Estão praticamente paradas as vendas antecipadas com preço pré-fixado da soja que será colhida no país na safra 2005/06. Cerca de um quinto da produção esperada está comprometida, mas basicamente em razão de negócios acertados na base de troca por insumos para o plantio, ainda em andamento. Também neste caso, contudo, os preços estão abertos e dependerão do comportamento do mercado quando a colheita começar a avançar, no fim de janeiro.
“Com preço pré-fixado, apenas 10% da safra brasileira foi vendida até agora, ante 13% em dezembro de 2004, e em negócios firmados principalmente entre meados de junho e meados de julho, quando preços internacionais e câmbio melhoraram um pouco. Somadas as trocas por insumos, o percentual total é maior, mas não se sabe quanto valerá o grão no momento da entrega”, afirma Seneri Paludo, analista da Agência Rural baseado em Cuiabá, no Mato Grosso.
É de se esperar algum avanço nas próximas semanas em virtude da recente alta das cotações do grão em Chicago e do dólar, mas neste momento as negociações esbarram nas férias de fim de ano das indústrias, que já pararam quase todas as suas fábricas. Ontem na bolsa americana, os contratos com vencimento em março subiram 18 centavos de dólar por bushel (maior alta em mais de três meses, segundo a agência Bloomberg) e atingiram US$ 6,2050, impulsionados por problemas climáticos no Brasil e na Argentina.
Nas contas de Paludo, é no Mato Grosso, onde o plantio começou antes que no Sul, que as vendas antecipadas com preço pré-fixado estão mais adiantadas, já tendo alcançado 19% da safra estimada, ante 15% no mesmo período de 2004. Conforme ele, a tendência se explica pelo perfil dos produtores locais, muitos deles de grande porte e com condições de administrar melhor o escoamento das vendas – apesar da crise de liquidez deste ano.
Melhor exemplo disso é o Grupo Maggi, maior produtor individual de soja do mundo, que deve produzir 3 milhões de toneladas em 2005/06 e faturar entre US$ 700 milhões e US$ 750 milhões neste ano. Segundo Jacyr Bonjiolo, presidente do grupo, em outubro o Maggi já havia comprometido 40% da produção esperada, entre vendas antecipadas com preços pré-fixados e trocas por insumos.
Das até 58,53 milhões de toneladas projetadas pela Conab para 2005/06, 17,032 milhões deverão sair de terra mato-grossense, também segundo o órgão ligado ao Ministério da Agricultura. Ainda conforme levantamento da Agência Rural, os contratos firmados entre junho e julho saíram por US$ 6,50 e US$ 7,30 o bushel. “De lá para cá, essas vendas praticamente morreram”, garante Paludo.
Especialistas reiteram que, ainda que o percentual das vendas antecipadas totais esteja atualmente acima das estimativas do mesmo período do ano passado em algumas regiões sobretudo do Centro-Oeste, há queda em relação à média histórica também nessas áreas. Eles lembram que os primeiros sinais dos problemas de renda que seriam enfrentados no pós-colheita do ciclo 2004/05 eram visíveis no último trimestre de 2004 com a alta de custos e as perspectivas de preços externos baixos, e isso tumultuou as antecipações. Também a quebra de contratos de entrega às indústrias por alguns produtores (sobretudo em Goiás) na safra anterior desestimulou empresas a então apostar na modalidade.
“Nos últimos dois ou três anos, quem optou por vendas com preços pré-fixados pode até ter perdido, mas uma boa comercialização depende dessas vendas”, afirma Paludo. “O preço internacional hoje não está tão ruim, mas o dólar contamina as cotações ao produtor. Nesse contexto, o comportamento atual do mercado [poucas vendas antecipadas] é razoável, não é especulativo. Mas isso não é bom para ninguém, porque prejudica qualquer planejamento e tende a concentrar as vendas”, afirmou uma fonte ligada às indústrias.
Renato Sayeg, da Tetras Corretora, observou que em 2004, apesar dos sinais da crise de renda que estava por vir, ainda houve mais negócios com preços pré-fixados do que agora em algumas regiões porque os produtores em geral estavam mais capitalizados. Ele estima que, por conta das trocas por insumos, 20% da safra 2005/06 esteja comprometida, ante média histórica de 27% nesta etapa.
Segundo Sayeg, além da descapitalização, hoje colaboram para travar os negócios com preços pré-fixados as incógnitas que cercam o futuro dos preços e do câmbio. “Acredito que o mercado voltará a seguir sua lógica normal, com preços baixos no primeiro semestre e melhores no segundo. Mas há incertezas, entre as quais o tamanho da próxima safra americana”, ressalva. Para a Tetras, a produção nacional de soja ficará em cerca de 54,5 milhões de toneladas em 2005/06, abaixo do previsto pela Conab.
Se no Mato Grosso e no Centro-Oeste em geral as vendas com preços pré-fixados estão acima da média nacional calculada por analistas, nos Estados do Sul, principalmente no Rio Grande do Sul, esses negócios praticamente inexistem. “Só há troca por insumos. Em 30 anos, nunca vi um mercado tão parado. No passado, nesta época chegamos a ter 30% da safra comprometida”, afirma Antonio Sartori, da Brasoja, sediada em Porto Alegre.
Segundo ele, os produtores gaúchos não querem vender porque o risco climático na região ainda é grande, já que há sinais de “La Niña”, e porque o dólar pode subir. A Conab estima a produção do Estado em até 7,775 milhões de toneladas em 2005/06, ante as 2,573 milhões de 2004/05, quando houve quebra provocada por estiagem.