Antes de entrar diretamente neste importante e controvertido assunto para o combate `a corrupção e o aperfeiçoamento de nosso regime semi democrático, gostaria de chamar a atenção dos leitores, eleitores, contrribuintes, cidadãos e cidadãs em geral para tres estorinhas já bem conhecidas da opinião pública.
A primeira estória é a do lobo e o cordeiro, quando o lobo ao “dialogar” com o cordeiro, querendo devorá-lo, não sem antes demonstrar que o mesmo era o culpado por sujar sua água, apesar de o cordeiro estar a jusante, ou seja, rio abaixo, sendo impossível sujar á agua do lobo este invocou a vida passada do cordeiro e disse que se ele não estava sujando a água, seus pais ou antepassados haviam poluido a água do Rio. Resumindo, independente da racionalidade ou da situação o lobo sempre encontra uma justificativa para comer o cordeiro.
A segunda estorinha é a da raposa e das galinhas. Ao se verem devoradas pelas raposas que agiam impunemente as galinhas se reuniram em asssembléia geral e decidiram reforçar a segurança do galinheiro e aí apareceu uma raposa bem esperta e se prontificou a tomar conta do galinheiro para que outras raposas não viessem ameaçar a vida das galinhas. Resultado, as galinhas elegeram tal raposa boazinha e no dia seguinte não havia nenhuma galinha e todas haviam sido comidas pela raposa guardiã e outras que com ela haviam participado da trama.
A outra estorinha é a do vampiro e o banco de sangue. Segue a mesma lógica, como o estoque de sangue estava acabando, os gestores do banco de sangue resolveram escolher um vampiro mor, que era o melhor conhecedor da área, ou seja, de sangue, para modernizar o banco de sangue e assim garantir sangue para quem dele precisasse. Resultado, rapidinho os estoques de sangue acabaram e , advinha quem bebeu todo o sangue que ainda havia no banco, com certeza o morcegão.
Assim também acontece nas sociedades que são constituidas por classes, castas, estamentos, categorias e grupos de interesse. Geralmente pensamos que em uma democracia e em uma república, o povo, ou seja, os eleitores são a verdadeira fonte do poder e que, principalmente os “nossos” representantes eleitos para os poderes executivo e legislativo, ao pedirem os votos de milhares ou milhões de eleitores ao serem eleitos irão defender os interesses, as aspirações e as necessidades do povo, principalmente das camadas excluidas ou do andar de baixo, que representam a grande maioria da população.
Mesmo que sejam eleitos com o voto do povão e da classe média, ao serem financiados, legal ou ilicitamente com dinheiro oriundo de grupos econômicos, nossos legisladores e governantes costumam abrir as portas de seus gabinetes para representantes desses grupos de interesse e acabam patrocinando e apresentando projetos de leis, que se transformam em leis; medidas provisórias propostas pelo poder executivo e que acabam sendo aprovadas docilmente pelo legislativo, onde estão parlamentares que foram eleitos graças ao “apoio” financeiro desses mesmos grupos de interesse. Geralmente, os políticos e gestores governamentais do escalão adoram falar “em nome do povo”, mas na verdade agem na defesa dos interesses dos grandes grupos econômicos, aberta ou nos porões da política. A operação lava jato é apenas a ponta do iceberg do que acontece na administração e na política brasileira.
Basta ver quem são os verdadeiros “donos” dos partidos políticos tanto a nível nacional quanto estaduais e municipais e há quanto tempo esses personagens estão empoleirados nas estruturas partidárias e a qual classe, estamento, categoria ou grupo econômico pertencem.
Por exemplo no Congresso nacional existem as tais bancadas, a da bala que defende os interesses dos fabricantes e comerciantes, legais ou ilegais, de armas; a ruralista que representa os interesses dos latifundiários e do agronegócio; a dos donos de escolas particulares, as de donos de hospitais particulares e de planos de saúde; a dos donos de onibus e outros meios de transporte de massa, a dos banqueiros, que representa os interesses do Sistema financeiro privado e que agem como verdadeiros agiotas, a dos empresários que defendem as medidas de interesse do referido setor, tem ainda a bancada da bíblia, mescla de evangélicos e outros grupos conservadores.
A atuação dessas bancadas mais se parece com verdadeiros despachantes de luxo, abrindo as portas do poder executivo e as vezes tentando até interferir nas decisões do poder judiciário e de vez em quando propondo medidas ou votando algumas matérias que são verdadeiras migalhas em relação ao que é destinado ao povão. Por exemplo, a bolsa empresário, via juros subsídiados, incentivos, renúncia fiscal e vistas grossas ou conivência com grandes sonegadores, é dezenas de vezes o total dos recursos destinados ao bolsa família ou outras políticas assistencialistas ou compensatórias.
A delação dos mais de 70 executivos e altos dirigentes da Odebrecht é um exemplo patente desta prática que, com certeza é a norma secreta de inúmeras outras grandes empresas envolvidas em corrupcão com propinas a políticos e gestores que gozam de foro privilegiado/especial. O mesmo se pode dizer dos mais de 40 parlamentares federais , deputados e senadores, que figuram na LISTA DO JANOT, cujas investigações, devido ao foro privilegiado dos investigados, são de responsabilidade do STF e da Procuradoria Geral da República, mas que se desenvolvem a passos de tartaruga, bem diferente do rítimo imposto na mesma operação lava jato a cargo do Juiz Federal Sérgio Moro e da Força Tarefa em Curitiba.
Este é o contexto em que surgiu e ainda se mantem esta excrecência jurídica, política e institucional tanto no Brasil quanto em alguns países que teima em ignorar os interesses da sociedade e as bases da cidadania. Em um próximo artigo analisarei alguns aspectos desta matéria que há décadas está na “ordem do dia” ou na agenda política nacional e continua como um manto protetor para corruptos de alta envergadura e quão difícil tem sido para o Congresso Nacional acabar com esta vergonha que é o foro por prerrogativa de função, a verdadeira base para que a impunidade dos crimes de colarinho branco continue em nosso país.
Juacy da Silva, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, artiulista, colaborador de jornais, sites, blogs e outros veículos de comunicação.
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