Como todos os anos, em 8 de março celebra-se o Dia Internacional da Mulher. A data é sempre intensamente festejada, desde anúncios e promoções comerciais até eventos oficiais e manifestos partidários. Tamanha unanimidade poderia gerar a ilusão de uma sociedade plenamente respeitosa dos direitos das mulheres. Só que não é bem assim.
Passada a efeméride, a vida retoma seu curso. Observo em pequenas expressões utilizadas no cotidiano como a cultura machista ainda está profundamente enraizada entre nós e como a discriminação afeta o cotidiano das brasileiras.
Um exemplo: a pessoa revoltada contra um deputado, prefeito ou governador pode acusá-lo de desonesto ou incompetente, mas se a parlamentar ou chefe do executivo for mulher será inevitavelmente alcunhada de "vaca" ou de "anta". O político do sexo masculino, na pior das hipóteses, é chamado de "viado", ou seja, de não ser um autêntico "macho", o que revela também uma inaceitável intolerância contra os homossexuais.
O fato é que o preconceito contra a mulher que conquista posições de destaque e liderança embute o ressentimento de muitos homens frustrados por não terem chegado lá. Mulheres como Angela Merkel ou Hillary Clinton são criticadas ou ridicularizadas por seus penteados ou vestuário, o que não ocorre com seus rivais masculinos, julgados pelos posicionamentos que adotam. Um homem que se excede na oratória é dito veemente ou, no máximo, performático; na mesma situação, uma mulher é pintada como histérica ou desequilibrada.
Da mesma forma, o jovem com vida sexual ativa e múltiplas parceiras é estimulado, louvado e invejado. É tido como "garanhão" e apresentado como orgulho da família. A jovem que tem o mesmo comportamento é chamada de "cachorra", "galinha" ou "piranha" e envergonha a parentela. Os estereótipos dominantes induzem comportamentos de assédio agressivo, infelizmente muito comuns em festas e shows, mas também nos ambientes de trabalho e escolas.
Meses atrás, assistindo o noticiário da tevê, ouvi a gravação, autorizada judicialmente, de uma importante ex-autoridade usando um linguajar semipornográfico e se referindo do modo mais rasteiro e pejorativo às suas próprias companheiras de causa. Tais diálogos não deveriam ser transmitidos em horários em que as crianças ainda estão acordadas.
Sim, o machismo ainda está muito presente entre nós e isso é repugnante. O mais triste é que vejo esse comportamento ser reproduzido por muitos jovens e mesmo por muitas mulheres. A discriminação da mulher como ser subalterno é perpetuada em um sem-número de discursos religiosos que pregam sua subalternidade ou de músicas de grande audiência que realçam sua posição de objeto do prazer masculino.
De outro lado, observo movimentos feministas elevarem ainda mais os muros dos guetos em que são aprisionados, ao abraçarem temas como a liberação do aborto, com propostas profundamente equivocadas dos pontos de vista científico, político, cultural e humanitário.
Mato Grosso ainda sofre um grave deficit de presença feminina em posições de liderança. Temos poucas prefeitas, somente uma deputada estadual e nenhuma senadora, deputada federal, vereadora da capital ou Conselheira do TCE. Em 300 anos de história, nunca tivemos uma governadora, prefeita de Cuiabá ou presidente da Assembleia Legislativa e apenas uma presidente do Tribunal de Justiça. Somente pela via do concurso público é que se conquistaram maiores espaços para juízas, promotoras, professoras, auditoras etc. Ainda temos muito que evoluir.
A Lei Maria da Penha foi uma das mais importantes conquistas civilizatórias recentes em nosso país. A chocante dimensão da violência doméstica por ela revelada indica o tamanho da revolução cultural que ainda precisamos promover, educando e reeducando a todos nós os brasileiros para o respeito às mulheres. Essa é uma tarefa de todos os dias e não apenas em 8 de março de cada ano.
Luiz Henrique Lima – auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT – Graduado em Ciências Econômicas, Especialização em Finanças Corporativas, Mestrado e Doutorado em Planejamento Ambiental, Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia.