A máscara caiu. Diante de milhares torcedores fantasiados de Neymar, a Seleção Brasileira não transformou em realidade a ilusão de que poderia ser bem-sucedida sem o seu principal jogador. Foi humilhada pela Alemanha com uma histórica derrota por 7 a 1 no final da tarde desta terça-feira, no mesmo Mineirão onde já havia sofrido para superar o Chile nos pênaltis, e está fora da disputa pelo título da sua Copa do Mundo. Os gols foram marcados por Muller, Klose (o maior artilheiro dos Mundiais), Kroos (2), Khedira e Schurrle (2). Oscar fez o de honra.
Se queria apagar a derrota para o Uruguai na final da primeira Copa do Mundo realizada no Brasil, há 64 anos, o Brasil conseguiu de forma vexatória. Perdia por 4 a 0 em 25 minutos de jogo. Em um Mineirão que virou Mineirazo, viu os seus torcedores reagirem com um choro que a psicóloga Regina Brandão nem o melhor de seus colegas seriam capazes de conter. A revolta nas arquibancadas também foi extravasada com irônicos gritos de “olé”, vaias (principalmente para o centroavante Fred), insultos e brigas.
A traumática queda diante da Alemanha foi o desfecho de um sonho que o Brasil alimentou muito graças a Neymar, alvo de uma joelhada de Zúñiga na vitória por 2 a 1 sobre a Colômbia, nas quartas de final, quando fez a sua exibição mais apagada no Mundial. Antes, o atacante havia sido importante nas vitórias por 3 a 1 contra a Croácia e por 4 a 1 em cima de Camarões, no empate sem gols com o México e na disputa de pênaltis com os chilenos.
Com a derrota na decisão da Copa do Mundo de 2002 muito bem vingada, a Alemanha agora se prepara para jogar a decisão do Maracanã às 16 horas (de Brasília) de domingo, contra o vencedor do confronto entre Holanda e Argentina. Ao Brasil, restará a disputa de terceiro lugar diante do perdedor da outra semifinal, às 17 horas (de Brasília) de sábado, no Mané Garrincha. Outra vez, sem Neymar.
O jogo – A Alemanha já estava à frente da Seleção Brasileira antes mesmo de a bola começar a rolar. Os comandados de Joachim Low entraram em campo com passadas largas, enquanto os de Felipão caminharam timidamente, com as mãos sobre os ombros uns dos outros – faltavam, entretanto, aquelas costas que suportaram o peso de toda a campanha até as semifinais e acabaram fora do torneio graças à joelhada do colombiano Zúñiga.
Neymar estava representado por uma camisa com o número 10 às costas, levada ao gramado pelo capitão David Luiz – que herdou a braçadeira do suspenso Thiago Silva. Na hora da execução do Hino Nacional, o seu traje tremulou junto com as vozes da torcida brasileira. Entre elas, estava a de Bernard, o escolhido de Felipão para reanimar a Seleção com a sua “alegria nas pernas”, como gosta de dizer o treinador.
A animação durou poucos minutos, com a pressão inicial imposta pela Seleção Brasileira. O lateral esquerdo Marcelo foi o primeiro a incomodar com um chute de fora da área. Oscar se incumbiu de cobrar os escanteios antes batidos por Neymar. E Hulk continuou a mostrar apenas vontade, assim como Bernard, enquanto Fred se manteve nulo em campo.
Apesar de ter seguido com os seus problemas habituais e não mais com Neymar, o Brasil até pareceu assustar inicialmente a Alemanha. Ozil escorregou e levou o público local ao delírio. Seu time respeitava o ímpeto brasileiro e demorou um pouco para sair ao ataque. Quando o fez, encontrou uma defesa adversária bastante desorganizada com a entrada de Dante e acabou com o jogo.
O primeiro gol alemão saiu aos dez minutos. Em uma cobrança de escanteio de Kroos, Muller apareceu inacreditavelmente livre de marcação dentro da área. Só teve o trabalho de escorar a bola, com uma finalização cruzada, para inaugurar o placar.
O gol foi a senha para a Seleção Brasileira se desesperar de vez. Sem nenhuma criatividade, o time apelou aos lançamentos longos de David Luiz, como já havia ocorrido em outras partidas da Copa do Mundo. Também implorava por pênaltis, como aos 17 minutos, quando Marcelo caiu na área ao perder a bola para Lahm e provocou uma discussão entre Hulk e Boateng. A torcida pareceu prever o inacreditável e passou a berrar logo cedo: “Eu acredito!”.
