Foi uma semana de perplexidades. Uma turista de 53 anos, de Blumenau, jogou um pinscher e um basset pela janela do décimo andar, em Guarujá. Os dois cãezinhos morreram. Em São Paulo, uma senhora de 43 anos é suspeita de matar cerca de 30 cães e gatos. Ela recolhe animais abandonados. E um homem matou a tiros a mulher, a filha grávida, o neto de três anos, o genro e se matou. Também em São Paulo, assistimos à fúria de um administrador de empresa de 35 anos que saiu de casa em seu carro blindado, de colete à prova de balas e com pistola municiada com dois carregadores, roubou quatro carros, danificou sete,disparou na via pública, feriu duas pessoas e ao fim de tudo escondeu-se no esgoto por 12 horas.
A primeira explicação é de um surto psicótico; ele alega que se sentiu perseguido e precisava fugir. Tudo muito semelhante ao filme Um Dia de Fúria(1993), com Michael Douglas. A semelhança está até no nome: o paulistano se chama Michel. No filme, o cidadão pacato tem um surto no momento em que é assaltado por uma dupla de "donos da rua". Há, então, uma explosão de violência em série, que reage à violência, hipocrisia e mentira urbanas. Quem lembra da senhora, no Paraná, que quebrou um computador da agência da Caixa Econômica em que estava sendo mal atendida? Dos passageiros que quebram guichês de companhias aéreas que não dão informação sobre vôos cancelados?
Já imaginaram: o cidadão paga todos os tributos e sua casa é invadida por ladrões; no jornal da manhã, vê as manchetes sobre corrupção que leva seus impostos; faz compras e é enganado no preço e na qualidade do produto; recorre à Justiça mas cansa de esperar; precisa de hospital público e tem que acordar de madrugada para entrar na fila, e não consegue os exames; seus filhos estão numa escola em que pouco aprendem e são agredidos; vê os desonestos enriquecerem; sua mãe é assaltada na rua; seu avô é atropelado na faixa de pedestre; não consegue caminhar na calçada, porque está tomada por carros; vê motoristas jovens tirando vaga de idoso; perde horas no congestionamento; a cidade é agressiva, suja, perigosa, barulhenta, desorganizada. Com os nervos em frangalhos, tenta dormir para se recuperar, mas o barulho da vizinhança não deixa.
Aí o cidadão pacato se sente perseguido. Explode e pensa que há uma conspiração para acabar com ele. E reage. Não sei se esse é o caso de Michel Goldfarb Costa. Os psiquiatras forenses o estão examinando. Mas sei que cada vez mais gente está tendo o seu dia de fúria pela pressão da cidade sem ordem. A violência não se justifica. Mas pode ser explicada. E como se não bastasse, ainda estão resgatando a brutalidade da luta-livre, agora chamada de MMA.