O Cristianismo ensina que Jesus deu seu corpo para salvar a humanidade. E prega que sejamos dignos do sacrifício de Cristo. O ensinamento contém um princípio: o de estejamos à altura dos que fizeram alguma coisa por nós. O sacrifício da própria vida por alguém é a mais elevada das doações que pode ser feita e também gera o maior compromisso que pode assumir o beneficiado. No premiado filme O Resgate do Soldado Ryan(Stephen Spielberg), o resgatado(Matt Damon), já idoso e acompanhado pela família, visita o túmulo de seu salvador, o Capitão John Miller(Tom Hanks), no cemitério da Normandia, para prestar contas de sua vida.
Na história, baleado mortalmente depois de resgatar o soldado, o Capitão sussura as últimas palavras para o Soldado Ryan: “Faça por merecer. Mereça.” Mereça o que fizemos por você. Mais de 40 anos depois, só diante da cruz do túmulo do Capitão, o Ryan idoso, com a família a observar à distância, presta contas: “Todos os dias penso no que você me disse naquele dia na ponte. Tentei viver a vida o melhor que pude. Acho que consegui e que, pelo menos a seus olhos, eu tenha honrado o que fizeram por mim.” A mulher de Ryan o chama e ele pede o testemunho dela: “Diga para ele que eu sou um homem bom”.
Em 1977, o menino Adilson brincava no zoológico de Brasília e caiu no fosso das ariranhas que imediatamente o atacaram. O sargento do Exército Silvio Hollembach saltou na água e salvou o menino. O sargento recebeu mais de cem ferimentos pelo corpo e morreu. Deu a vida pelo menino. Hoje Adilson tem 53 anos e foi diretor-financeiro do fundo de pensão dos Correios, o Postalis. Foi preso na sexta-feira por corrupção. Faz dez anos que vem sendo acusado por diversos atos ilícitos na direção de um dos maiores fundos do país. Nunca visitou a viúva do sargento, que precisou criar quatro filhos.
Fico a imaginar Adilson diante do túmulo do sargento Hollembach, tendo que lhe prestar contas. “Não fui um homem bom. Não honrei o que você fez por mim”. Especulo como seria se cada político tivesse que prestar contas ao eleitor e contribuinte, pelo voto dado e pelos impostos pagos. Seriam os mandatários dignos dos votos que os nomearam e dos impostos que os sustentam? Fazem por merecer a reeleição? E especulo se o mandante pudesse sussurrar ao ouvido de seu mandatário: “Mereça!”.