Jogando de rubro-negro como o Flamengo, a Alemanha tinha muito mais confiança. E não era para menos. Afinal, contava com total liberdade para trocar passes à brasileira. Foi assim que transformou a vitória parcial em goleada em menos de cinco minutos. A começar por uma bela jogada de Kross, que encontrou Muller dentro da área. A bola ficou com Klose, que parou em Júlio César no primeiro chute e mostrou o oportunismo do maior artilheiro da história das Copas para ficar com o rebote e conferir, aos 22.
Àquela altura, alguns torcedores já começavam a chorar, como fizeram os jogadores de Felipão contra o Chile. O trauma emocional seria ainda maior. Já aos 23 minutos, Lahm fez um cruzamento rasteiro para a área do Brasil, onde Muller não conseguiu concluir. Kross, sim. Júlio César ainda tocou na bola, que entrou no canto.
O marcador dilatado fez o Brasil ficar tonto em campo. A ponto de Fernandinho perder perigosamente uma bola para Kross a dois passos da meia-lua. O alemão tirou proveito e tabelou com Khedira antes de concluir na saída de Júlio César. O massacre dos times visitantes, cada vez mais em casa, estava configurado. Com apenas 25 minutos de partida.
Se os atletas do Brasil não sabiam como reagir, os torcedores muito menos. Alguns choravam copiosamente, borrando as pinturas verde e amarela em seus rostos. Outros preferiram deixar o Mineirão mais cedo. E os mais revoltados desabafaram com coros de “raça”, insultos para o ar, brigas entre si e ameaças de violência generalizada. A tensão era tamanha que os seguranças da Fifa fizeram um cordão de isolamento onde estava concentrada a maior parte da torcida da Alemanha.
Ficaria pior. Ou melhor, no caso do público alemão posicionado atrás do gol defendido por Neuer. Aos 29 minutos, Khedira avançou sem marcação pelo meio, tocou para Ozil (em posição duvidosa), recebeu de volta e concluiu no canto direito de Júlio César para também participar da festa germânica no Mineirão.
A ilusão de conquistar a Copa do Mundo em casa, 64 anos após a tragédia de 1950, acabava ali para o Brasil. Parte do público já sabia, com um conformado canto para dizer ser “com muito orgulho, com muito amor”. Jogadores como Hulk ainda se esforçavam, enquanto a Alemanha diminuía o ritmo, mas tropeçavam nas próprias pernas. Felipão até se sentou. Só saiu da sua área técnica de novo no último minuto do primeiro tempo.
Tentando evitar um vexame ainda maior, o técnico recorreu às entradas de Paulinho e Ramires nas vagas de Fernandinho e Hulk. Só adiantou nos primeiros minutos do segundo tempo porque a Alemanha havia se acomodado. Joachim Low, por exemplo, até poupou Hummels e mandou Mertesacker ao gramado naquele instante.
Nas investidas brasileiras, a Alemanha provou não ter bons jogadores só no setor ofensivo. O goleiro Neuer trabalhou bem e conteve algumas investidas de Paulinho e Oscar. Para parar Fred, no entanto, não era preciso fazer muito. O centroavante foi perseguido mais pela torcida amarela do que pela marcação rubro-negra. Passou a ser vaiado a cada toque na bola.
Do outro lado, até o público brasileiro reverenciou o goleador alemão. Aos 12, Klose deu lugar a Schurrle e saiu com aplausos dignos do maior artilheiro das Copas. Seu substituto o homenageou com um gol. O jogador do Chelsea ficou com a bola após uma jogada trabalhada por Lahm e Khedira e bateu rasteiro, perto da marca do pênalti, para ser mais um a superar Júlio César.
Felipão, então, gastou a sua última alteração. Sacou Fred, para alívio da torcida, e fez Willian participar do show alemão. Que prosseguiu aos 33 minutos, outra vez com Schurrle. O atleta recebeu um ótimo lançamento da esquerda, dominou bem e bateu com força, no ângulo, para dilatar o placar histórico no Mineirazo.
Aos 44 minutos, a Seleção Brasileira fez o seu gol de honra. Oscar recebeu lançamento longo, fintou Boateng e completou na saída de Neuer. Os alemães ironizaram, com gritos de “Brasil”, enquanto as máscaras de Neymar – antes motivos de alegria para o público local – caíam sobre o chão.