A Constituição Federal de 1.988 prevê a possibilidade de inovações em seu texto por meio dos chamados Projetos de Emendas à Constituição conforme o artigo 59 inciso I (ou simplesmente PECs), de modo a evitar o envelhecimento precoce da Carta Mandamental. É uma forma que o poder constituinte originário entendeu ser viável para que exista equilíbrio entre as novas demandas sociais e a rigidez e segurança que se espera do texto constitucional.
O problema é que, em regra, o processo de inovação normativa, aí compreendidas a criação de leis infraconstitucionais e emendas à Constituição, não leva em consideração os desejos daquele que é o "patrão", o verdadeiro dono de todo o poder que emana das leis (e por elas é transmudado), sua Excelência o Povo (parágrafo único do artigo 1º da Constituição).
A prova do largo distanciamento entre o debate congressual e os desejos do eleitor brasileiro é o teor do debate que se instaurou por esses dias na discussão das PECs 37 e 33. A primeira retira o Ministério Público das investigações criminais contra bandido "graúdo" (e pode criar um monopólio investigativo, como dizem) e a sua congênere pretende impor exigências de confirmação parlamentar às decisões exaradas pelo Supremo Tribunal Federal em sua competência de julgador.
Aberrações!
Eu, parte do povo, não fui chamado a discutir. O debate constitucional é ilegítimo!
Uma coisa já foi possível observar, resultou desse nefasto debate: o digladio de forças que sempre tiveram por missão defender o Povo e a Justiça, falo do Ministério Público e da Polícia, que se colocam em posições opostas. Ambas são instituições importantes para preservar a ordem pública, a integridade nacional, os direitos de ir e vir das pessoas e a probidade na gestão pública. Todavia, inadvertidamente, estão se colocando em posições contrárias, para delírio de alguns. É tudo o que os bandidos de colarinho branco sempre desejaram, a divisão e o conflito entre aqueles que têm por missão investigar e processar criminalmente os poderosos, dando vazão ao postulado de que todos (ricos e pobres) são iguais perante a lei. A persistir tal cisão, Polícia de um lado e MP de outro, já se tem o grande perdedor: o Povo Brasileiro, que perde duas instituições de relevante valor.
Outra loucura que vem do Planalto central (especificamente do Congresso Nacional) é esse "desejo de emenda à Constituição" que tem por objeto impor um rito de confirmação das decisões do Supremo Tribunal, que teria que submeter algumas de suas decisões ao Congresso Nacional. É a tal PEC 33, cuja tramitação vem sendo questionada pelo Mandado de Segurança 32.036, apresentado na semana passada (25/04) ao STF, onde foi argumentado sobre suposta violação à cláusulas pétreas (art. 60, CF).
A confusão é tremenda. É como um tiroteio num festa noturna em cidade do interior, quando o candeeiro (lampião) foi apagado com um tiro, e os contendores agora disparam suas armas para todos os lados, buscando inimigos. Ninguém tem razão!
Ora, se o poder emana do povo e o Congresso Nacional tem por missão dar eficácia aos desejos do cidadão, por que este não é chamado a discutir as tais modificações na Constituição Federal? Porque circunscrever o debate ao plenário, sem audiências públicas e se desejar uma votação tão rápida? Parece que desejam esconder alguma coisa do eleitor!
E o clima entre as instituições é tão ruim e tão surreal que o STF também deu sua "derrapada", atendendo a um pedido feito por um senador por meio de um mandado de segurança, suspendendo liminarmente a votação de um projeto de lei que pretendia alterar regras eleitorais.
O Mandado de Segurança número 32.033 apresentado ao STF é contra suposto ato ilegal, abusivo e inconstitucional praticado pela Câmara dos Deputados, e visa impedir a votação do Projeto de Lei 4470/12, que impõe obstáculos à criação de novos partidos políticos.
É evidente que errou o STF ao se imiscuir na votação legítima de uma norma, e é claro que agiu como que praticando uma espécie de "vingança", ou ameaça. A perda de rumo é mais um dos efeitos das tais PECs.
Parem [de discutir] a PEC. Parafraseando o Ministro do STF, Joaquim Barbosa, "a PEC é péssima". Vamos recolocar o povo no centro dos debates, discutir o que de fato importa a ele (Povo Brasileiro), e não somente a meia dúzia de falsos moralistas com reiterados ataques de "complexo de sangue azul".
Antonio Cavalcante Filho e Vilson Nery são ativistas do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção eleitoral)