sábado, 14/dezembro/2024
PUBLICIDADE

Estágio social: uma boa ideia

PUBLICIDADE
PUBLICIDADE

Acompanhando uma das primeiras entrevistas do novo Ministro da Educação – finalmente um professor!- fiquei agradavelmente surpreso ao vê-lo esboçar a ideia do que denominou 'estágio social'. Em síntese, trata-se de oferecer aos universitários da rede pública a oportunidade de colocarem em prática seu aprendizado em regiões carentes de profissionais de sua especialidade. O ministro não chegou a formular uma proposta clara, até porque, como conhecedor do ambiente acadêmico, sabe avaliar a grande reação corporativista que o tema desperta.

Exatamente por isso, considero oportuno debatê-lo.

Há muitos anos, formulei proposta semelhante para a Universidade do Estado do Rio de Janeiro, devidamente soterrada pelas forças da inércia e do elitismo, travestidas em discurso populista.

Entendo que a universidade pública deve oferecer ensino e pesquisa de qualidade, a serviço da sociedade. Deve ser gratuita apenas para quem não pode pagar e inclusive disponibilizar bolsas de ensino na graduação para estudantes de famílias de baixa renda com elevado desempenho acadêmico.

O que hoje vigora é uma gratuidade hipócrita, que beneficia alunos de alta renda que dela não têm necessidade e penaliza duplamente os de origem pobre: pela redução do número de vagas disponíveis, uma vez que a gratuidade atrai aqueles que fizeram o ensino médio nos colégios mais caros e de melhor desempenho; e pelos custos indiretos inflacionados em alimentação, transporte e, principalmente, material didático. Penso que um critério equânime e razoável seria cada estudante pagar à universidade pública a mesma mensalidade que pagou no último ano do ensino médio. Quem estudou na rede pública não pagaria nada e quem cursou colégios caros não teria alteração no orçamento.Haveria mais recursos para laboratórios e equipamentos. Já mestrado e doutorado devem ser gratuitos e com bolsas. Alunos faltosos sofreriam penalidades pecuniárias, desestimulando a evasão que hoje é alta.

Um dado frequentemente omitido do debate é que no Brasil o gasto público em educação por aluno do ensino superior é 5,2 vezes maior que o do aluno do ensino fundamental enquanto,conforme a Unesco, no Japão essa relação é de 0,9, na Coreia do Sul de 0,5, no Chile de 1,0 e na Argentina de 1,1. Não surpreende que todos esses países alcancem desempenho bem melhor que o nosso nas avaliações internacionais de aprendizado.

Voltando ao estágio social. Considero justificável, legítimo e necessário que a sociedade brasileira, que financia o ensino superior público e gratuito, exija um mínimo de contrapartida dos beneficiários. Se o povo brasileiro paga o custo para um cidadão se formar em medicina, porque não estabelecer que nos dois primeiros anos após sua formatura ele exerça sua clínica nas regiões do estado com piores indicadores de saúde ou nos bairros carentes de profissionais de sua especialidade? O mesmo raciocínio se aplica a engenheiros, que irão atuar onde há déficit de saneamento e infraestrutura, a bibliotecários, cientistas sociais etc.

Regras semelhantes existem em dois países de regimes bem diferentes: Cuba e Estados Unidos. Em Cuba, o ensino é gratuito, mas o profissional recém-formado vai atuar onde o governo identifica necessidade. Nos EUA, universidades públicas como a de Massachusetts oferecem créditos acadêmicos para a prestação de serviços comunitários supervisionados.

Mesmo no Brasil, isso não é novidade. Na Escola Naval, por exemplo, além do ensino ser gratuito e de ótima qualidade, os aspirantes recebem alojamento, alimentação, vencimentos e assistência médica. Todavia, firmam o compromisso de servir na Marinha por cinco anos, no posto para onde forem designados, sob pena de ressarcimento de todas as despesas realizadas pela União. Da mesma forma, bolsistas de doutorado no exterior se comprometem a retornar ao Brasil e aplicar os conhecimentos adquiridos. Porque não implantar regras semelhantes nas universidades públicas federais e estaduais?Terá o ministro coragem para levar adiante esse debate?

 

Luiz Henrique Lima – auditor substituto de conselheiro do TCE-MT- graduado em Ciências Econômicas, Especialização em Finanças Corporativas, Mestrado e Doutorado em Planejamento Ambiental, Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia

COMPARTILHAR

PUBLICIDADE
PUBLICIDADE

Mais notícias

Saiba usar o poder de recomeçar

Algumas pessoas apesar de ter a consciência do desperdício...

Tecnologia a serviço da sustentabilidade

A evolução tecnológica desempenha um papel fundamental no fortalecimento...

Tive um Infarto, posso fazer exercícios?

A prática de exercícios físicos após um infarto do...