Introdução:
Meu avô tinha um ditado – acredito que de autoria própria. Era assim: quando não se tem nada a dizer, não diga nada. Ou então diga por sua conta e risco, sabendo-se que, de tudo o que for dito, muito pouco, ou nada, será aproveitado. É curioso como a mente humana (ou de alguns humanos) expele sabedoria, conhecimentos adquiridos que poderiam ser compartilhados, e armazena mazelas – coisas insignificantes.
Meu avô era um mestre em sapiência. Tinha os olhos no futuro. Um dia chamou a Judith (Judith era a professorazinha da colônia onde morávamos) e “carcou” sem dó: “Tá na hora de você ensinar contas novas pras crianças, contas velhas, essas de mais e de menos, elas já sabem!”. Contas de mais e de menos, de somar e de diminuir, daquele tempo, do tempo em que a matemática ainda se chamava aritmética, eram as tais adição e subtração dos dias de hoje.
Meu avô, bem que poderia ter sido prefeito, vereador ou inspetor de quarteirão – função nobre designada por muitos a muito poucos. Não. Peão de fazenda e pau pra toda obra, meu avô sempre viveu de seu suor sob arreios e freios da dignidade. Podendo ajudar, ajudava. Quando não podia, buscava-se um jeito pra que o necessitado fosse ajudado, ou seja, meu avô ajudava sempre, sem que isso o fizesse se achar um menestrel, ele era um menestrel.
Meu avô… Tivesse ele vivido na Grécia Antiga e teria seus olhos ofuscados pela lanterna de Diógenes num grito de eureca! Deixarei meu avô em paz, para que assim (em paz) ele descanse.
Desenvolvimento:
Terça-feira passada, na Câmara Municipal, que está se tornando o point das manhãs de terças (como diriam os deejeys), onde tudo acontece, alguns vereadores que geralmente não têm nada a dizer, mas acabam dizendo para não ficar fora da mídia, embora do que se diga muito pouco ou nada se aproveita como dizia o meu avô, deram aulas de letargia. Um deles, despertando a sua oposição doentia, teceu comentários sem fundamentos sobre fazeres e não fazeres da Administração. Com voz impostada argumentou que nossa prefeita não está cumprindo o que prometeu, tudo porque máquinas quebradas (como se máquinas fossem eternas como as basbaquices do edil) impossibilitaram a Secretaria de Obras de cumprir com algumas previsões.
Inconcebível. O vereador tem os seus motivos para continuar sendo do contra, afinal ele é o único remanescente daquele grupo que as urnas extirparam no último 03 de outubro. Mas como os iguais se encontram, ele tem, entre os pares, quem de suas idéias compartilhe ou possa, a partir delas, ocupar o espaço diário que tem numa emissora de tevê para esbravejar que a casa não está arrumada. Acudam-nos, a velhinha de Taubaté, personagem criada por Luis Fernando Veríssimo, continua viva.
Mas, voltando ao vereador do contra, estupidamente do contra, pelo simples fato de que se não o fosse estaria traindo seus princípios exóticos e bizarros, o parlamentar em questão é o mesmo que na terça-feira anterior havia ressuscitado o “manelau” armazenado dentro de si (manelau é neologismo meu) com a história de uma rotatória lá dos Araras (arquivo morto em trocadilho ao bairro em cujo dorso repousam bons e maus que se ausentaram de nosso convívio) que no passado fora usada politicamente pelo vereador, agora pega muito mais como ironia dele para ele próprio.
Depois, o mesmo, o “inteligente” vereador, partiu para o campo da cultura e do entretenimento. Questionou o fato de dois eventos, constantes do calendário oficial do município, terem sofrido algumas alterações, ou seja, um teria mudado de local e data de início e o outro só ter sido possível a sua realização devido à interferência do setor privado, como se tudo fosse único e exclusivamente obrigação do Poder Público.
E tem outra, excelência, datas só não são passíveis de mudança aquelas que foram oficializadas como datas comemorativas, tais como, o Natal, o dia das crianças, dos pais, das mães, do trabalhador, dos namorados, do nosso aniversário etc. (com exceção à Páscoa e ao carnaval que sabemos apenas o dia da semana). As demais datas, destinadas à realização de eventos, essas, me poupe.
Conclusão:
Poupe-nos. Poupe nossos ouvidos. Poupe-nos para que possamos continuar, eventualmente, participando de vossas sessões, embora haja quem prefira as de candomblé onde Pais e Mães de Santo baixam a coisa, mas não baixam o nível.
Em tempo: por um momento eu menti sobre o meu avô. O ditado, ao qual me referi, não é dele. Criei essa situação como busca de inspiração para esse texto. Meu avô morreu bastante jovem, eu tinha dois ou três anos e nem cheguei a conhecê-lo. Eu menti sobre você meu avô. Perdoe-me. Menti e confesso. Ao contrário de alguns edis que continuam mentindo a todos nós. Mentido com ênfase para que pareçam verdade e até eles acabem acreditando. Nada ou pouco se aproveita, porém, vão pra mídia.
Carlos Alberto de Lima é jornalista em Alta Floresta