Além de contabilizar o menor preço da arroba dos últimos seis meses, a bovinocultura mato-grossense está convivendo com um cenário de desconfiança em relação à efetividade dos pagamentos sobre os animais comercializados. A orientação da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat) é para que as vendas sejam feitas à vista, independentemente, da empresa compradora.
A incerteza sobre as vendas veio à tona ontem por meio de relatos de produtores mato-grossenses de que a maior processadora de carnes do mundo, a JBS/Friboi, teria modificado sua política de compras, passando a contratos para pagamentos após 30 dias, evitando os à vista. “Recebemos esse relato com muita preocupação, afinal, é uma posição adotada por uma empresa do tamanho da JBS e querendo ou não expõe sua fragilidade institucional”, disse em entrevista ao Notícias Agrícolas, o consultor técnico da Acrimat, Amado Oliveira. A JBS é uma das maiores companhias alimentícias do mundo, sendo uma multinacional brasileira presente em vários países.
Amado faz questão de explicar que a orientação de opção por pagamentos à vista vem sendo repassada aos associados da Acrimat há algum tempo. “Não é de hoje. Em razão de vendas feitas a prazo e não honradas pelas empresas, os produtores temem calotes e até mesmo ameaças a sua liquidez, pela falta de pagamentos. Em razão desse histórico recente, ocorrido no ano passado, do atual cenário do mercado e das perdas acumuladas sobre o valor da arroba, nós da Acrimat, recomendamos sempre que as vendas sejam feitas à vista. Afinal, o pecuarista fica três anos cuidando do animal e tem o direito de dormir em paz nos próximos 30 dias, sabendo que poderá pagar suas contas”. Ainda como reforça Amado, no contexto atual, a recomendação da venda à vista, vale mais que nunca.
O preço da arroba do boi à vista registrou a quarta queda consecutiva e o menor valor desde outubro do ano passado, em Mato Grosso. A desvalorização da arroba do boi gordo em abril foi de 1,17% na comparação com março, estabelecendo-se com média de R$ 123,66. Comparando com o preço da arroba em maio do ano passado a queda é ainda maior, chega 5,6%, sobre R$ 131 praticado há um ano. Este movimento deriva da diminuição nos abates, que em abril registrou o menor índice em Mato Grosso.
O Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea), responsável pelos levantamentos de preços da arroba destaca que houve uma queda de 22% no volume de animais abatidos em comparação com março, somando 283,3 mil animais no quarto mês ante 366,4 mil no terceiro mês. Os números comprovam os impactos da decisão dos frigoríficos de suspenderem os abates no Estado, o que prejudicou a cadeia produtiva pressionando o preço da arroba.
A suspensão foi uma decisão tomada por várias empresas, após a Operação Carne Fraca, deflagrada no dia 17 de março pela Polícia Federal, que apura o envolvimento de fiscais do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) em um esquema de liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos, que teve como os primeiros impactos embargos contra a carne exportada pelo país. Sob essa justificativa, as indústrias frigoríficas concederam férias coletivas e suspenderam compras de animais, com a finalidade de reorganizar estoques e suas capacidades.
O diretor-executivo da Acrimat, Luciano Vacari, explica que os números mostram que a indústria atingiu o objetivo, derrubando o preço e manipulando o mercado da pecuária de corte. “Com o pretexto da Operação Carne Fraca, os frigoríficos conseguiram paralisar as atividades para ampliar a oferta de bois e pressionar os preços. Esta ação é possível porque temos um mercado concentrado e controlado por dois ou três grandes grupos, sendo que um deles detém 50% das unidades do Estado”.
Além da restrição das condições de compra dos animais, o consultor da Acrimat disse que há vários relatos de pecuaristas no Estado de que em razão dos pagamentos não serem mais feitos à vista, esses produtores que vendem para receber com 30 dias estão recorrendo ao mercado financeiro para receber o valor o mais rápido possível.
“A posição da cadeia frigorífica é bastante confortável, em razão da oferta. Como alternativa, a Acrimat soube que alguns produtores estão com medo de não vender seus animais, pela regra da empresa de só comprar para pagamento a prazo, daí aceitam a condição, mas buscam no mercado financeiro a antecipação de recebíveis, perdendo parte do valor com os juros cobrados pela operação”. Amado disse que a entidade está avaliando essa prática, mas adverte, que é uma opção preocupante e que põe em risco a manutenção do pecuarista na atividade.
Em Mato Grosso, conforme a Acrimat, a JBS, chega a ter exclusividade em algumas regiões do Estado. A JBS Friboi 40 unidades de processamento de bovinos e é em Mato Grosso que está a maior parte delas: 11. O Diário fez contato com a assessoria da JBS no início da noite, mas não obteve retorno até o fechamento da edição.