De 2006 a 2019 o número de pessoas com obesidade aumentou em mais de 70%, segundo dados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde. Diante desse e outros dados alarmantes sobre a obesidade no Brasil e no mundo, a professora Márcia Queiroz Latorraca, docente e pesquisadora da Faculdade de Nutrição (FANUT) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), propõe a criação de um gel oral fitoterápico feito com o extrato da casca da mangabeira para auxiliar a perda de peso.
A pesquisa foi aprovada no recente edital da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso (FAPEMAT), e segundo a docente um estudo realizado em 2010 por pesquisadores da UFMT já havia identificado a mangabeira entre as dez plantas medicinais encontradas no cerrado mato-grossense. “A planta é recomendada pela população para tratar obesidade e hiperlipidemia, alto nível de lipídios no sangue. O desafio agora é compreender como de fato opera essa espécie na perda de peso e criar um produto científico e fitoterápico no tratamento da obesidade”, diz a pesquisadora.
A mangabeira, que tem o nome científico de Hancornia speciosa, possui em suas folhas, casca e látex propriedades antioxidante e anti-inflamatórias associadas a presença de compostos fenólicos, responsáveis por exercer efeitos preventivos e curativos em distúrbios no organismo. Segundo a docente, os ensaios biológicos realizados com essa espécie mostraram ausência de toxicidade.
“Quando falamos em desafio dessa pesquisa, percebemos que grande parte dos compostos fenólicos presentes na planta, não atingem os locais específicos do nosso organismo para exercer sua ação biológica, porque enzimas presentes no intestino e/ou fígado dificultam a sua utilização como agente terapêutico”, explica a pesquisadora.
Partindo desse cenário, a docente conta que o projeto estabeleceu o objetivo de desenvolver um fitoterápico com o extrato da casca da mangabeira incorporado a um gel oral. A junção desse extrato em um gel é uma tentativa de aumentar a disponibilidade dos compostos fenólicos no organismo para que eles possam atuar de maneira a contribuir na perda de peso”, diz a docente.
Com dados da Vigitel de 2019, que revelam que Cuiabá está entre as cinco das 27 capitais do Brasil com maior índice de obesidade, a professora Márcia Queiroz Latorraca destaca que no Brasil existem cerca de oito medicamentos aprovados para o tratamento da obesidade e que uso do fitoterápico, assim que disponível, deverá ser associado às mudanças no estilo de vida, como a adesão a uma alimentação saudável e redução do sedentarismo.
Junto à docente há também pesquisadores da FANUT, do Instituto de Ciências Exatas e da Terra (ICET) do Câmpus Universitário do Araguaia e da Universidade Federal do ABC- São Paulo (UFABC-SP), um farmacêutico, mestre em Ciências de Materiais da UFMT e um aluno do Mestrado em Nutrição, Alimentos e Metabolismo da FANUT.
O gel poderá ser comercializado após a comprovação do potencial do produto, mediante eficácia, segurança, e com a patente junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
Por se tratar do uso da casca da mangabeira, Márcia Latorraca destaca que a utilização da planta de forma irresponsável pode sim colaborar com a extinção da espécie e para a degradação dos ecossistemas, caso sejam adotadas práticas de extrativismo e superexploração. Argumenta que a equipe de profissionais envolvidos têm a perspectiva de agregar valor a essa planta do Cerrado e de criar uma alternativa de renda à população por meio do extrativismo sustentável contribuindo para a melhoria do perfil socioeconômico da região e para a preservação do bioma.
As atividades do projeto têm início em maio, com coleta das cascas das mangabeiras, que será realizada em locais próximos a cidade de Barra do Garças, a 510 km de Cuiabá. Após, haverá a ratificação taxonômica a ser realizada no Herbário do Câmpus do Araguaia (UFMT), seguida do preparo do extrato e os estudos de toxicidade do produto que serão desenvolvidos no Laboratório de Pesquisas em Química de Produtos Naturais da UFMT Câmpus Universitário do Araguaia. As demais etapas ocorrem na Universidade Federal do ABC- SP e na FANUT.