O patrimônio cultural pode ser definido como um conjunto de bens, materiais e imateriais, dotados de relevância para história de uma comunidade, com papel especial na formação da identidade daquele grupo.
Os bens que integram o patrimônio cultural são bastante diversos, podendo contar com bens móveis e imóveis, conjuntos arquitetônicos, paisagens naturais e artificiais, documentos, sítios arqueológicos, fósseis, grutas e cavernas. Também tem ganhado bastante importância nas últimas décadas as manifestações culturais imateriais, como os modos de fazer, rituais, festas, manifestações literárias, cênicas ou lúdicas.
No Brasil, a primeira forma legal sistematizada de proteção do patrimônio cultural ocorreu no Governo Getúlio Vargas, por meio do Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, resultado da preocupação do Estado com a formação da identidade brasileira, processo no qual o Estado desempenhou papel fundamental. O Governo Vargas também é responsável pela criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1937, tendo como seu primeiro presidente Rodrigo Melo Franco de Andrade, cuja data de nascimento em 17 de agosto marca o dia do Patrimônio Histórico no Brasil.
Nesse momento, a noção de patrimônio é orientada pelos conceitos monumentalidade e excepcionalidade, com eleição de bens vinculados a “fatos memoráveis da história do Brasil”. Dessa época, herdou-se a imediata associação de patrimônio histórico no Brasil com o barroco mineiro e suas igrejas.
Embora ainda em vigor o Decreto-lei nº 25/37, a visão atual acerca do patrimônio cultural sofreu grande alteração, influenciada pelas pesquisas historiográficas e sociológicas que romperam com a crença de que apenas as realizações da elite política e econômica merecem destaque. Sobretudo com as contribuições da “Escola dos Annales”, corrente francesa que teve início na primeira metade do século XX, ficou demonstrado que todos os fenômenos podem ter importância histórica.
De certa forma, essa visão restou consagrada na Constituição da República de 1988, quando definiu o patrimônio cultural como o conjunto de bens “portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (artigo 216). Importante notar que, ao atribuir a função de proteger e promover o patrimônio não apenas o Poder Público, mas a toda sociedade, a Constituição provocou uma profunda alteração no sistema legal que rege a matéria, deixando de fixar o Estado como o detentor exclusivo do poder de definição dos bens de relevância cultural. Como observa o Professor Ulpiano Bezerra de Menezes, a escolha dos bens que compõem o patrimônio cultural de uma comunidade está vinculada aos valores a eles atribuídos, lembrando que “os valores culturais (os valores, em geral) não são criados pelo poder público, mas pela sociedade.”
A atuação do Ministério Público Federal na proteção do patrimônio cultural ocorre em dois aspectos: repressivo e resolutivo. No âmbito repressivo, cabe ao Ministério Público buscar reparação dos danos causados aos bens protegidos e a punição dos responsáveis. Sob o viés resolutivo, o Ministério Público pode articular junto aos demais órgãos de promoção do patrimônio ações de valorização e proteção desses bens materiais e imateriais, que muitas vezes acabam não recebendo a devida atenção por parte da Administração Pública.
Felipe Antônio Abreu Mascarelli é procurador da República com atuação na unidade do Ministério Público Federal na cidade de Cáceres