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Diálogos Ministério Público/parlamentos municipais para efetividade do controle social

Edmilson da Costa Pereira é procurador de Justiça e titular da Procuradoria de Justiça Especializada da Cidadania e do Consumidor
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O tema Controle Social é recorrente nas discussões entre agentes públicos e cidadãos que militam em favor de determinada política pública, mas, apesar da definição constitucional e da normatividade correspondente à matéria, ainda não foi possível torná-lo plenamente assimilável pelo conjunto da sociedade. Na realidade, controle social é visto como incômodo por alguns gestores e não é devidamente valorizado pela comunidade, ainda que por meio dos integrantes de seus colegiados representativos, exerçam substancial trabalho em benefício da sociedade e da transparência administrativa.

A Constituição da República, no artigo primeiro, estabelece que o exercício do poder pelo povo dá-se por meio dos representantes eleitos ou diretamente, nos termos em que ela estabelece. Por isso, o tema controle social precisa ser visto por todos como o corolário dessa definição da Lei de Princípios.

Sabe-se que o cidadão brasileiro pode peticionar junto aos Poderes Públicos para a defesa de seus direitos e obter certidões em repartições públicas (Art. 5º XXXIV); receber informações particulares ou de interesse coletivo dos órgãos públicos (Art. 5º XXXIII); promover ação popular (Art. 5º LXXIII); fiscalizar as contas municipais (Art. 31, § 3º); denunciar irregularidades ou ilegalidades (Art. 74, § 2º); participar dos conselhos de gestão de saúde (Art. 198 III), assistência social (Art. 204 II) e educação (Art. 206 VI) e cooperar, via associações representativas, no planejamento municipal (Art. 29 XII).

Apesar dos avanços que permitiram a inclusão desse conteúdo em sede constitucional, é forçoso admitir que falta, ainda, incutir o legado para que haja, de fato, a possibilidade de participação do cidadão, pelos meios admitidos em lei, na gestão pública. Em regra, não há, na administração pública brasileira, em todos os seus níveis, a definição das prioridades, metas e indicadores para se alcançar esse objetivo, compreendendo a missão do controle social em uma visão reducionista, limitada a alguns padrões burocráticos afetos aos conselhos constituídos.

Por isso, as estruturas públicas não adotaram, salvo honrosas exceções, adequações significativas em sua atuação, ensejando essas mudanças.

É visível o distanciamento que há entre a gestão das políticas públicas e o atual estágio da sociedade, marcado pelo compartilhamento de informações e exteriorização de ideias, fomentando a disseminação de fatos que, não raro, carecem de aprofundamentos em análises técnicas. Para tanto, é indispensável que o gestor público e os órgãos de controle desenvolvam ações voltadas especificamente para a valorização das manifestações coletivas, por meio de associações, grupos de trabalho, conselhos, etc. Esse cenário precisa ser inserido no contexto de produção, absorção e compartilhamento do conhecimento e não apenas de “referendum” para legitimar atos de gestão.

O Ministério Público, instituição consagrada na Constituição Federal como responsável pela defesa da sociedade, deve atuar integrado com esses mecanismos de controle social, e o Poder Legislativo, notadamente as Câmaras Municipais, precisam sintonizar sua missão de produção legislativa e fiscalização com esses cenários, estabelecendo, também, meios para valorizá-los.

É importante que a sociedade e órgãos de controle, inclusive o controle social, entendam que apesar das decepções que por vezes a busca de uma medida administrativa e/ou judicial em prol da coletividade possa acarretar, em face dos desarranjos na gestão pública, do desequilíbrio entre o interesse econômico e social ou até da falta de sintonia com as reais dimensões da causa em debate, não há alternativa mais adequada para a solução da demanda que a pactuação coletiva onde todos sintam-se corresponsáveis.

Para a introdução de um modelo em que a participação social seja sintonizada com o norte constitucional, mister se faz as adequações nos diversos órgãos que compõem a estrutura pública. É preciso que os Poderes e os órgãos autônomos discutam as estratégias que permitam o nivelamento interno a respeito das atribuições de cada um e de como essas atribuições estão sintonizadas com as diretrizes constitucionais, valorizando, também, a participação popular. Só assim é possível qualificar a atuação do setor público e ao mesmo tempo legar à sociedade os meios para dar efetividade às suas demandas.

A conexão com lideranças comunitárias, entidades organizadas e representantes dos Poderes constituídos, notadamente dos legislativos municipais é, sem dúvida uma das alternativas para implementação efetiva do controle social. Essa conexão, todavia, deve ocorrer de forma ampliada, propiciando ao cidadão o conhecimento das decisões estratégicas, auferindo se essas estão, de fato, em harmonia com os reais interesses coletivos.

Nesse cenário, o Vereador é fundamental para que a sociedade possa ter ampliadas as possibilidades de acesso à administração pública, mas é, também, muito importante para que essa mesma sociedade seja motivada a promover discussões qualificadas sobre os temas afetos à comunidade, eliminando, ela própria, as eventuais anomalias que prescindem da intervenção do setor público.

