O trecho e opinião a seguir fora escrito e manifesta pelo Desembargador Luiz Carlos da Costa e é parte do despacho que o mesmo concedeu, no dia 25 de setembro de 2012 – de forma monocrática – a um recurso impetrado ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso como forma de assegurar uma vaga no ensino superior a um aluno (no caso, meu filho) concluinte do ensino médio: "Ora, não se mostra razoável conferir privilégio dessa estirpe ao agravante, quando a todos se exige o término do ensino médio para só então ingressar nos bancos universitários. Defender o oposto é fomentar um inescrupuloso senso social de "esperteza", sem qualquer justificativa razoável para promover tamanha discriminação entre aqueles que se encontram em situação de igualdade." (grifo meu).
Confesso que o julgamento feito pelo magistrado me pegou de surpresa, tamanho o espanto que tive, por me sentir acusado, aos olhos do excelentíssimo, de tentar "fomentar um inescrupuloso senso social de esperteza". Não é nada disso, meritíssimo!
O que buscávamos, Sr. Juiz, era um julgamento do mérito, alias, meritocracia é o pilar que sustenta qualquer certame, como o concurso (ou concursos) em que Vossa Excelência logrou êxito e também os concursos vestibulares, como o concorrido vestibular para ingressar na UNEMAT. Foi a partir do mérito que um estudante de escola pública (se Deus quiser, há dois meses de concluir o médio) conseguiu aprovação em Engenharia Elétrica no campus de Sinop. Foi com mérito e muitos estudos que os advogados que foram procuradores desta causa pesquisaram e encontraram vários processos onde o julgamento do mérito de alunos não concluintes do ensino médio obtivera, de forma lícita – e, aos meus olhos, justa – a concessão para continuarem seus estudos de ensino médio e paralelamente, cursarem o curso superior ao qual, meritíssimo, com mérito (desculpe o trocadilho), foram aprovados. Portanto, se existia jurisprudência, os advogados que assumiram a causa também não se pautaram na "esperteza". O que esperávamos, Sr. Desembargador, é que Vossa Excelência se manifestasse com relação ao mérito da demanda ao invés de fazer juízo de valores, inclusive de seus pares, quando de forma indireta os acusa de fomentar a "esperteza". Será que todos os juízes e, efetivamente, os tribunais se pautaram na "esperteza", como o senhor escreveu (desculpe se me atrevo a uma tentativa de análise de seu discurso) ao julgarem favoravelmente demandas similares a estas. Definitivamente, Sr. Desembargador, não pactuo com a Lei de Gerson. Também não pactuo com a Lei do Arnaldo Cesar Coelho ("a regra é clara"). Nesse sentido, por não considerar a clareza da lei, é que recorremos e para isso servem (ou devem servir) os tribunais. Só queria "fazer valer" a vontade de estudar de um guri de 16 anos, estudante de uma ótima escola pública em Sinop – em que pesem as faltas de investimento infra e superestruturais – a Escola Estadual Ênio Pipino. Queria dar respaldo ao sonho de formação no ensino superior de um menino que jamais deu trabalho em casa, na escola e muito menos na rua (lembrando que rua não é lugar de criança, salvo quando tem seus sonhos interrompidos pelos infortúnios da vida ou pelo descaso de pessoas irresponsáveis que deveriam educá-los, alimentá-los e guiá-los para a boa convivência humana). Confio incondicionalmente e rogo que este guri jamais dê trabalho, como dizia meu pai, "à boa justiça", como infelizmente muitos adolescentes infratores o fazem (mesmo que eu os perceba como reféns de uma sociedade injusta e que não dá as mesmas condições de acesso à pobres ou ricos, informados ou ignorantes).
Quando recorremos ao tribunal, buscávamos um direito que já foi e tem sido líquido e certo para centenas, talvez milhares, como forma de prestigiar e valorizar o mérito do aluno, de seus professores, da escola pública, democrática, que deve ser acessível a todos e que deve ser "acreditada" – principalmente por agentes públicos. Sr. Desembargador, como forma de suscitar e provocar discussão sobre o processo educacional (desde a forma de progressão dos alunos especiais, portadores de altas habilidades, talentosos…) a partir da LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que é de 1996 – por ironia, ano em que meu filho nasceu – e que trata do atendimento aos alunos (que não devem ser pejorativamente chamado de "espertos") portadores de altas habilidades (não é o caso do meu rebento – não tenho um gênio em casa) ou simplesmente talentosos como se configura na Resolução do Conselho Nacional de Educação – CNE/CEB nº 2 de 11 de setembro de 2001 através do "aprofundamento e enriquecimento de aspectos curriculares, mediante desafios suplementares nas classes comuns, em sala de recursos ou em outros espaços definidos pelos sistemas de ensino, inclusive para conclusão, em menor tempo, da série ou etapa escolar, nos termos do Artigo 24, V, "c", da Lei 9.394/96. (..)". Ora, Sr, Desembargador, se o guri mostrou talento ao ser aprovado no vestibular, somente pleiteamos um direito já atendido a muitos outros. Se isso não basta para que o senhor atenda um pedido legítimo, é desnecessário que o senhor, do alto de sua sabedoria e poder que lhe é conferido, pareça desrespeitoso com quem solicita a equidade da lei (mesmo que esta seja obscura aos múltiplos olhares). Confesso que, além de leigo, jamais gostei de tentar entender as incoerências do direito e prefiro pensar nos valores que recebi dos meus pais, que me ensinaram – entre outras coisas, a respeitar os outros e jamais iniciar uma relação, que se pretenda franca e dialógica, imaginando que o outro tenha a intenção te "passar a perna" ou que está se valendo da Lei de Gerson. Por isso, alheio ao direito – que respeito – e preciso confiar, continuarei a educar o João Lucas, a Giovana e o Danilo André através de princípios que foram forjados em experiências de vida das pessoas que nos inspiram. Mais ou menos como diz a letra da música "Só para meu consumo", do Luiz Marenco: "Tem coisas que tem seu valor, avaliado em quilates, e cifras e fins … e outras não tem o apreço nem pagam o preço que valem prá mim….Das vozes dos outros eu levo a palavra / dos sonhos dos outros eu tiro a razão". Por princípios e por acreditar que estamos num estado democrático, me atrevo a tornar pública esta minha indignação e veiculá-la nos canais da imprensa livre, com a certeza de que não sofrerei represálias e que não serão apreendidos os jornais que a publicarem antes do raiar do sol, como acontecia no Brasil dos militares.
João Batista Lopes da Silva é professor em Sinop – MT.