No próximo 1º de março vai completar 33 anos que multidões saíram para rua com um distintivo na lapela “eu sou fiscal do Sarney”, fechando supermercados e farmácias que não cumpriam o congelamento de preços. A aventura terminou logo. Pensei que as multidões que saíam as ruas não iriam mais voltar para casa; iriam permanecer, fiscalizando o governo e os políticos. Mas tudo terminou na passividade de outrora. Em 1992 vieram os carapintadas, enchendo as ruas para derrubar Collor. Conseguiram o impeachment e voltaram para casa, emudecendo de novo. Ainda não havia redes sociais naquela época.
Mas em junho de 2013, as redes sociais já estavam maduras e passaram a ser usadas para mobilizações populares. A faísca foi o aumento de passagens em São Paulo, e foi um rastilho para o país inteiro, porque ninguém mais aguentava a corrupção, o desemprego, a mentira. A Lava-jato, que eclodiu em março de 2014, mostrou o quanto a desonestidade, a safadeza, a corrupção, estavam entranhadas, institucionalizadas no governo. O jornalismo investigativo foi um auxiliar precioso da polícia e do Ministério Público. E se foi conhecendo a corrupção distribuída nos legislativos, nos tribunais, nas prefeituras, nos tribunais de contas, nos governos estaduais e federal. O povo descobriu porque paga tanto imposto e não tem serviços públicos decentes. Perdeu a paciência, assumiu a cidadania e abandonou a passividade.
Saiu para as ruas xingando os vampiros que o suga. Entrou numa campanha eleitoral sem precisar de tutela, com a rede social na mão. E derrotou o dinheiro, derrotou os marqueteiros, derrotou a velha política e os velhos políticos, derrotou as velhas idéias, o velho populismo, a demagogia, a mentira, a corrupção. E, desta vez, não voltou para casa. Continua ativo, na democracia direta das redes sociais, a nova ágora onde se debatem ideias, se faz crítica, se dá sugestões, se manifesta.
Renan foi testar a nova força, a nova opinião pública, ao buscar a presidência do Senado, só aparecendo candidato na véspera, como se temendo dar tempo à reação das ruas digitais. Nem assim. Os senadores sentiram o peso da cidadania virtual. No Supremo, pouco antes do Natal, dez minutos depois de ser anunciada a soltura de milhares de condenados em segunda instância, o povo já estava lá em frente, mostrando que é a origem do poder. O voto de outubro não foi uma brincadeira a para a maioria que era silenciosa. Foi voto em ideias e ideais, que não desaparecem nas urnas, mas ficam nos cérebros e corações. Quem não se adaptar a essa nova democracia, mais autêntica e de manifestações imediatas, é porque ainda está em outro mundo, em algum lugar do passado.