Propositadamente, ainda em trocadilhos, qual o peso da “pena” de um juiz na diminuição da criminalidade?
Como cidadão e magistrado, tenho ouvido o frentista do posto, o barbeiro, o padeiro, o médico, etc., e muitas reclamações e protestos exsurgem: “dotô… como é que é que aquele bandido estuprador já está na rua?”; “meretríssimo… fui assaltado semana passada e o ladrão que colocou a arma na cabeça do meu filho já está solto? Como pode?”
O verbo é o instrumento da mudança, inclusive foi pelo verbo que Deus criou o mundo (João, 1.1-18). Assim, ouso escrever o presente texto que trata de uma singela e apertada narrativa empírica de um Juiz Criminal e operador do direito com a igual sensação de que “algo está errado”.
Explico. Transpondo a questão da segurança pública, investigação, policiamento ostensivo, inteligência, burocracia processual, morosidade, e outros, indo diretamente às penas usadas no Brasil, digo o seguinte:
Primeiro. Diante das penas que estão sendo aplicadas a criminosos brasileiros na Indonésia (tráfico), merece destaque que são proibidas, no Brasil, pena de morte (salvo em caso de guerra declarada) e cruéis – não creio que a supressão da vida de alguém, ou amputar a mão de um batedor de carteiras, seja algo a ser feito por um ser humano digno, religioso e decente. Isso é o fracasso do Direito, do Estado, da Religião e da civilização.
Segundo. Tenho que a pena aplicada pelo Juiz Criminal ao bandido (pena em concreto), deveria visar a pessoa delinquente como um castigo e também um meio de defesa da sociedade, recolhendo em penitenciárias pessoas perigosas e as deixando fora do alcance da sociedade para que não possam cometer mais delitos contra pessoas de bem. Isso não está acontecendo a contento.
No Brasil, em regra, o criminoso só vai para a cadeia (regime fechado) se for condenado a pena superior a 08 (oito) anos de reclusão, com a possibilidade de sair da penitenciária com cumprimento de apenas 1/6 da pena e, ainda, existem inúmeros benefícios legais. Ou seja, condenado a 10 (dez) anos de cadeia, ficaria preso menos de 02 (dois) anos.
Ressalto, ainda, a deficiência da estrutura estatal para os regimes semiaberto e aberto, sendo que muitas vezes o condenado sai do regime fechado (após singelos 1/6 da pena) direto para “prisão domiciliar” (traduzindo – rua).
Indago aos leitores se essa situação não contribui para a criminalidade exacerbada que existe hoje, até diante da alta quantidade de reincidentes que cometem crimes?
Terceiro. Acredito que a desigualdade social, discriminação, desorganização do Estado, falta de educação, consumismo, também são causas preponderantes da criminalidade.
Todavia, não se surpreenda, leitor, se você encontrar o ladrão que o assaltou e, como narram nos processos, “meteu um revólver na cabeça do filho”, sentado ao seu lado, na lanchonete da esquina, ao ar livre, comendo uma pizza com a namorada e tomando uma cerveja, rindo e vivendo melhor que você, porque a pena para esse tipo de crime (roubo majorado) começa em 5 anos e 4 meses e dificilmente ultrapassará 8 anos.
Logo, dificilmente pegará o regime fechado, sem falar nos inúmeros benefícios existentes, que vão desde a progressão até o trabalho externo e livramento condicional. Não é o Juiz, o Promotor ou o Advogado que fazem acontecer. Simplesmente é a lei!
Assim, a “pena” do Juiz Criminal não é tão efetiva assim, diante dos obstáculos legais e deficiência na estrutura estatal, sendo relevante salientar o compromisso do Poder Judiciário com a sociedade contra o crime e contra a impunidade.
Diante da enorme quantidade de direitos e garantias que o criminoso tem, chegou a hora dos Poderes Constituídos protegerem a sociedade e os cidadãos de bem de forma suficiente e eficiente, dando-lhes a segurança necessária, em razão do Princípio da Proibição da Proteção Deficiente (STF, HC 104410).
Ou seja, pior do que o desrespeito às garantias e direitos individuais dos criminosos é a insuficiência da resposta do Estado Punitivo em prejuízo da coletividade.
E você? Quer “pena” para o criminoso ou tem “pena” do criminoso?
Marcos Faleiros da Silva é juiz de direito em Cuiabá.