Quando há 42 anos Pelé fez seu milésimo gol, o poeta Carlos Drumond de Andrade, frasista renomado, proferiu a seguinte pérola: "O difícil, o extraordinário, não é fazer mil gols como Pelé. É fazer um gol de Pelé”. Drumond, tão encantador com as palavras, como foi Pelé com a bola, na verdade queria dizer que o importante não é a quantidade é a qualidade. Fazer 1000 gols outros poderão fazer, mas não ao estilo de Pelé, que é único e inimitável. Se Drumond fosse vivo, provavelmente, à vista do centésimo gol de Ceni, reformularia sua frase: “o difícil, o extraordinário, não é fazer mil gols como Pelé. É fazer cem gols como Ceni”. Quando alguém poderia imaginar que um goleiro, que está em campos para evitar gols, fizesse cem gols.
Pelé fez mais de mil gols, Romário também. Feitos extraordinários, porém dentro das possibilidades do futebol, se considerar que a meta de todo jogador em campo é balançar a rede do adversário. Todos não. Todos menos um, o goleiro. A missão do goleiro não é fazer gol. É defender seu gol para evitar que o time adversário o faça.
Rogério Ceni fez a diferença, foi além do seu espaço em campo. Não só defendeu seu gol com competência, como marcou, ele próprio, cem gols no adversário: 44 de pênaltis e 56 de faltas. Um feito mais que extraordinário e, provavelmente, inatingível. Quantos goleiros goleadores existem hoje, ou existiram no passado?
E o mais extraordinário é que, num período em que jogadores trocam de clube com a mesma facilidade com que trocam de roupa, Ceni tenha feito os cem gols com a mesma camisa, a do São Paulo. Foram 20 anos defendendo o clube, 965 partidas disputadas e 15 títulos conquistados
Mais uma vez lembrando Drumond: Fácil é um jogador de ataque fazer gol. Difícil é goleiro fazer gol.
E o mais difícil: ser Ceni. Seu nome já diz tudo: Ceni é cem. Ceni é único. Cem vezes Ceni balançou a rede do time adversário. Cem vezes Ceni fez a alegria do torcedor. Cem é a nota que Ceni merece. Cem vezes urras para Ceni.
Waldir Serafim é economista e são-paulino.
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