A atuação planificada requer, sobretudo, competência técnica para definição das prioridades, pois são inúmeras as demandas relacionadas à cidadania, envolvendo saúde; pessoa idosa; educação; pessoa com deficiência e defesa do consumidor; ao meio ambiente; ao patrimônio público; à segurança pública etc. E essas prioridades só terão relevo, se definidas a partir da interatividade com representantes da sociedade (Conselhos gestores, lideranças, autoridades etc) e da própria sociedade (jovens, donas de casas, trabalhadores, usuários dos serviços etc). Por isso, a mudança de paradigma, capacitando os interlocutores, proporciona a qualificação dessas demandas.

Crucial, também, é a sintonia com temas que por vezes, nem a própria sociedade enxerga que podem contribuir para resolvê-los. Só com o envolvimento coletivo é possível reduzir a disseminação do ódio, por meio das relações sociais; a discriminação que alguns incautos insistem em reproduzir; a insciência sobre questões que resultam em cerceamento de direitos; as práticas predatórias ao ambiente, presentes no dia a dia das pessoas; o consumo inadequado de alimentos; a percepção generalizada que a prática de esporte é apenas uma atividade lúdica e não essencial para a saúde humana, etc

Na interatividade social, a exteriorização comum dos desejos do grupo – como o sonho de ver asfaltada uma rua; funcionamento adequado da unidade de saúde; eficiência do aparelho policial; regularização no fornecimento de água; combate a pontos de disseminação de drogas; comercialização de produtos saudáveis, etc., requerem a conciliação com as limitações existentes para a resolutividade, sob pena de tornar o planejamento tarefa inalcançável, inviabilizando, inclusive, outras iniciativas com tal escopo.

É importante que a sociedade destinatária das medidas, os agentes incumbidos de realizá-las e as autoridades que têm a missão de concebê-las, discutam as metas e todos sintam-se partícipes do processo. Com isso, a possibilidade de concretizá-las torna-se real.

O Ministério Público do Estado de Mato Grosso acumula significativa experiência na recepção de desconformidades na administração pública e no setor produtivo em geral, viabilizando a adoção de medidas saneadoras ou de responsabilização pelo desrespeito às normas. Apesar do caráter pedagógico que essas ações acarretam, não incutem o legado definido na Constituição da República de fortalecimento dos controles internos (para os órgãos da administração) e sociais tão necessários para a edificação de uma sociedade cada dia mais justa.

De outro norte, a construção legislativa em âmbito municipal não aborda, na dimensão anunciada e como propósito institucional, a temática do fortalecimento do controle social. Além disso, os próprios mecanismos dispostos pelo Estado Democrático de Direito para sustentar a Democracia, não possuem padrões comuns para esse escopo. Em verdade, há certa insciência, inclusive no que alude às atribuições de cada um, em relação à matéria.

Por isso, o diálogo entre integrantes dos Parlamentos Municipais e do Ministério Público para que, a partir de discussões regionalizadas debatam os meios para incrementar, nas comunidades, a participação do cidadão na gestão pública, conforme preconizado na Constituição, pode ser, de fato, a medida inovadora que contribuirá para o rompimento de um modelo que não responde mais, com eficiência, aos interesses da comunidade.

Registre-se que a atual gestão do Ministério Público do Estado de Mato Grosso, acatando proposta de Promotores de Justiça que atuam nos mais longínquos municípios, empenha-se em ajustar com os parlamentos municipais, encontros para viabilizar o diálogo almejado, criando as condições para que os senhores vereadores estabeleçam cenários, viabilizando, também, as discussões com a sociedade organizada (ou não). O passo inicial é, sem dúvida, a pretensão de contribuir para formação desses agentes públicos, externando os papéis de cada um no exercício dessa nobilitante tarefa.

Vale lembrar que o cenário da conciliação para resolutividade de demandas é a alternativa indicada, inclusive pelo Código de Processo Civil, que cuida dos passos para se alcançar resultados nas questões conflituosas. Com isso, é atribuição do membro do Ministério Público contribuir para a redução da conflituosidade na sociedade e nada mais adequado para tal escopo que desenvolver programas de trabalho voltados para a multiplicação dos agentes responsáveis pela adoção de práticas que ensejem a coparticipação coletiva na análise e resolutividade de demandas que importem ao coletivo.

Os movimentos sociais no Brasil e, por consequência, as representações organizadas da sociedade são, em regra, moldados para reivindicar junto ao Estado, demandando serviços ou acessos a bens de consumo coletivos. Não há, em nosso meio, mormente nos pequenos municípios, a prática de discussões comunitárias para produção de alternativas visando resolução de desconformidades ou proposição para transformação de conflitos.

Na discussão produtiva sobre o moderno Estado Brasileiro, resta claro que as instituições precisam empreender mudanças estruturais capazes de torná-las eficazes nas respostas às pretensões ditadas pela Constituição da República em relação à sociedade.

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