Em ofício entregue hoje (18) ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) defendeu a legalidade de criação de uma tabela com valores mínimos a serem cobrados pelo frete do transporte rodoviário de cargas, mas disse que a iniciativa pode ser revista.
“A tabela se presta a estabelecer preços mínimos, que evidentemente cobrem os custos da atividade”, afirmaram os representantes da ANTT no documento. O órgão regulador destacou que as negociações ainda não estão encerradas e que a adoção do tabelamento pode ser “reavaliada”. Apesar de admitir a eventual flexibilização da tabela, a ANTT argumentou que, caso a MP 832 e a Resolução 5.820 sejam declaradas inconstitucionais ou mesmo suspensas até o julgamento final da ação “lançará o país no mesmo caos em que se encontrava dias atrás”.
A agência também reafirmou que a tabela não fere a livre concorrência na economia. “A fixação de preço mínimo vinculativo em nada afronta os princípios da concorrência e da livre iniciativa”, disseram os signatários do documento, entre eles o procurador-geral federal Leonardo Silva Lima Fernandes, no ofício endereçado ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux.
Para os representantes da ANTT, o estabelecimento de um valor mínimo para o frete garante uma política de preços de mercado, levando em conta princípios constitucionais como o regramento econômico, a dignidade humana e os valores sociais do trabalho.
De acordo com o documento, os valores já divulgados foram definidos a partir de estudos que visam a “promover a saúde econômico-financeira das empresas, cooperativas e motoristas autônomos” e a segurança da sociedade como um todo. “A prática de fretes com preços aviltados tem se tornado fator impeditivo para uma adequada manutenção dos veículos.” Também foi destacada a missão da agência de regular a atividade e fiscalizar a execução da Política de Preços Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas.
Outro argumento é que “a execução do transporte rodoviário remunerado de cargas em valores inferiores aos definidos pela ANTT pode mostrar-se prejudicial à sustentabilidade do setor, ensejando aumento no número de sinistros [acidentes] envolvendo veículos utilizados no transporte de cargas”.
Editada pela ANTT em maio deste ano, a Resolução 5.820 regulamenta a Medida Provisória (MP) 832, publicada pelo governo federal com o intuito de atender às principais reivindicações dos caminhoneiros que cruzaram os braços e paralisaram o transporte de cargas por 11 dias, afetando vários segmentos econômicos. Segundo a ANTT, a MP 832 foi promulgada em caráter de urgência, para “reduzir imediatamente os riscos da greve [de caminhoneiros] que desencadearia em sucessivos problemas de infraestrutura”.
A manifestação da agência é uma resposta ao pedido de informações feito pelo ministro Luiz Fux, relator das três ações que questionam, no Supremo Tribunal Federal (STF), a legalidade do tabelamento do frete. Na quinta-feira (14), Fux atendeu à solicitação da Advocacia-Geral da União (AGU) e determinou a suspensão das 53 ações contestatórias ajuizadas em diferentes instâncias até que o STF julgue as três ações de inconstitucionalidade protocoladas pela Associação do Transporte Rodoviário de Carga Do Brasil, pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) também enviou ao ministro Luiz Fux seu posicionamento a respeito das críticas ao tabelamento do frete. Ao contrário da ANTT, o conselho vinculado ao Ministério da Justiça se manifestou contrário à iniciativa de fixar um valor mínimo. Para o Cade, o tabelamento do frete limitará a concorrência, prejudicando a sociedade e criando uma espécie de cartel no setor.
O tabelamento do frete foi uma das reivindicações de caminhoneiros atendidas pelo governo federal, no fim do mês passado, para tentar pôr fim à paralisação que durou 11 dias e afetou diversos setores da economia. Desde então, o governo já editou duas tabelas de frete. A primeira foi publicada no Diário Oficial da União de dia 30 de maio e vigorou até 7 de junho, quando foi editada a segunda versão da tabela. Esta, no entanto, permaneceu válida por apenas algumas horas, já que, na prática, acabou sendo suspensa pela ANTT no mesmo dia.
As duas primeiras tabelas são alvos da disputa de interesses entre caminhoneiros e representantes do setor produtivo. De um lado, donos de transportadoras rodoviárias e caminhoneiros autônomos se queixam de que os valores atualmente pagos pelo frete mal cobrem os custos das viagens, como combustível, pedágio, alimentação e manutenção do veículo. De outro lado, empresários de outros segmentos, principalmente o agropecuário, alegam que o estabelecimento de um valor mínimo para o frete limita a concorrência e aumenta os custos de transporte de cargas.
A primeira versão contemplava os interesses dos caminhoneiros ainda em greve, estabelecendo um valor mínimo de frete a partir do qual os autônomos pudessem negociar com as empresas transportadoras o valor dos serviços. Já a segunda versão, ao reduzir o valor do frete, agradou mais ao setor produtivo. Nos últimos dias, várias entidades entregaram aos técnicos da ANTT suas sugestões para a elaboração de uma terceira tabela.