Este calor intenso que está fazendo em Cuiabá é histórico na linha climatológica da cidade e a elevação da temperatura, acima de 40ºC, chegando ao recorde oficial de 42,3ºC em setembro de 2010, sempre ocorreu nos meses de agosto, setembro (que é o mais quente e seco do ano) e outubro. A informação é do geógrafo José Carlos Ugeda Junior, doutor em climatologia, professor e pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
A população da capital, nesta época, sofre não só com o calor, mas com a sensação térmica e a baixa umidade do ar, que gira em torno de 12% a 20%. Para o doutor Ugeda Junior, o problema maior é que, mesmo tendo conhecimento de que o fenômeno ocorra anualmente, gestores nunca implantaram uma política pública consistente de bem-estar social contra o flagelo do clima local, seja em nível estadual ou municipal. Pelo contrário, diz ele, a cidade cresceu desgovernada, sem planejamento ocupacional, o que gera bolsões de alta densidade populacional – muitas casas, prédios e asfalto. “Outro fator que piora o quadro climático é o desmate urbano”, ressalta o pesquisador. Esse conjunto de fatores eleva a temperatura de 6ºC a 8ºC na área urbana em Cuiabá. Não tem como a população não sofrer os impactos de tudo isso.
“Eu nunca vi nada de efetivo ser feito para que as pessoas tenham uma relação mais confortável com o clima, a exemplo do que ocorre em países desenvolvidos e de clima frio, onde neva, por exemplo”, destaca o professor. “Plantio de árvores deveria ser prioridade na rotina na cidade e não o desmate, porque sombra é conforto térmico, mas a realidade é outra”, critica.
Para ele, locais de climas extremos devem lidar com isso como um problema social. A Prefeitura de Cuiabá foi muito criticada pela população quando decidiu derrubar árvores antigas, que estariam atrapalhando a reforma da praça Alencastro no Centro da capital, em março deste ano. O assunto já vinha polemizando porque, para garantir o traçado do modal Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), 848 árvores foram cortadas e 239 retiradas e replantadas em outros locais. Agora, a promessa da Prefeitura é de plantar 300 mil árvores, dentro de uma parceria assinada em julho entre o prefeito Emanuel Pinheiro (PMDB), o Tribunal de Justiça e o Juizado Volante Ambiental de Cuiabá (Juvam). A ideia, após o desmate em série, seria reflorestar Cuiabá, que já teve o título de “Cidade Verde”, para o aniversário de 300 anos. O objetivo, resgatar o título perdido.
O doutor em climatologia lembra que as árvores são importantes porque a climatização interna deveria ser última instância. Ele ressalta que no sistema de transporte coletivo não tem ar condicionado, conforme regra contratual, os pontos de parada não têm cobertura e os passageiros enfrentam o sol sem qualquer proteção. Ressalta que a construção civil abandonou técnica antiga de erguer paredes largas e os empreendimentos atuais são feitos com tijolos de 8 furos, péssimos condutores térmicos. “O calor fica no interior dos imóveis. Já as casas cuiabanas antigas são frescas, porque o adobe não permite o calor entrar”, compara.
Ressalta ainda que muitas das escolas também não estão climatizadas e que as antigas também são mais frescas, porque foram erguidas paredes largas. A Secretaria de Estado de Educação (Seduc) informa que anualmente orienta a gestão das unidades para os riscos do período de baixa umidade relativa do ar em Mato Grosso. “Aumentar a ingestão de líquidos, umidificar os ambientes, evitar aglomerações em locais pouco ventilados e até mesmo a oferta de suco na merenda de algumas escolas são algumas das orientações da Seduc, além de evitar as atividades físicas em horários de intenso calor”, diz trecho da notificação. Informa ainda que está promovendo, por meio do programa de climatização, dentro do Pró-Escolas, a entrega de 2 mil aparelhos de ar-condicionado às escolas estaduais.
As entregas já começaram – e o objetivo é zerar a demanda até o final de 2018. Uma das escolas atendidas é a Escola Estadual José Mesquita, no bairro do Porto, em Cuiabá. A unidade já tem um aparelho por sala de aula, mas a diretora, Creuza Barros, afirma que não dão conta. “Nesta época, o calor é muito forte, os alunos sentem mal estar e os professores também. A saída é ir para a quadra de esportes ou ficar embaixo das árvores, porque ninguém consegue produzir com calor”, comenta a diretora. A unidade recebeu mais 24 aparelhos que devem ser instalados já esta semana. A Seduc garante que não há previsão de suspensão das aulas por conta do clima e que não há registros de que isso tenha ocorrido nos últimos anos.
Nutricionistas ressaltam que é sempre bom comer menos, porque o calor dificulta a digestão dos alimentos. Já médicos chamam atenção para os problemas respiratórios, que a seca causa, e dermatológicos, com o câncer de pele. O uso de protetor solar é um “mantra” nos consultórios de dermatologia. Além de notificar escolas, o Governo do Estado através da Defesa Civil acompanha municípios impactados pela seca e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) atua no combate a incêndios.