.