Em meio aos mais de 60 mil veículos que trafegam diariamente pela BR-163/364, em Mato Grosso, um homem carregando uma cruz com cinco metros de comprimento chama a atenção por onde passa. Nos últimos dias, a principal rota de escoamento da safra mato-grossense virou a via crucis do pernambucano Paulo Cícero de Lima, 56 anos, que veio de Itapevi (SP) e pretende chegar aos Estados Unidos.
Paulo tem como companhia a cruz, uma sacola e a esperança de que conseguirá limpar o nome. Ele cumpriu 16 anos de prisão por latrocínio – roubo seguido de morte – mas alega ter sido vítima de uma falsa acusação. “Se eu não conseguir justiça no Brasil, vou conseguir nos Estados Unidos, onde tem órgãos competentes para isso. Eu não quero meu nome manchado, não posso aceitar isso”.
O viajante relata que começou a peregrinação após ter sonhos recorrentes carregando uma cruz na frente e sendo seguido por várias pessoas. “Achei que estava louco, mas entendi o que o sonho queria me dizer. Era o início da minha luta por Justiça. Aquelas pessoas que me seguiam em sonho, são todas essas que hoje querem saber a minha história. E acredito que vou conseguir Justiça”.
Natural de Canhotinho, interior do Pernambuco, pai de quatro filhos e avô de dez netos, Paulo está livre há cerca de dez anos. Esta é a segunda viagem do romeiro. Na primeira, Paulo partiu de São Paulo e foi até Trindade, em Goiás. O percurso, segundo ele, durou um mês.
A segunda caminhada teve início em 16 de agosto de 2016. Desde que chegou em Mato Grosso pela BR-163, em 1º de fevereiro deste ano, sua viagem tem sido monitorada pelas equipes da Rota do Oeste.
A primeira vez que foi visto na rodovia estava ferido, mas não quis atendimento. Ele ainda manca. Conta que quebrou o pé, mas não se recorda bem o que aconteceu. “Eu estava muito concentrado na viagem e só queria andar, andar, andar. Só me recordo que quebrei o pé em Brasília”.
O diretor de Operações, Fernando Milléo, destaca que a “aventura” de Paulo não é recomendada por motivos de segurança, mas entende que trata-se de uma questão pessoal. “A rodovia é ambiente para veículos, muitas vezes pesados, o que faz com que os riscos sejam elevados. A prática não é recomendada, portanto. Ainda assim, cumprimos nosso papel de resguardar a segurança de quem passa pela BR-163 e monitoramos a caminhada de Paulo, realizando sinalização para resguardar a sua saúde e a de quem passa pela via. Esperamos que sua passagem pelo Mato Grosso seja tranquila”.
Sem nenhum dinheiro para custear a viagem, o ‘romeiro’ conta com ajudas pontuais por onde passa. Ele relata que não tem como se sentir sozinho com tanta gente querendo a sua atenção. Um oferece água, o outro dá a refeição, alguns querem tirar fotos. “Fui ganhando muitos amigos por onde passo e já sinto saudade de todos eles”.
Na BR-364, já no perímetro urbano de Cuiabá, o proprietário de um restaurante, José Edson Nogueira, 53 anos, fez questão de servir o almoço de Paulo. Para não atrapalhar a viagem, arrumou tudo em uma marmita e o entregou para que se alimentasse na hora quisesse. Garrafas de água também surgem de várias mãos por onde passa.
“Viajando pela rodovia já presenciei muita gente pagando promessa e sempre quis ajudar, mas nunca foi possível parar. Já recebi muitas graças na vida e hoje estou tendo a chance de retribuir ajudando ele”, relata o comerciante.