Depois do “grande” seminário e da tentativa de desapropriação do Colonial, a onda agora é o assado de mamuri. Não vi o trabalho acadêmico em que se baseia. Mas deve ter ficado excelente, tamanha a deferência que está recebendo. Espero, sinceramente, que tal trabalho sirva principalmente para conscientizar a população da importância desse animal cordado, gnastomado, aquático, com nadadeiras sustentadas por meio de raios ósseos, pele geralmente coberta de escamas, coração com uma só aurícula, aberturas nasais que não se comunicam com a boca e que respira por brânquias. Muito mais que isso, que sirva para chamar a atenção para a preservação de seu habitat, ameaçado por inescrupulosos empreendedores que vão além do limite legal e racional das margens dos rios.
Gosto muito de peixe. Meu preferido é pacu. Também gosto muito de mamuri assado. Na minha casa, todos gostam de mamuri assado. Meus dois meninos adoram mamuri assado, mas preferem mesmo é filé de tucunaré. Um quilo de mamuri custa cerca de quinze reais. O problema é que mamuri, para ser bom, só se for inteiro. E inteiro custa uma nota! Só mesmo para ocasiões especiais! A grande maioria passa o ano inteiro com arroz, feijão e o velho, tradicional e bom bife. Uns poucos vão além, nas festas de fim de ano, para impressionar as visitas. Esses poucos têm que se garantir antes da piracema. Por isso, as visitas acabam mesmo é comendo mamuri “fresco” de 60, 90 ou até mais dias atrás. Um verdadeiro prato típico, com ingrediente fresco, quer dizer, congelado. Literalmente.
Mamuri bom tem que ser do rio. De represa, não é a mesma coisa. Sei por experiência própria. Em 2001, comprei 500 mamuris com um ano de vida e coloquei numa represa de um cunhado. A idéia era deixá-los crescer para a prática de pesca esportiva e, de vez em quando, para alguns assados. Em seis anos, não chegamos a pegar nem vinte deles. Somos péssimos pescadores. Não somos como os “grandes” pescadores, “profissionais”, que pescam com rede. Só usamos molinete e vara. Grande vantagem para os mamuris, que são muito ariscos. A carne de mamuri de represa não é da mesma cor e nem tem o mesmo sabor da dos mamuris do Teles Pires. A represa em questão fica a cerca de 1.500 metros do rio. Receio que muitos filhotes tenham escapado pela fina tela e ganhado o Teles Pires. Espero que tenha sido assim mesmo. Terei contribuído com muitos deles para o futuro (?) prato típico de Sinop.
Cá entre nós, ainda tenho muitas dúvidas sobre a relevância de tornar o mamuri assado o prato típico de Sinop. É bem verdade que muitos visitantes – ilustres ou não – sempre ouviram falar das delícias do mamuri assado. Mas, em eventos ou solenidades, poucos comeram. Não só pela escassez da iguaria, mas principalmente pelo preço, que é muito “salgado”. Na grande maioria dos eventos o que rola mesmo é o bom, barato e muitas vezes indigesto churrasco de carne de filhos de galinha, da fêmea do touro, da carne deste castrado, da carne de leitão ou de outros bunodontes mais velhos e gordurosos. De entrada, alguns embutidos que, como leis e arranjos políticos, é bom a gente nem saber como são feitos.
Mamuri assado é uma delícia… para os donos de restaurantes. Um deles me disse que se for para escolher um prato típico, deve ser mesmo mamuri assado. Ele também disse que quem mais procura o prato são os visitantes. Disse ainda que é ideal para almoço, não para o jantar. Custa cerca de 60 reais, para quatro pessoas, fora bebidas, sobremesa e outros acessórios gastronômicos. Há quem coma com cerveja (que horror!). Se você quer ser mesmo fino, jamais tome cerveja almoçando mamuri assado. É o que diz a etiqueta. Se você seguir a etiqueta, logo verá que mamuri assado é para poucos. Mesmo sem etiqueta, não é para muitos. Vinho combina com momento especial, com jantar, com algo mais – uma noite de amor, por exemplo. Por isso, na minha casa, por questão de saúde, tomo vinho quase todo dia, mas mamuri assado é só de vez em quando. E na sua?
Leonildo Severo da Silva é advogado em Sinop
[email protected]