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Reflexões sobre a seca

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Quando eu era pequena, li num gibi uma historinha terrível sobre uma sociedade marciana. Eram famílias verdes – papai, mamãe e filhinhos – que moravam em uma redoma de vidro, porque as condições externas não permitiam a vida. Era uma história futurista. Mas agora o futuro chegou ou parece mais próximo.

Essa história assustadora às vezes volta à memória. Que pesadelo! Como as coisas da infância são insistentes!

Lembrei-me disso agora, diante da cidade esfumaçada. E a gente não tem redoma…Não há fuga deste escândalo ambiental que Mato Grosso abafa ano a ano.

As árvores, nesses dias nefastos, estão em pânico; olhem para elas! Enfartam durante as tardes, sacodindo suas folhas secas; ou sofrem paradas, sem o carinho do vento, conformando com o óbito imposto. Engolem o grito seco de socorro no silêncio macabro do cerrado que agora morre diante de nós.

Na historinha, os marcianos pareciam em pânico, tentando achar uma forma de sobreviver enjaulados na redoma. Acabou a comida. Um deles saiu da redoma para buscar lá fora algo para a comunidade comer. E, diante de todos, morreu convulsionando no pátio desmatado a perder de vista, naquele cenário desértico, oceano de chão rachado, cena de fim de mundo. O sol vermelho ao fundo, era igualzinho ao de Cuiabá…

Que diabo de historinha infantil era aquela? Coisa mais pavorosa…

Os verdinhos tinham cabeça grande, corpo esguio, como no imaginário dos ETs. Os bebês eram bonitinhos, tinham olhos espertos, tipo uns shereks, enrolados em mantas, no colo das mães, assustadas. Todos usavam roupas metálicas, outro símbolo de futuro distante.

Mas agora o futuro chegou ou parece mais próximo.

Todos os avisos já foram dados, os alarmes dispararam. Mas ainda ignoramos sinais vermelhos.

E se não tivesse água em abundância para a gente ingerir nesse período do ano? Quem ia sair da redoma para a comunidade não morrer sedenta?

Os córregos estão mortos, deitados feito cadáveres esverdeados pelo limo da sujeira urbana. Corpos estendidos sobre detonadas pontes, esperando pela possível ressurreição.

E não há notícia de chuva….

Keka Werneck é jornalista em Cuiabá

 

 

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