O Senado, mesmo obrigado pela Justiça, reluta em cassar o mandato do senador Expedito Júnior, de Rondônia, PSDB. O Senador foi condenado, em todas as instâncias da Justiça Eleitoral, por abuso do poder econômico e “compra de votos”. Essa história de “compra de votos” é uma balela. Na verdade, é compra de eleitores. Pessoas que vendem sua cidadania, seu direito político, por espelhinhos, berloques ou meias-patacas, como nos tempos das relações entre índios e conquistadores portugueses.
Isso é muito comum no Brasil. A socióloga Maria Lúcia Victor Barbosa identifica bem a situação. É o caso do João-Ninguém, que sobrevive de meio salário-mínimo, mora num barraco, é um anônimo. Acha que nada vale. Mas chega o dia em que ele descobre que vale o mesmo que um Antônio Ermírio de Moraes: 1 voto. E aí, vende o único valor que tem, o voto. Há os que se vendem por um pouco mais. Lula, quando era oposição, disse que a distribuição de benefícios aos pobres, como o leite, por exemplo, era uma forma de comprar quem está com a barriga vazia.
Semana passada se descobriu, no interior de São Paulo, uma cidade com um gigantesco aumento de eleitores, todos com endereço falso. Em troca de promessas de emprego por parte do prefeito, candidato à reeleição, as pessoas emprestavam seus títulos para ser feita a transferência. E se tornaram cúmplices da falsificação do domicílio eleitoral. Afinal, sempre ocorre a pergunta: José Sarney, Senador do Amapá, mora no Amapá? Se até um ex-Presidente da República se presta para forjar o demicílio eleitoral, imaginem quem está com a barriga vazia e filhos chorando de fome.
Estou falando disso porque tudo se arma para a eleição presidencial do ano que vem. Inaugurações, propaganda de governos pelo rádio, a televisão e os jornais, a disfarçar propaganda de candidaturas, comícios à guisa de fiscalização de obras e por aí vai. Já é época de os políticos não pensarem em outra coisa a não ser na conquista de votos. E quando entra a gula do voto, é com sofreguidão sem limites.
Existe um Brasil do passado e um Brasil utópico, que imaginamos para nossos filhos e netos. E o Brasil real, com cada vez mais contrastes. Na economia, se avança, se fortifica o país; no campo da cidadania, parece prevalecer a bagunça geral, numa disputa para ver quem tira mais vantagem, mas com um discurso de moralidade, que nos dá um bom prêmio de hipocrisia. Não ganhamos dos Estados Unidos porque afinal, lá, o americano tem um pé no puritanismo do Mayflower e outro em Las Vegas de todos os pecados. E eles têm uma noção forte de cidadania, de respeito às leis, de medo da punição. Por aqui, vale tudo e se a gente pensar bem, vamos perdendo o moral para falar mal dos políticos. Afinal, se eles compram votos é porque nós vendemos. Em tempo: o senador de Rondônia cassado foi substituído pelo dono de uma empresa de transportes de Cascavel, Paraná.