Amanhã (24) completam-se dois anos da morte do soldado da Força Nacional de Segurança da PM de Alagoas, Abinoão Soares de Oliveira, 34 anos, durante curso em Cuiabá. De lá para cá, pouco ou nada mudou, alertam entidades de defesa dos direitos humanos. Mensalmente, novas denúncias de agressões e humilhações são feitas por familiares de policiais.
Para o Ministério Público de Mato Grosso (MP), 29 pessoas tiveram participação direta ou indireta na morte do soldado, um dos mais perseguidos pelos instrutores durante os 4 dias de treinamento. Além da morte por tortura de Abinoão, a promotoria defende punições pelos outros 4 casos, registrados no mesmo treinamento, de policiais que precisaram de atendimento médico. Dos acusados, 17 respondem a processo de tortura seguida de morte e 12 de tortura.
O processo tramita na Vara Especializada de Combate ao Crime Organizado. De acordo com a promotora Ana Cristina Bardusco, autora da denúncia, a demora no andamento do processo é explicada pelo alto número de acusados. Dos 29, 28 já foram citados e a expectativa para os próximos dias é o julgamento de pedidos, feitos pelas defesas dos policiais, que entendem não ser esta a Vara adequada para julgar o caso. “Esperamos que o processo seja mantido na Vara Especializada e que seja designada audiência de instrução e julgamento o mais rápido possível”.
Em trecho da denúncia, o MP destaca que dos 30 alunos, 19 relataram terem sido vítimas de abusos por parte dos instrutores. O objetivo era forçá-los a desistir. Os alvos da perseguição eram mulheres e soldados de outros estados, apelidados pelos instrutores de “estrangeiros”.
O aluno morreu durante exercício na água, vítima de afogamento criminoso, segundo o MP. “Abinoão era agarrado e afundado. Os instrutores prendiam-no debaixo d”água, sobrepunham os pés em suas costas e ombros, impedindo-o de emergir. Quando erguia a cabeça para fora d”água, em atitude de patente desespero e pânico para conseguir respirar, os instrutores jogavam água em sua face, inviabilizando a recuperação até nova imersão”.
Segundo policiais que participaram do treinamento, Abinoão saiu da água desacordado e logo lhe fizeram massagem cardíaca. Mesmo socorrido, não resistiu aos ferimentos e acabou morrendo.
Outro processo aberto junto ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) tramita atualmente na 12a Vara Criminal de Cuiabá. Com 7 indiciados, o procedimento deverá ser encaminhado para a Central de Inquéritos do MP, que decidirá se junta as provas obtidas nesta denúncia ao processo que tramita na Vara Especializada.
Em março deste ano, a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB/MT) denunciou práticas semelhantes em treinamento aplicado em Várzea Grande. Em um dos testes, os soldados do curso de formação da Força Tática da Polícia Militar foram forçados a mastigar um pedaço de carne, passar para o próximo colega e o último da fila era forçado a comer o alimento.
Um dia depois das denúncias, encaminhadas para o comandante geral da PM, Osmar Lino Farias, pela presidente da comissão, Betsey Miranda, o Comando Regional II, responsável pelo treinamento, suspendeu o curso e instaurou uma sindicância para apurar os eventuais excessos cometidos. “A denúncia foi feita para nós por pais destes soldados, que estavam com medo de ver seus filhos se transformarem em seres ferozes”.
Outro lado
Procurada, a PM, por meio da assessoria, informa que não comenta o caso do soldado Abinoão Soares de Oliveira nem os métodos empregados nos treinamentos da corporação.