Esse artigo ia se chamar: “e os gatos?”. Quem me conhece sabe que incorporo ao conceito de gatos, os cachorros, esses últimos uns gatos mais estabanados.
Todos os dias recebo e compartilho pedidos de adoção de animais em Cuiabá e Várzea Grande.
São umas fofuras: gatinhos, cachorrinhos, filhotes, as carinhas mais gente boa do mundo, precisando de comida, carinho, família… e fico imaginando que a maioria não terá nada disso. Com muita sorte, um abrigo os acolherá.
Vemos essa multiplicação de gatos e cachorros nas ruas como se não tivesse o que fazer.
Entre os desafios da vida urbana está o elevado índice de animais nas ruas. Só em Cuiabá, com base em estatísticas da Organização Mundial da Saúde (OMS), são pelo menos 12 mil pets entre cães e gatos em situação de rua (e se reproduzindo).
Há o que fazer com esse problema?
É consenso que a castração é a solução de curto prazo mais viável. Cada uma dessas carinhas fofas recém-nascidas, se não castradas, em seis meses se multiplicarão em progressão geométrica.
E assim vemos a população, cujo coração se condoi, se organizar.
Tenho um amigo que todo mês tira de seu salário o suficiente para dez quilos de ração e uma castração, e doa para uma voluntária que sozinha, alimenta 40 pontos de alimentação na cidade.
Conheço outra que todo mês faz uma rifa – daquelas com nomes nas cartelas, sabe? – para alimentar e custear tratamento de animais.
Conheço gente devendo nas clínicas veterinárias que aceitam receber os animais e receber sabe Deus quando.
Conheço um pedreiro que mora em uma casa inacabada, pois tudo o que ganha, investe em ração.
E tantas e tantas pessoas com uma média de dez animais por casa, sustentando verdadeiras ONGs informais.
Tudo custa. Tudo sai dos próprios bolsos e necessidades das famílias.
E assim, surgem iniciativas até mais organizadas (como a doação de tampinhas para vender e custear castrações).
Mas como castrar uma quantidade tão grande de animais? De fato, somente o poder público – município, Estado e União – têm condições para produzir uma ação em massa dessa magnitude.
Especificamente quanto aos animais domésticos, o dever é dos municípios.
O problema é de saúde pública e precisa ser encarado pelo executivo como tal.
Para se ter ideia do quão precária se transformou a discussão de políticas públicas sobre animais abandonados, em Cuiabá existem pelo menos 30 projetos de lei em tramitação e na Assembleia Legislativa, são pelo menos 20 projetos que abordam o tema, inclusive criando política de castração itinerante e clínica veterinária pública.
Grande parte desses projetos foram criados nos últimos 5 anos, quando a causa de defesa animal ganhou mais destaque por força das redes sociais. Mas o fato de existir um projeto de lei não significa que está sendo criada uma solução concreta, porque enquanto os papéis estão arquivados, os animais estão doentes, passando fome, procriando-se e sofrendo violência na rua.
E as famílias, por piedade, estão se abarrotando daqueles que não conseguem deixar pra trás.
Combater essa realidade exige amplas frentes de trabalho. A castração é uma ação urgente acompanhada de tratamentos para as eventuais doenças que os animais adquiriram no ambiente insalubre das ruas. Ao mesmo tempo deve ser fomentado o estímulo à adoção consciente e responsável.
E não basta tirar os animais da rua, também precisa haver o cuidado para garantir que não haja o retorno para essa condição ou que a casa onde deveria ser um lar, não se transforme em um local de tortura e maus-tratos.
A castração também precisa ser incentivada e propagada para que os tutores de animais cuidem de seus pets e impeçam que mais animais nasçam sem futuro certo.
Precisamos de medidas urgentes do Poder Público, porque as iniciativas da sociedade organizada que criaram abrigos, já não conseguem mais se sustentar. Os abrigos em Cuiabá estão todos lotados, e essa é uma realidade que se repete em todo o país. O que chama atenção diante desta realidade é que por um lado existe inércia, de outro, há ainda muitos corações que aprenderam a acolher sem muitas vezes nem ter condições para isso, simplesmente pelo fato que não conseguem dizer “não” diante de uma situação de fome e doença.