Após o STF (Supremo Tribunal Federal) absolver nesta quinta-feira (27) oito réus do mensalão da acusação por formação de quadrilha, o ministro Joaquim Barbosa fez um desabafo antes de um intervalo da sessão. O presidente da Suprema Corte criticou os pares e, indiretamente, a presidente Dilma Rousseff, ao afirmar que se formou no tribunal uma "maioria de circunstância".
"Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira de que este é apenas o primeiro passo. Esta maioria de circunstância tem todo tempo a seu favor para continuar nessa sua sanha reformadora", disse. "Essa maioria de circunstância [foi] formada sob medida para lançar por terra todo um trabalho primoroso, levado a cabo por esta corte no segundo semestre de 2012", disse o ministro.
Quando fala em maioria circunstancial, Barbosa refere-se à nomeação dos ministros Luís Roberto Barroso eTeori Zavascki, indicados por Dilma para os lugares de Ayres Britto e Cezar Peluso, que em 2012 votaram pela condenação dos réus por formação de quadrilha. Barroso e Zavascki tiveram entendimento diferente dos antecessores e foram decisivos para absolver os réus.
Apesar de negar publicamente que irá se candidatar a algum cargo nas eleições de 2014, Barbosa teria recebido o convite do PSB para disputar uma vaga no Senado. Nos bastidores, comenta-se que o presidente do STF está cansado e pode deixar a Corte. Pela lei, Barbosa pode deixar o cargo até seis meses antes das eleições (abril) caso queira disputar algum cargo.
Por 6 votos a 5, o STF (Supremo Tribunal Federal) absolveu, em sessão nesta quinta-feira (27), oito réus do mensalão do crime de formação de quadrilha. Com isso, a pena do ex-ministro José Dirceu e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares serão diminuídas e ambos vão deixar o regime fechado e ir ao semiaberto.
Hoje, apresentaram seus votos os ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, que inocentaram os réus desta acusação,e Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Joaquim Barbosa, que votaram pela manutenção da condenação. Ontem (26), Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski já haviam votado pela absolvição.
Além de Dirceu e Delúbio, o ex-presidente do PT José Genoino, os publicitários Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz e os ex-dirigentes do Banco Rural Kátia Rabello e José Roberto Salgado estão sendo julgados novamente pela acusação de formação de quadrilha e terão as penas diminuídas.
Crítica a Barroso e Zavascki – Em seu discurso, Barbosa criticou Barroso e Zavascki, os mais novos integrantes da Corte, por apresentarem cálculos em seus votos para demonstrar que a pena dos oito réus foi exagerada. "Ouvi argumentos tão espantosos como aqueles se basearam simplesmente em cálculos aritméticos e em estatísticas totalmente divorciadas da prova dos autos, da gravidade dos crimes praticados e documentados nos autos dessa ação penal", criticou, referindo-se aos votos dos novatos.
"Ouvi até mesmo a seguinte alegação: 'Eu não acredito que esses réus tenham se reunido para a prática de crimes'. Há duvidas de que eles se reuniram? De que se associaram? E de que essa associação perdurou por mais três anos? E o que dizer dos crimes que eles praticaram e pelos quais cumprem pena?", questionou o presidente da Corte.
Em seguida, Barbosa afirmou que era claro o papel que cada um desempenhava no esquema. Para o magistrado, o ex-ministro José Dirceu "se manteve na posição de líder e organizador da quadrilha até que o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) veio a público denunciar a quadrilha".
"Conforme se demonstrou fartamente", foi Dirceu "que encaminhou os deputados interessados para que recebessem a propina mediante agendamento com os réus Delúbio Soares e Marcos Valério", disse. "Não havia dúvida ainda do papel exercido por José Genoino como 'preposto' de José Dirceu no Partido dos Trabalhadores", acrescentou o presidente da Corte.
Ele disse ainda que Delúbio foi a "referência" dos parlamentares para saber "quanto receberiam, a data e o local" e que Valério foi a "fonte de todo o dinheiro ilícito", o "canal por onde circulou o dinheiro ilícito usado para distribuir aos deputados"
Ao encerrar sua sustentação, Barbosa disse que "esta é uma tarde triste para o STF". "Com argumentos pífios foi reformada, jogada por terra, extirpada, do mundo jurídico, uma decisão plenária sólida, extremamente bem fundamentada, que foi aquela tomada por este plenário no segundo semestre de 2012."
"Maior farsa da política" – Celso de Mello, o decano da Corte, também fez uma sustentação em tom de desabafo. O ministro disse que "quadrilha poderosa", "visceralmente criminosa", "se apoderou do governo".
Segundo o magistrado, que votou pela condenação de todos os réus por formação de quadrilha, houve "plena configuração do crime de quadrilha". "Os integrantes desta quadrilha agiram com dolo de planejamento, divisão de trabalho e organicidade."
O ministro ironizou declarações das defesas e apoiadores dos condenados, que acusam o julgamento do mensalão de ser "a maior farsa da história" da Justiça.
"A 'maior farsa da historia política brasileira' residiu, isso sim, nos comportamentos moralmente desprezíveis, cinicamente transgressores da ética republicana de delinquentes travestidos então da condição de altos dirigentes governamentais políticos e partidários, que fraudaram despudoradamente os cidadãos dignos de nosso país", declarou.
O decano encerrou sua fala dizendo que os réus do mensalão "nada mais são que meros e ordinários criminosos comuns".