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BNDES financia o câncer dos brasileiros ?

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No Centro do Rio de Janeiro, a avenida Chile abriga as sedes dos dois maiores ícones do capitalismo estatal brasileiro: a Petrobras e o BNDES. Uma em frente à outra, são vizinhas da sede regional da Caixa Econômica, ensejando que a irreverência carioca há muitos anos, de forma premonitória, apelidasse o local de Triângulo das Bermudas. Observando o tsunami que alcança a Petrobras, com vários ex-diretores presos e prejuízos de dezenas de bilhões de dólares, imagine-se o frio que percorre a espinha no outro lado da avenida. Afinal, com negócios bilionários nos dois lados da via pública, é difícil supor que os ‘malfeitos‘ só tenham ocorrido na calçada esquerda de quem vai em direção à Lapa.

Mas o assunto de hoje não é a corrupção.

Imaginem que o BNDES financiasse a plantação de folhas de coca. Embora tais plantas possam ter consumo inocente, mascadas ou dissolvidas em chá como é tradição na Bolívia, é imediata a sua associação com a produção de cocaína e toda a esteira de crimes e tragédias ligadas à dependência química que a substância provoca.

Absurdo! Diriam, escarnecendo da hipótese. Jamais um banco público, comprometido com o desenvolvimento econômico e social, a geração de empregos, o respeito ao meio ambiente e a valores éticos, poderia financiar o cultivo de substâncias nocivas à saúde, geradoras de graves dependências químicas, com consequências devastadoras para o bem-estar humano e causadoras de mortes e sofrimento nas famílias.

Não é absurdo. O BNDES financia o cultivo de tabaco no Brasil. Entre 2001 e 2010 o desembolso do BNDES com a cadeia do fumo saltou espetacularmente de 8 para 116 milhões de reais.

Ao contrário da coca, o tabaco é 100% utilizado na produção de cigarros. Os números de dependentes do tabagismo e de suas vítimas fatais são dezenas de vezes superiores aos da cocaína. Segundo o Ministério da Saúde dos Estados Unidos, os malefícios do tabagismo à saúde incluem treze tipos de câncer como os de pulmão, fígado e cólon, além de cegueira, tuberculose, diabetes etc. O Instituto Nacional do Câncer informa que 200 mil brasileiros morrem por ano de doenças ligadas ao tabagismo. Mais vítimas por ano que a bomba nuclear de Hiroshima. Em 2014, foram diagnosticados mais 27.330 novos casos de brasileiros com câncer de pulmão. O financiamento do BNDES pode ter contribuído para aquecer o setor e dinamizar o cultivo, a indústria e o comércio de produtos letais.

Mesmo sob o ponto de vista estritamente financeiro, não se justifica o crédito ao plantio de tabaco. O lucro auferido pelo BNDES com essas operações não ultrapassa alguns milhões de reais e é bem inferior ao que poderia ser obtido se os mesmos recursos fossem aplicados em outras cadeias produtivas, ou seja, o custo de oportunidade é alto. Isso, aliás, é uma das razões pelas quais os bancos privados limitam seu crédito ao setor. De outro lado, o custo anual para o Sistema Único de Saúde das doenças provocadas pelo tabaco supera R$ 21 bilhões, assim como são bilionárias as perdas de produtividade em outros setores econômicos derivadas de licenças-saúde e outros efeitos. As únicas indústrias indiretamente beneficiadas por essa política são a farmacêutica e a funerária. Em suma, trata-se de uma insanidade micro e macroeconômica.

Com tantos profissionais competentes que escrevem belíssimos relatórios sobre responsabilidade socioambiental, será que ninguém no BNDES parou para fazer essa conta? Sustento que esse volume de crédito deveria ser fornecido para o produtor que migrar do tabaco para outras culturas, por exemplo, de alimentos orgânicos ou outros produtos saudáveis.

Certamente algum esbirro da mortífera indústria fumageira irá rosnar que os empréstimos concedidos pelo BNDES não são ilegais. Talvez não sejam, segundo o direito positivo. Mas são imorais, ilegítimos, antieconômicos e até inconstitucionais, se considerarmos que a nossa Constituição proclama o direito à vida.
Com financiamento do BNDES a juros módicos, estamos construindo uma ‘Pátria Cancerosa‘? Basta!

Luiz Henrique Lima – auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT – Graduado em Ciências Econômicas, Especialização em Finanças Corporativas, Mestrado e Doutorado em Planejamento Ambiental, Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia.

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