O Ministério Público Federal (MPF) denunciou um servidor público pelo crime de estelionato, cometido entre 2014 e 2023. Na denúncia apresentada à Justiça Federal, o órgão aponta que o servidor da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), lotado em Primavera do Leste, atuou na falsificação de documentos emitidos pelo órgão para que indígenas obtivessem vantagem ilícita, mediante a solicitação de benefícios previdenciários e empréstimos consignados.
A organização criminosa foi descoberta pela Operação Sangradouro – deflagrada em junho pela Polícia Federal (PF) – que resultou na prisão do servidor e no cumprimento de mandados de busca e apreensão. Segundo consta na denúncia, o esquema envolvia servidores da Funai, indígenas, cartórios e correspondentes bancários de diversas cidades de Mato Grosso. Estima-se que o prejuízo aos cofres públicos causado pela fraude possa chegar a R$ 64 milhões.
A ação ajuizada pelo MPF aponta que o esquema criminoso tinha por objetivo “não só a concessão fraudulenta de aposentadorias por idade aos indígenas, mas também a utilização destes benefícios como meio para a contratação de empréstimos pessoais e consignados, causando prejuízos aos cofres da União e a instituições financeiras contratadas”. Por isso, além da condenação do servidor por prática de estelionato, o órgão pede que seja fixado valor mínimo para a reparação dos danos causados aos cofres públicos.
De acordo com a denúncia, a fraude iniciava-se com a expedição de documentos falsos emitidos por servidores da Funai, incluindo o Registro Administrativo de Nascimento de Índio (Rani) e a Certidão de Exercício da Atividade Rural (Cear). Segundo o MPF, as alterações nos documentos, em especial no quesito da idade dos indígenas, eram realizadas para simular o atendimento da idade mínima para aposentadoria por idade rural: 60 anos para homem e 55 anos para mulher.
Com os documentos falsificados, os indígenas realizavam registros tardios de nascimento nos cartórios, obtendo certidões de nascimento que serviam de base para solicitar outros documentos, como CPF, RG e título eleitoral. Em seguida, requeriam ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) aposentadoria por idade rural e obtinham empréstimos consignados em instituições bancárias. A investigação revelou que os documentos falsificados eram comumente emitidos em intervalos curtos, pouco tempo antes da solicitação do benefício à Previdência Social.
O MPF aponta que, desde 2014, o servidor atuou para que pelo menos cinco indígenas obtivessem vantagem ilícita por meio de solicitação de benefício previdenciário com a indicação de data de nascimento falsa em documentos emitidos pela Funai. A pena prevista no Código Penal para a prática de estelionato pode variar de 1 a 5 anos de prisão além de multa, podendo ser aumentada em um terço se o crime for cometido em detrimento de entidade de direito público.
Deflagrada em 28 de junho, a Operação Sangradouro investiga servidores da Funai e lideranças indígenas envolvidos em fraudes de documentos para conseguir aposentadoria em Primavera do Leste, Campinápolis, Nova Xavantina, Água Boa e Barra do Garças, todos municípios de Mato Grosso.
De acordo com a Polícia Federal, o esquema de falsificação atuava em três grupos: o núcleo da Funai, composto por servidores responsáveis pela expedição irregular de Ranis e certidão de atividade rural; o núcleo cartorário, responsável pela emissão de certidão de nascimentos de indígenas com dados falsos; e o núcleo dos correspondentes bancários, que concedia empréstimos consignados nos nomes fictícios, mediante procurações.