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De vazio

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Terceira idade ou velhice é tempo de solidão. Principalmente quando o indivíduo é pobre e não tem convívio social. No meu caso não há razão pra reclamação, por duas razões: primeiro porque minha mulher e nossa perradinha de filhos e netos nunca me abandonam. Depois, porque fiz a opção da relação cotidiana seletiva dentro da máxima bem antiga e universal “antes só do que mal acompanhado”.

O vazio ou quase isso é ainda pior nas tardes de domingo e à noite ao longo da semana. Por sorte, Charles Miller trouxe para nós o futebol, esporte mágico que nivela e fraterniza a humanidade. Como é bom ver a bola rolando faceira pelos gramados! Melhor ainda é quando o time do coração domina o jogo, estufa as redes adversárias. A cada gol do meu Galo, na solidão do meu canto na sala grito a todos os pulmões como se, num passe de mágica, Deus em sua infinita bondade houvesse me devolvido a juventude, os 20 anos.

A televisão tem a química de quebrar a cadeia do isolamento. Ela nos transporta para a quase interatividade com o futebol dentro das quatro linhas e nas arquibancadas. Mesmo distante a gente grita ao treinador: “tira o Fulano, bote logo o Marcos Rocha que ele está bem!”. É quase um transe, algo que nos leva à beira do delírio.
A paixão do torcedor por seu time é grande, mas a pelota somente rola quando duas equipes estão em campo. Nesse contexto entra o adversário. O jogo do meu Galo não é uma disputa isolada; ele se insere no contexto de campeonatos e copas com dezenas de outros clubes.

A paixão pelo Galo – aquele amontoado de jogadores capaz de quebrar o isolamento da minha velhice – aguça meu interesse pela competição como um todo. Como está Mengo? O Inter cai ou não cai? A Chape, aquele time cascudo, é danado! O Vascão voltou, mas em 2017 a gente o manda de volta à Série B!…
Vejo os jogadores do Galo como se fossem figuras do meu convívio. É assim com Victor, Léo Silva, Leandro Donizete, Robinho, Lucas Pratto, Luan, Rafael Carioca, Fred, com todos. Esse sentimento se repete em intensidade quase tão febril com os craques dos demais times.

Minha relação com o esporte é bem parecida com a de milhares – milhões, sem exagero – de brasileiros que teimam em torcer pelo mais fraco quando a partida não envolve seu time. Foi assim que a Chapecoense entrou em minha vida, sem que sequer conheça Chapecó, sua cidade. Mesmo assim, nunca pensei naquele clube enquanto esperava pelo sono no meu ontem. Meu envolvimento com a equipe catarinense sempre ficou restrito ao tempo de transmissão dos jogos ou durante os programas esportivos. Com a cabeça no travesseiro somente o Galo, no campo esportivo, povoa minha mente.

Na terça-feira desta semana acordei quando o dia começava a clarear. No celular olhei as horas e instintivamente cliquei no Terra. O susto foi grande. A manchete falava em 25 mortos na queda do jato que levava a Chape a Medellín. Senti muito pela perda da vida de tanta gente e essa dor aumentava a cada atualização da dimensão da tragédia. Afinal, são personagens da minha relação, figuras com as quais convivia à distância, como se estivessem presentes no meu mundo. Santa Catarina chora. A dor é imensa. A Pátria de Chuteiras está enlutada e meu mundo, mais vazio e triste. Descansem em paz!

Eduardo Gomes de Andrade é jornalista em Cuiabá
[email protected]
 

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