Peço licença aos leitores pra escrever esta série de quatro artigos que começa hoje e vai terminar na próxima quinta-feira. Na próxima quinta, dia 25, completo 40 anos morando em Mato Grosso. Por isso, esta série de artigos, numa tentativa de resgatar a minha história pessoal que, de certo modo, mistura-se à história de todos nós, a de Cuiabá e a de Mato Grosso. Na lista das pessoas com quem convivi desde aqueles tempos pioneiros a partir de 1976, vejo-me numa fila que lentamente desaparece e entra na História. Antes de todos desaparecermos, tento contar um pouco de estórias da História.
Começo contando como vim parar em Mato Grosso, no dia 25 de agosto de 1976, uma quarta-feira. Cheguei num Corcel 1969 de quatro portas. Vim sozinho. Carmem e os três filhos, André, Fábio e Marcelo ficaram em Brasília por conta da escola. Trabalhava no "Jornal de Brasília", como repórter em política. Por uma desses acasos loucos, acabei sendo sondado pra vir trabalhar no governo estadual. Por razões mal-explicadas, aceitei na hora, mesmo sabendo que não seria fácil. Vim conhecer Cuiabá em julho, acertei tudo e voltei em agosto pra ficar.
O governador da época, José Garcia Neto, enfrentava uma onda de crises na imprensa nacional, numa tentativa de forçar a separação da região Sul do estado. Os pecuaristas do Sul, donos do Banco Financial, custearam uma pesada campanha na mídia nacional pra construir junto à opinião pública estadual, nacional e, principalmente, junto ao governo militar federal, a idéia de que Mato Grosso era ingovernável com aquele imenso território de 1 milhão e 200 mil km2. Numa tentativa de reverter essa imagem, acabei vindo junto com mais alguns jornalistas pra esse fim. Não tinha muita experiência nessa área.
Confesso que muitas vezes tive vontade de arrumar a mala e voltar. Era muito complicado. Jogo pesado o da política naquele momento em que se jogava uma divisão do estado e a separação de um longo espólio políticos das lideranças do Norte e do Sul do estado. Morei numa pensão, um casarão hoje demolido, na esquina das ruas Pedro Celestino com Voluntários da Pátria. Éramos quatro no mesmo quarto. O Palácio Paiaguás era muito longe da cidade de então. O governo do estado tinha uma massa de jovens idealistas conduzindo a gestão. Excelentes planejadores, a maioria vinda da UnB, em Brasília. Havia um quê de idealismo em todos nós. Fui cooptado logo, logo. Voltar me assediava, mas os desafios me desafiavam.
O Norte tinha 38 municípios. A maioria, pequenos. Cuiabá tinha 100 mil habitantes. Várzea Grande 28 mil. A região Norte tinha 598 mil e o estado 1 milhão e 200 mil de habitantes. As duas tinham 14 mil veículos. O assunto continua amanhã.
Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso