O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em Cuiabá, tem negado o auxílio doença para pessoas que possuem transtornos mentais. Recorrer à Justiça praticamente não está adiantando também. A esfera Federal mantém o posicionamento negativo quanto ao reconhecimento de doenças, como a depressão, como causa para o afastamento das atividades trabalhistas. Existe um apelo para que um maior reconhecimento, por parte do poder público, se faz necessário em Mato Grosso para contribuir na luta contra esses transtornos que acabam, por muitas vezes, tendo um final trágico.
A depressão, segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), atinge mais de 11 milhões de pessoas no Brasil. É a principal causa de incapacidade em todo o mundo e contribui para a carga global de doenças e pode levar ao suicídio. O advogado previdenciário Isandir Rezende comenta que existem muitos casos de negativas de concessão do auxílio doença na capital. Reclamações também têm sido levadas ao Sindicato Estadual dos Aposentados, Pensionistas e Idosos de Mato Grosso (Sindap/MT). Primeiramente, o instituto indefere o pedido do contribuinte ou retira o pagamento que era feito. Diante da situação, a pessoa busca a via judicial para tentar o restabelecimento. Todavia, o entendimento continua o mesmo.
Foi o que aconteceu com um senhor de 54 anos. O homem conseguiu o benefício previdenciário de auxílio-doença comum em julho de 2016. Contudo, em outubro de 2017, o benefício foi interrompido pelo INSS. Em fevereiro deste ano, o contribuinte tentou o restabelecimento mais uma vez. Ressaltou sobre a incapacidade de trabalhar e as necessidades que o fizeram depender, inclusive, da ajuda de terceiros, para o sustento próprio e de sua família. Após os trâmites e nova perícia, mesmo com laudo médico atualíssimo apontando para os sintomas depressivos e ansiosos, o auxílio foi negado pelo instituto. Nove dias depois, W.M.M. tirou a própria vida. “Hoje o grande problema é que o cidadão que busca o benefício não tem dinheiro para pagar um médico perito auxiliar para acompanhar a averiguação que será feita pelo profissional designado pela Justiça. A pessoa está financeiramente comprometida”, pontua Rezende.
Ele destaca que se isso acontecesse, talvez os médicos emitissem laudos diferentes e diante dos 2 posicionamentos caberia ao juiz, ainda assim, o deferimento ou não. O advogado faz ainda outro apontamento quanto aos laudos e as suas análises, uma vez que o parecer emitido pelo médico da Justiça Federal tem tido mais peso, a comparar com aqueles juntados aos processos que foram emitidos por profissionais que já acompanham o contribuinte anteriormente.
“Infelizmente, quando se trata de transtorno mental não tem sintoma físico”, reforça Érica Braga que lembra de outros 2 casos também de pessoas depressivas que tiveram os pedidos indeferidos. Para a advogada previdenciária, no entanto, a depressão está começando a ser vista com outros olhos, mas ainda existem outros transtornos que também precisam de uma nova observação, como a bipolaridade e a esquizofrenia. Analice* (nome fictício) sabe muito bem o que é isso. Ela também teve o benefício suspenso e desde então espera receber novamente o auxíliodoença. “Aguardo a nova perícia, tenho todos os laudos. Da última vez, apontaram que eu tenho capacidade de trabalhar, mesmo estando dopada”, diz indignada a mulher de 40 anos, que tem esquizofrenia e faz tratamento com remédios fortes.
Se por um lado, em Mato Grosso, muitas decisões têm sido negativas, por outro, no TRF4, na região sul do país, o entendimento tem sido outro. O desembargador Paulo Afonso Brum Vaz explana que as Varas Especializadas na área previdenciária têm vários avanços. “A maioria dos processos que temos é de pedidos de aposentadoria por invalidez”, frisa. No tribunal em Santa Catarina, as decisões judiciais estão levando em conta os antecedentes médicos dos contribuintes, ao contrário do que acontece em Mato Grosso. “A perícia pontual não consegue examinar uma incapacidade assim, tem que considerar o corpo e a mente. O que vemos hoje é que o médico perito não considera o mercado laboral ou a atividade que a pessoa desenvolve”, explica sobre o processo. Desta forma, o juiz não fica atrelado ao laudo pericial para conceder ou não o benefício e as têm favorecido quem precisa.
O problema, segundo o magistrado, começa na perícia administrativa do instituto, a qual ele adjetiva como tendenciosa. “O INSS parece não conseguir conceder, quanto aos pedidos por incapacidade, os benefícios são irrisórios”, avalia. Logo depois, na perícia judicial, a problemática é reforçada. Vaz analisa que a depressão precisa de um olhar do poder público para auxiliar no seu combate, tratamento e cura, bem como os outros transtornos mentais. “É uma doença silenciosa, não se sabe onde está doendo, temos índices elevadíssimos de suicídio”, destaca.
Em mês de prevenção ao suicídio, o Centro de Valorização à Vida (CVV) orienta que as pessoas busquem ajuda para lidar com o problema que enfrentam, que é importante que elas saibam que têm com quem conversar nesses momentos de crise, que têm capacidade para resolver esses problemas e são fortes para vencê-lo. É preciso cuidar da saúde mental para tanto. “Vivenciando um momento difícil, podemos desencadear uma doença mental”, comenta Isaura Titon, voluntária do centro.