Nos anos 60 do século passado, enquanto Presidente Juscelino Kubitschek decidia implantar a fabricação de automotores no Brasil e, construíamos Brasília, uma cidade para automóveis e que nunca teria engarrafamentos, países da Europa já concluíam, que o maior inimigo da qualidade de vida nas cidades, seria o uso crescente dos automóveis na mobilidade urbana.
Assim, enquanto na Europa, os países baixos e nórdicos já possuem quase meio século de crescentes esforços para limitar os automóveis nas cidades, ampliar seu transporte de massa eletrificado e articulado com as bicicletas, aqui, gastamos este tempo todo, em fazer o inverso. As nossas grandes cidades, abandonaram os bondes elétricos, restringiram os trólebus e afundaram-se em dívidas para abrir espaços aos automóveis e ônibus, dando um resultado de poluição, altos custos, endividamento de municípios, custos de engarrafamentos, acidentes e mortes no trânsito, o cotidiano que vivemos e conhecemos.
As nossas capitais, assim como Cuiabá, chegaram ao ponto de saturação, a liberdade de ir e vir, esta sendo crescentemente tolhida. Temos dificuldades de nos mobilizarmos, para muitos, temos barreiras físicas e barreiras econômicas que impedem o exercício deste direito. Quando nossa cidade não nos garante mais o direito de nos mover para trabalhar, estudar, consumir, nos divertir, a cidade esta doente, é um ambiente opressor pois impede a realização de direitos do ser humano.
A situação de Cuiabá é peculiar. A nossa cidade não conheceu transporte de massa elétrico, assim, de uma cidade de pedestres, de ruas acolhedoras, foi atropelada pelo surgimento do automóvel. Em poucas décadas, pela inexistência de um planejamento para atender as necessidades humanas, ignoramos o que se fazia no mundo e, deixamos para os automotores a falsa solução do problema. Ainda, para alguns administrar o desenvolvimento urbano é priorizar a construção de vias para a locomoção automotiva. Com o ingresso de 75 veículos por dia em Cuiabá, esta é uma pressão concreta, visível no nosso cotidiano de engarrafamentos, acidentes e tragédias do trânsito.
Porém, temos que ampliar as alternativas. Todos sabem que o automóvel deve ser complementado por outros meios de locomoção, que sejam mais competitivos com o mesmo. Por esta razão, cidades como Bogotá, desde 1996, investe em multimodais de transporte urbano, ampliando as redes e a capacidade do seu transporte de público e implantando suas lindas "CicloRutas", paraciclos, passarelas para pedestres e ciclistas, etc… Este exemplo, vem sendo seguido pelo Rio de Janeiro. Bogotá já ultrapassou 300 km de ciclovias e o Rio aproxima-se dos 200. Assim, cidades quentes, como o Rio, adotam as bicicletas, não apenas na sua bela orla marítima, mas principalmente nos bairros de populações de baixa renda. Por outro lado, cidades com grandes desníveis como Lisboa, também ampliam suas ciclovias para permitir mais uso de bicicletas, pois só os automóveis, nas cidades, agravam os problemas da mobilidade.
Não bastam as obras do VLT, temos que planejar um sistema integrado de transporte para a região metropolitana, com gestão unificada, tendo como prioridade os pedestres e ciclistas (mais calçadas, mais passarelas, mais ciclovias, bicicletários, estações de aluguel de bicicletas, mais urbanização,…), transporte massivo como prioridade de articulação com outras alternativas, etc.., pois, sem isto, continuaremos vivendo num ambiente urbano de crescente hostilidades.
Porém, para agravar a tendência começada com JK, agora mais incentivos federais surgem para a venda de automóveis. Com isto, a indústria cresce, os seus empregos estão garantidos, a população se endivida, e as cidades e seus gestores ficam com os problemas de mobilidade ampliados.
Guilherme Maluf é médico, deputado estadual e presidente do PSDB de Cuiabá