Caro Governador!
Já se foi o tempo em que tínhamos ídolos políticos, meu pai (75 anos e saudável) teve a felicidade, que eu não tive, de vivenciar esses anos. Ele ainda fala em Getulio, Jango, Juscelino e Brizola, nomes que estão vivos em sua memória e quando ele lembra, lembra com carinho e saudades da militância.
Nasci em 63 em plena democracia, nem bem tinha desmamado aconteceu o golpe de 64, minha infância e juventude foram vividas nos anos de chumbo marcados pela ditadura militar, e que anos, sinto falta das manifestações relâmpago, das reuniões escondidas, da UNE, do Grêmio Estudantil, que saudades da ala jovem do MDB cujas manifestações eram marcadas pela luta em busca da anistia política, pedíamos a volta de Brizola, chorávamos nos discursos do Pedro Simon afinal tínhamos uma causa.
Depois, já na “abertura” política, veio o movimento Diretas Já, onde novamente fomos para as ruas, agora sem medo da policia, ouvir nossos ídolos que ainda eram os mesmos pois tínhamos uma causa.
Lugarzinho assombrado! Essa era a impressão que tínhamos quando chegamos em Lucas do Rio Verde nos idos de 86, o recém criado distrito ficava a duzentos quilômetros da sede e tinha tudo por fazer, precisávamos da emancipação urgente, opa! Nascia ali uma nova causa.
Criamos o PDT, pois ainda carregávamos no sangue alguns vestígios, talvez genéticos, dos velhos sonhos e dos velhos ídolos que ainda eram os mesmos, já eleito vereador tive a oportunidade de dar um inesquecível abraço no velho Brizola, vontade que estava enrustida desde Porto Alegre quando não me deixaram chegar perto dele num comício do movimento das “Diretas Já”.
Ainda com o partido em formação chega Dante de Oliveira, isso mesmo o homem das “Diretas Já”, símbolo contemporâneo da democracia, maravilha, surge uma nova causa: a conquista do Estado. Fomos e conseguimos, e agora Dante?
E agora? E agora é que continuou tudo como era, achávamos que havíamos tomado o Estado das velhas oligarquias descendentes das capitanias hereditárias e nada. Dante, antes esperança agora decepção, virou tucano, não participei desta revoada, virei traidor por não me aninhar com aqueles pássaros.
Quando tudo parecia meio perdido surge Ciro Gomes e o PPS com propostas para Mato Grosso, falava em logística, BR 163, ferrovia e outras coisas mais que soavam como uma canção aos nossos ouvidos, os ídolos não eram mais os mesmos, mas mesmo assim surge uma nova causa.
Mas o que é bom se termina, cumpriu-se o velho ditado, rotulado como o único cara que poderia vencer Lula no segundo turno, mais uma decepção, Ciro vira ministro e esqueceu da logística, esqueceu da BR 163, esqueceu da ferrovia e das outras coisas mais que agradavam aos nossos ouvidos, a canção desafinou perdendo toda sua harmonia.
Mas que nada, a vida continua, quando mais uma vez as coisas pareciam perdidas chega você Blairo assoviando uma nova canção, desta vez mais harmoniosa, com rimas de um novo Mato Grosso, nossa! O rei da soja, um capitalista no PPS, onde o ultimo “S” é a inicial de Socialismo, ta aí a centro esquerda que eu sempre sonhei, olhei para a palma da minha mão e descobri que também tinha um “M”, me identifiquei, calcei minha botina e fui para a luta, surgia ali uma causa e porque não um novo ídolo totalmente diferente dos outros, será?
Os primeiros quatro anos de seu governo superaram minhas expectativas, não que você tenha feito coisas extraordinárias, é que eu já estava com o lombo ardido pelo açoite dos governos passados e qualquer ato, mesmo o mais trivial, me chegavam como grande novidade capaz de inspirar meus discursos na tribuna da Câmara de Vereadores. Meu Deus! Como fiquei tão pequeno, preciso rever meus valores, preciso de uma reciclagem urgente, não era o que queria, ou melhor, não era só isso que eu queria, não é só isso que eu quero.
Talvez por falta de outro melhor, lutamos mais uma vez para recolocar o nosso ídolo no segundo mandado, quatro anos foi pouco, precisamos dar uma nova chance a ele, afinal o Estado estava quebrado quando ele pegou, será?
São duvidas que de vez em quando rodopiam na minha cabeça: Por que o meu ídolo, o rei da soja, tido como símbolo e para muitos a certeza de que o agronegócio é viável, resolveu apoiar aquele que em três anos e meio de governo inviabilizou o setor, mantendo a taxa de juros nas alturas a fim de fortalecer a nossa moeda dando lucro aos especuladores internacionais (que não geram empregos no Brasil), jogando a cotação do dólar num precipício, mantendo o preço da soja no fundo do poço e conseqüentemente causando desemprego em massa nos diversos segmentos do agronegócio por esse Brasil afora?
Todas essas duvidas me levam a crer que devo terminar esta carta daqui a quatro anos, a esperança me diz que não devo enterrar meu ídolo, ainda quero poder falar coisas grandiosas a seu respeito. Será?
* Carlos Girotto é vereador do PPS pelo quarto mandato em Lucas do Rio Verde e acadêmico do quarto semestre de direito da Univerde