Não, não estou falando de por fim ao Estado Democratico de Direito estabelecido na Constituiçao Federal. Pelo contrário, é graças a ele que existe a lei da qual estou falando. É uma lei que senão perfeita, é uma das armas mais fortes que agora temos no combate a toda forma de violência doméstica, familiar, íntima, aquela que ocorre dentro do sacrosanto lar e da qual ninguém quer muito comentário.
Estima-se que no Brasil, quatro mulheres sofrem violência doméstica ou familiar por minuto. Esse número provavelmente é bem maior, já que muitas não denunciam e não se tem estatísticas mais precisas.
Hoje, pela lei, configura-se violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. Essa violência é a praticada por qualquer membro da familia (parentes), agregados (empregados), marido ou companheiro (a mais comum) mesmo que não convivam mais com a mulher (ex-marido ou ex-companheiro).
A violência física é sem dúvida cruel, e precisava de atenção legal. Mas a lei foi além, ao caracterizar como violência contra a mulher também a relaçao sexual forçada (mesmo com o marido), as ofensas a sua capacidade e integridade como pessoa (humilhaçao de qualquer nível), bem como aqueles atos que tentam retirar delas seus bens.
A Lei Maria da Penha é um avanço numa sociedade machista em que a mulher ainda é considerada propriedade.
Ela almeja o fim de toda forma de desrepeito à mulher. Ela diz, nas entrelinhas, que em briga de marido e mulher tem que meter a colher sim! Entre outras coisas.
Quando coloco a Lei como tendo a intenção de por fim à democracia, estou dizendo que ela tem a finalidade de acabar com um dos eventos mais democráticos na nossa sociedade: a violência familiar e doméstica contra a mulher. É democrático porque esse tipo de violência não escolhe raça, cor, ricas ou pobres, infelizmente atinge toda a sociedade sem exceção. A diferença é que algumas mulheres denunciam, outras calam-se por medo ou vergonha.
Ainda, além de tudo, existe a violencia institucional: profissionais despreparados no atendimento à mulher vítima de violência. O Estado, diga-se União, Estados e Municípios, infelizmente, muitas vezes, também se omitem. Somente para citar: o Estado do Mato Grosso, o lugar onde mais ocorreram prisões com fundamento na Lei Maria da Penha, não é signatário do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. É consolador saber que aqui muitos que infrigiram a lei, sofreram sua penalidades, mas não é de se questionar que, se o número é alto, também os casos de violência contra as mulheres do Mato Grosso é muito mais?
A Lei Maria da Penha completou um ano dia 07 de agosto. Com certeza com resultados positivos, mas ainda há muito por fazer. Lei intimida, mas não muda forma de pensar, educação que ensina respeito por todas pessoas, sim.
Uma frase de Martin Luther King cabe bem para terminar meu texto: “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons.”
Elietti Martins é advogada, professora da Unicen e presidente do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres