O Brasil, em matéria de plebiscito, tem dado com os burros n’água. Naquele anterior que contrapunha Presidencialismo X Parlamentarismo, ganhou a primeira – um modelo de governo mais atrasado. E é interessante lembrar que o PT, protagonista da crise atual, votou pelo presidencialismo. Sob o parlamentarismo, esta enorme crise política seria equacionada em uma semana com a imposição de um voto de desconfiança ao Primeiro Ministro.
Quando se consultou o povo sobre República X Monarquia – pasmem! – mais de 14% de brasileiros votaram pela Monarquia.
Ora, por mais convicção que tenhamos sobre o regime democrático, permitam-me um desabafo: Jesus Cristo também foi condenado à morte através de um plebiscito, foi o povo quem pediu a condenação de Jesus e a libertação de Barrabás. Todos esses fatos indicam que a lucidez democrática não se consegue em curto espaço de tempo. No Brasil de 505 anos, não temos nem 50 de experiência democrática. Temos muito a aprender.
No próximo domingo, teremos a liberdade de escolher se queremos ou não a liberdade total para o comércio de armas de fogo. Por tudo que estudei e que já vi neste meio século vivido, parece-me uma luta entre a civilização e a barbárie.
Eu faço minhas escolhas sempre com base em princípios que aprendi a cultivar. Um deles é o da democracia; o outro é o código de ética do humanismo que está fundado na cultura cristã ocidental.
O Estado democrático tem a função de “pairar” acima das classes e da luta.de classes. Logo, tem por obrigação garantir a paz social e cuidar da segurança de todas as frações de classes e isso é consenso em toda a Ciência Política mesmo antes da Revolução Francesa. Jamais o Estado democrático poderá permitir que a sociedade, por si mesma, faça a sua própria segurança. Aliás, só é cidadão, de fato, aquele que está inserido na sociedade e que consegue a proteção estatal. Portanto, quem defende que o cidadão se arme para se defender está negando, automaticamente, a natureza do Estado democrático. Mais ainda, se são os próprios cidadãos que, a rigor, financiam a segurança de todos, não há como o poder público se eximir da proteção de todos. O que se pode e deve discutir é se a sociedade de massas, como está constituída hoje, consegue financiar a sua própria segurança, por completo. Logo, a discussão é outra, é sobre as fontes e os custos de financiamento de uma segurança para todos e não a idéia de que cada homem de bem possa fazer sua própria segurança. Para isso ela não precisaria financiar o Estado.
O outro princípio que rege a sociedade ocidental está fundado na moral e na ética cristã. Ora, no corpo ético do cristianismo não há qualquer espaço para se justificar que os homens se armem com um instrumento que tem a finalidade exclusiva de matar. O princípio do “não matar” vale para todos, bandidos e homens de bens. Quem discordar disso entra em contradição profunda com a ética cristã.
O verdadeiro cristão coloca o princípio do perdão acima de tudo, como fez o próprio Jesus Cristo perdoando o ladrão. E sabe, também, que o seu Deus veio para que todos tenham vida e a tenham em abundância. Portanto, não há qualquer sentido para o cristão votar no NÃO. Ao contrário, o SIM é a sua única opção, nem mesmo a abstenção lhe é facultada, pois nesse caso estaria cometendo o pecado da omissão.
O referendo não resolverá todos os problemas, mas já é plenamente possível ter a certeza de que se o SIM for vencedor, em médio prazo, teremos a diminuição do número de mortes por arma de fogo; se vencer o NÃO, naturalmente, essas mortes continuarão aumentando na proporção em que for aumentando o número de armas, legais e ilegais. Não há dúvida sobre isso. Cabe à sociedade decidir o que ela quer. E não podemos nos esquecer que, sempre, a maioria das vítimas será de pobres.
(*) Doutor em educação, Prof. da UFMT.