De início, como óbvio já cabe afirmar que se trata de assunto por demais complexo e, portanto, de opiniões bastante divididas. E, também, segundo alguns autores, o termo é só suicidar, pois não se suicida outra pessoa, suicídio é sempre sobre si.
Recentemente voltou à tona devido à iniciativa da americana Brittany Maynard de praticar o suicídio assistido, em função de estar com câncer no cérebro e com prognóstico médico de poucos dias de vida.
De um lado os defensores de uma visão, mais fundamentada na religião, de que a Deus pertence o direito de “dar e de tirar a vida”. De outro, os materialistas, que acham que a vida é dela e cada um faz o que quer da sua vida, mesmo o de se desfazer dela.
Nas redes sociais e na Internet em geral há uma verdadeira enxurrada de ofensas dos dois lados. Uns a chamam de orgulhosa e decretam que ela queimará no fogo eternamente por ter praticado ato tão tenebroso. Do outro lado, os ataques à igreja por defender de maneira tão veemente o direito absoluto à vida, mas, em passado não tão remoto ter ceifado inúmeras. Citam as mais famosas, a Inquisição e a omissão no caso do Holocausto, e até outros erros, como o de pedofilia, sempre acobertados pelas instâncias superiores.
Tem o chamado livre arbítrio que deve ser considerado. Ela teve um diagnóstico de morte, em alguns dias, debateu com familiares e tomou a decisão de praticar o chamado suicídio assistido. A família acatou, numa demonstração de total respeito ao direito do outro. Era decidir sobre a vida com um final sem dor – pois também é digno morrer com sofrimento – a prolongá-la causando a si um sofrimento físico terrível, e psicológico aos seus parentes e amigos.
Até se mudou para o estado de Oregon nos Estados Unidos, já que em vários estados esse procedimento não é permitido. No Brasil, por mais que a pessoa pretendesse, não haveria essa possibilidade. O Código Penal de 1940 prevê: “induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça”. A pena seria de até seis anos em caso de consumação. No Brasil, todo ano, mais de 50 mil pessoas são assassinadas sem direito a nenhuma escolha.
Não parece razoável colocar o debate idêntico a um Fla-Flu. Trata-se de uma decisão sobre um final dramático, com diferença apenas na duração e no sofrimento.
As frases atribuídas a Brittany Maynard passam uma impressão de que são naturais, ou até com uma certa euforia, festejo, mas com certeza é apenas aparência, pois elas escondem um sofrimento profundo e se há alguma euforia é decorrente da certeza de uma escolha dramática. Não é uma escolha sobre um lugar para passear, uma roupa para vestir ou sobre o uso de uma joia, é uma escolha entre morrer agora, com menos sofrimento ou depois em extrema agonia.
Ela não escolheu tirar a vida, essa perda já estava sacramentada de qualquer jeito, optou por uma forma de morrer. E ninguém, nem religião nem Estado tem mais direito sobre a vida de alguém do que a própria pessoa.
Uma decisão como essa só requer respeito de quem tem bom senso e respeita o livre arbítrio do outro.
Pedro Cardoso da Costa – Bacharel em direito – Interlagos/SP