O Estado de Mato Grosso deverá construir, em um prazo de nove meses, uma colônia penal agrícola, industrial ou similar para o adequado cumprimento das penas em regime semi-aberto, bem como uma casa de albergado para os que cumprem penas em regime aberto no município de Cáceres (225 km a oeste de Cuiabá). A determinação é da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso que entendeu ser responsabilidade do Estado promover não apenas a segurança pública, mas também a dignidade das pessoas encarceradas mediante a aplicação do regime prisional legalmente a elas instituído. Com essa decisão foi mantida a sentença de Primeiro Grau, que apenas majorou o tempo para as construções de 180 dias para nove meses a contar do trigésimo dia da decisão. A multa para descumprimento é de R$ 5 mil ao dia.
O Estado impetrou com o Agravo de Instrumento nº 55386/2008 pugnando a reforma da decisão sob o fundamento de que é juridicamente impossível a determinação de tutela específica com prazo determinado contra o agravante por infringir o interesse público, consubstanciado na imprescindível realização de licitação para as obras. Além disso, sustentou a impossibilidade jurídica de execução específica da obrigação de fazer, sob o argumento de que o Judiciário, perante o sistema constitucional vigente, não pode praticar atos administrativos na esfera do Executivo, pois estaria invadindo a área privativa de outro Poder.
Nas contra-razões, o Ministério Público, autor da ação civil pública, informou que há mais de 24 anos, desde a promulgação da Lei de Execução Penal, o Estado tem se mantido inerte no dever de adotar medidas concretas para adequação de seu sistema penitenciário. Conforme denúncia, centenas de condenados ao regime semi-aberto e ao regime aberto na comarca, que apenas deveriam dormir na cadeia, por causa da superlotação, assinam um livro de presença e são liberados para cumprirem a pena em regime domiciliar. Ou seja, assumem o compromisso de ficar em casa, na impossibilidade de pernoitarem no presídio.
Para o relator do recurso, desembargador José Tadeu Cury, restou evidente a verossimilhança das alegações do autor da ação penal com o conjunto probatório apresentado nos autos, ficando evidenciado o fumus boni iuris (fumaça do bom direito) e o periculum in mora (perigo na demora). A demora na decisão, conforme o magistrado, poderia trazer problemas ainda maiores ao sistema carcerário, à segurança pública e à dignidade humana dos condenados em caso de submissão dos mesmos a regime mais severo ao qual não foram condenados.
O relator ressaltou que teria havido omissões do Estado diante dos artigos 91, 93 e 117 da Lei de Execuções Penais que versam sobre a destinação da colônia agrícola ou industrial e a casa do albergado para o cumprimento de pena e o recolhimento em casa do apenado e o regime domiciliar. E o artigo 144 da Constituição Federal, que versa que a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.
Na avaliação do relator, conceder o agravo requerido pelo Estado importaria em outorgar ao Poder Público o direito de se omitir quanto ao cumprimento do seu dever legal de aparelhamento prisional e asseguração da segurança pública da população. Sobre as alegações de que o Judiciário estaria invadindo área de outro Poder, o relator ponderou que não se outorga ao administrador estadual qualquer poder discricionário quanto à construção, ou não, dos estabelecimentos à que faz previsão a Lei de Execuções Penais para o cumprimento das penas sob regime aberto e semi-aberto.
A unanimidade da decisão foi conferida pelo desembargador Jurandir Florêncio de Castilho (1º vogal) e o juiz substituto de Segundo Grau Marcelo Souza de Barros (2º vogal).