O adolescente infrator de 17 anos que liderou uma “rebelião”, na segunda-feira à noite, no Centro Socioeducativo de Cuiabá, no Complexo do Pomeri, ameaçando matar um colega de cela com um chuço caso não recebesse cigarros, confessou que foi tudo uma armação. A juíza Gleide Bispo Santos, da 1ª Vara Especializada da Infância e Juventude da Capital, acreditou que fosse verdade e autorizou a entrada de um maço de cigarros. A decisão gerou polêmica pois a prática é proibida, inclusive pelo Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). Em entrevista exclusiva ao repórter José Porto, do programa Cadeia Neles, o infrator disse que não iria matar o “refém” e que o motim foi simulado somente para “reivindicar seus direitos de saúde e de lazer”.
“Armamos uma situação, sim senhor”, relata ele ao repórter quando questionado sobre a ocorrência que resultou no acionamento do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e da juíza Gleide Bispo. O presidente do Sindicato dos Agentes do Sistema Socioeducativo de Mato Grosso (Sindpss), Paulo César de Souza, já tinha afirmado ao Gazeta Digital que o motim foi armado e que após conseguirem o cigarro ficaram tripudiando dos servidores, da juíza e dos policiais, o que fez o major do Bope ficar irritado e retirar a tropa dizendo "que aquilo tudo era um palhaçada”.
O menor disse que ele e os demais internos não estão tendo lazer dentro do Pomeri porque as promessas não são cumpridas. Cita como exemplo a exigência de quadra de esportes, piscina, salas de aula e até aulas de música. Ele garante que os responsáveis pela unidade já prometeram por várias vezes que iriam atender todas essas exigências, mas não cumpriram.
“Tem estrutura, o negócio é se organizar melhor lá e fazer tudo que tá prometendo que vai fazer. Porque toda semana vai o diretor, vai o gerente, vai a juíza e fala um monte de coisa pra gente, um monte de promessa e 99,9% das promessas não são cumpridas”, desabafa indignado. Em seguida, diz acreditar que as promessas não são cumpridas porque os responsáveis não vão atrás. “É por isso que a gente revolta”, justifica ele afirmando que já cumpriu sua pena de 3 meses de internação e os relatórios já foram elaborados. Mas acredita que poderá ficar no local por mais 6 meses pelo fato de ter feito o “guri de refém”.
Ele aproveita a entrevista e manda um recado à juíza e à Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), pasta responsável pela administração do sistema prisional de Mato Grosso, incluindo o socieducativo. “Se não melhorar vai continuar a ter problemas, bagunça, vai continuar a ter briga e conflito”, adianta. Segundo ele, vai ficar pior para todo mundo. “É isso que eu falo, se é pra ficar pior, então vamos ficar pior, vamos regaçar com tudo logo”, sugere.
Sobre a exigência do cigarro, o repórter questiona o fato de os internos serem menores de idade e, portanto, proibidos pela lei de terem acesso a substâncias e drogas mesmo lícitas como o cigarro e álcool, por exemplo. “Agora fala pra mim, é mais forte tirar a vida de uma pessoa ou você conceder um cigarro”, rebate o adolescente sobre o episódio em que a juíza cedeu à pressão e autorizou a entrega do produto. “Era a cadeia inteira que tava revoltada, não mataria ele, mas chegaria no ponto de que machucaria o menino, a cadeia ia estourar e ia ficar pior, porque lá tem menino muito pior do que eu”, justifica ele.
Ao final da entrevista, o adolescente emite sua opinião sobre o sistema socioeducativo de Mato Grosso. “Tem adolescente que chega ali por roubo ou furto de celular, nunca pegou numa arma, tá entendendo? E sai de lá com mente de matar, de sequestrar, de fazer coisas muito pior porque aprende”, diz. Questionado sobre como vai sair de lá, e responde: “honestamente, vou sair de lá tentando fazer as coisas melhor, porque não quero voltar pra lá. Já não é a primeira vez que eu passo por lá”, destaca informando que é a terceira vez que passa pelo Pomeri, devido a prática de crimes que são classificados como “atos infracionais”. Finaliza dizendo que vai sair tranquilo porque no dia 13 de maio próximo ele completa 18 anos.
A entrevista foi gravada dentro do Centro Integrado de Segurança e Cidadania (Cisc), local onde o menor foi conduzido para confeccionar um boletim de ocorrência devido outra confusão que ele se envolveu no Pomeri, depois da falsa rebelião. A Sejudh disse que não vai se manifestar sobre o episódio e também não protocolou qualquer representação na Corregedoria do Tribunal de Justiça para investigar a conduta da juíza. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso também disse que a magistrada prefere não se pronunciar sobre o ocorrido.