A Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso negou provimento ao recurso interposto por um homem condenado a 10 anos de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do crime de atentado violento ao pudor praticado contra duas crianças, à época com dez e doze anos. Segundo a peça acusatória, durante o ano de 1994 e início de 1995, aproveitando-se de sua profissão de instrutor de futebol, o apelante constrangeu dois meninos à prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal.
No recurso, o apelante buscou sua absolvição sob o fundamento de inexistência de provas suficientes. Ele alegou que as declarações das vítimas não são suficientes para embasar a condenação, além do fato de que o laudo pericial realizado não informou qualquer lesão nas crianças. Alternativamente, requereu a exclusão do concurso material entre os delitos e a aplicação do instituto do crime continuado, previsto no artigo 71 do Código Penal.
Contudo, de acordo com o relator, desembargador Omar Rodrigues de Almeida, as provas carreadas aos autos são suficientes para comprovar a prática delituosa. Uma das vítimas, em depoimento na polícia, confirmado posteriormente em juízo, afirmou que o instrutor manteve relações sexuais com ele por cerca de dois anos. Que o instrutor era pessoa de confiança da família e às vezes sua mãe o deixava com o menino e seus três irmãos menores. O menino disse que sentia dor e pedia para que o instrutor parasse, mas o homem dizia para esperar. O menor também era constrangido a praticar sexo oral. O instrutor, segundo a criança, dizia para não contar para a mãe, pois senão levaria uma surra.
Outra vítima disse que assim que terminou um treino de futebol, o instrutor chamou-lhe para ir até a casa dele para assinar a ficha de inscrição para um campeonato. Quando ele estava no local, o instrutor pegou-lhe pelo pescoço e tirou o short dele e também o próprio short. Ele foi ameaçado caso contasse aquilo para alguém.
“Dessa forma, como se constata da análise das provas carreadas aos autos, a autoria do delito de atentado violento ao pudor encontra-se sobejamente demonstrada através dos depoimentos das vítimas e corroborada pelas demais testemunhas, sem qualquer contradição. Ademais, os crimes contra os costumes são geralmente praticados na clandestinidade, sem a presença de testemunhas, razão pela qual possuem valor probatório os depoimentos das vítimas, máxime se foi harmônico e coerente com as demais declarações constantes dos autos”, destacou o desembargador Omar de Almeida.
De acordo com o magistrado, os Tribunais Pátrios respaldam a palavra segura da vítima, ajustada aos demais elementos existentes nos autos, para manter condenação em caso de crime contra os costumes.
No tocante ao resultado negativo do Auto de Exame de Corpo de Delito, o desembargador disse que o delito de atentado violento ao pudor geralmente não deixa vestígios. “Dessa forma, o depoimento das vítimas, além de fazerem prova da autoria delitiva, também o fazem quanto à existência do crime. Também não assiste razão ao apelante ao requerer a aplicação do instituto do crime continuado (…) Saliente-se que os crimes ocorreram em interstício temporal superior a 30 dias, tornando impossível a caracterização da continuidade delitiva, nos termos do artigo 71 do Código Penal”, finalizou.
A decisão foi em conformidade com o parecer ministerial. Também participaram do julgamento o juiz Carlos Roberto Pinheiro (revisor) e o desembargador Paulo da Cunha (vogal).