O mero atraso no pagamento de prestação do prêmio do seguro não importa em desfazimento automático do contrato. Para que o contrato seja desfeito, exige-se prévia constituição em mora do contratante pela seguradora, mediante interpelação, ou ajuizamento de ação judicial competente. Com essa compreensão, a Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve decisão de Primeiro Grau que condenou a Itaú Seguros S.A. a pagar ao segurado valor referente à cobertura de contrato de seguro de automóvel no total de R$23.612,00. A decisão foi unânime (Recurso de Apelação Cível nº 94241/2007).
De acordo com os autos, as partes (segurado e seguradora) firmaram contrato de seguro de apólice, mediante pagamento do prêmio, dividido em 12 parcelas fixas. No recurso, a apelante aduziu que a quarta parcela não foi paga por falta de saldo na conta corrente do apelado e que a quinta parcela foi debitada em 22 de julho de 2003, um dia após o vencimento. O sinistro ocorreu em 23 de julho de 2003 e houve perda total do veículo.
Nas argumentações recursais, a seguradora sustentou que negou o pagamento da indenização porque na data do acidente não havia mais relação contratual entre ela e o apelado, pois teria havido a redução da vigência da apólice por falta de pagamento da quarta parcela.
O relator do recurso, desembargador Mariano Alonso Ribeiro Travassos, afirmou que o fato de o requerido deixar de pagar a quarta parcela e posteriormente pagar a quinta parcela não enseja a suspensão das garantias do seguro, pois se o contrato foi extinto com a inadimplência da quarta parcela, o apelante não deveria ter feito o débito referente a quinta prestação.
Em seu voto, o magistrado ponderou que, de acordo com o conjunto probatório, apesar de o segurado não ter saldo em conta corrente suficiente para o pagamento da prestação no dia do vencimento, exatamente sete dias depois passou a disponibilizar de quantia suficiente para o pagamento da quarta prestação. Para o relator, o apelante ficou inerte na cobrança que lhe cabia, conforme pactuado e autorizado.
No entendimento do desembargador Mariano Travassos, o contrato de seguro só pode ser cancelado após a devida notificação do contratante de seu inadimplemento, para que tenha a oportunidade de satisfazer o débito com as correções devidas e dar continuidade ao contrato. O fato de o segurado estar em atraso com as parcelas do referido prêmio não exime a seguradora do pagamento da indenização a que se obrigara por ocasião do contrato de seguro, sendo nulas de pleno direito as cláusulas abusivas que coloquem o consumidor em desvantagem, conforme dispõe os incisos IV e XI do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor.
Esses artigos versam que são nulas de pleno direito, entre outras, cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade. Também é nula a cláusula que autoriza o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor.
Também participaram da votação o desembargador Juracy Persiani (1º vogal) e o juiz substituto de Segundo Grau Marcelo Souza de Barros (2º vogal).